O investimento social privado na educação brasileira: um breve balanço
Por: GIFE| Notícias| 02/09/2011Paulo Castro *
Basta um olhar cuidadoso para verificar as conquistas recentes da educação brasileira: universalização do ensino fundamental, Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), ampliação do ensino obrigatório, Plano de Desenvolvimento da Educação… Todos esses avanços têm ao menos uma característica em comum, talvez tão importante quanto as mudanças gestadas: a participação cada vez mais ampla da sociedade civil organizada. A educação deixou de ser área de influência exclusiva de especialistas e políticos e vem se tornando, democraticamente, um tema nacional.
Essa transformação recente do ponto de vista histórico, sinal de amadurecimento da sociedade umbilicalmente ligado à retomada da vida democrática, assume uma importância que ainda virá a ser mais bem aquilatada ao longo do tempo. Mas, qualquer que seja a perspectiva adotada, será impossível analisar a evolução na educação brasileira na virada do século XX para o século XXI sem tomar em conta o crescente envolvimento de empresas e lideranças empresariais com o tema da educação.
Evidentemente, não se pode relativizar o papel das ONGs, dos sindicatos, das universidades e de outros atores de tradição – muito longe disso, já que a força do processo se alicerça justamente no enfrentamento das questões a partir do diálogo intersetorial. Trata-se apenas de situar e reconhecer o protagonismo da iniciativa privada, que vem se articulando de forma inédita para investir em mudanças qualitativas para a educação, seja apoiando diretamente as organizações da sociedade civil, gerando conhecimento, tomando seu lugar no jogo de pressões democráticas ou desenvolvendo e difundindo novas tecnologias sociais.
A expressão investimento social privado (ISP) comumente remete ao aporte de recursos financeiros, e de fato não é um aspecto desprezível. Um total de 102 associados do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife) investiram, em 2010, algo como R$ 2 bilhões em projetos sociais, sendo que a educação foi a área prioritária para 82% deles.
Mas medir em reais gastos o papel do ISP seria bastante injusto. Nas últimas décadas, as empresas qualificaram bastante sua atuação. Os recursos aplicados em doações e ações assistenciais, características do início do movimento empresarial, vêm se transformando em fomento a projetos de médio e longo prazos. O apoio às ONGs progressivamente segue uma pauta mais orientada para a incidência política em temas cruciais, como educação infantil, promoção da leitura, financiamento e formação continuada de professores.
A ação empresarial também se traduz em formação de massa crítica, em novos conhecimentos e tecnologias sociais. Suportados pelo ISP, institutos, fundações e ONGs desenvolvem pesquisas e dão novas pistas das áreas estratégicas nas quais é preciso atuar mais e melhor para impulsionar a educação. Hoje, tecnologias sociais viabilizadas pelo ISP são incorporadas aos programas de municípios, Estados e do Ministério da Educação, por exemplo, no que se refere ao repertório de experiências de educação em tempo integral, alfabetização de adultos, aceleração de aprendizagem, difusão cultural, entre outras áreas.
Mesmo quando não podem ser universalizadas, essas tecnologias contribuem para ampliar a discussão e a busca de alternativas, diante de realidades tão diversas como as que caracterizam as regiões deste continente chamado Brasil.
Nesse quadro, cabe por fim pontuar que o ISP não avança ao largo da sociedade, mas de forma integrada, propondo novos espaços de debate, estimulando a participação (como é o caso recente do Movimento Todos pela Educação), propondo interseções e redes e abrindo espaços de discussões – inclusive para a manifestação crítica dos que ainda nutrem ressalvas ao posicionamento do empresariado nos temas educacionais.
O respeitado filósofo colombiano Bernardo Toro já afirmou, em entrevista, seu bom prognóstico para a educação no Brasil, apontando, entre as razões, a preocupação da iniciativa privada com a qualidade da educação. É claro que há muito a ser feito e temos um longo caminho pela frente – que o diga o Instituto C&A, ao completar 20 anos de compromisso absoluto com a educação brasileira. Mas não devemos desconsiderar o caminho já trilhado. Não é uma conquista do empresariado, mas de toda a sociedade brasileira, pois uma nação se constrói na soma dos sonhos de cada um de nós.
*Paulo Castro é economista e diretor-presidente do Instituto C&A.