O Jovem do Campo não é “Chico Bento”

Por: GIFE| Notícias| 10/09/2010

Silvia Zanotti*

Após diversos anos de promoção do desenvolvimento baseado na industrialização e urbanização, que ocasionou um inchaço nas cidades e por conseguinte, um esvaziamento do campo, o Brasil chega a uma situação caótica nos centros urbanos. Para saber, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano de 2010, a taxa de urbanização beira os 80%.

Esse forte processo de urbanização se deve à promoção de políticas públicas, que priorizaram o urbano em comparação ao rural e, assim, deixaram para a população do campo uma série de estigmas, como se tudo o que não estivesse nas metrópoles fosse sinônimo de atraso – um local de poucas oportunidades.

Atualmente, novas propostas de desenvolvimento rural, que oferecem um olhar mais generoso para o campo, estão sendo empreendidas, tanto por órgãos governamentais, quanto por fundações e institutos de origem privada. Esta foi uma das conclusões de um encontro promovido pelo GIFE, no dia 27 de agosto, com seus associados que investem no desenvolvimento de comunidades rurais.

No debate, ficou claro que as experiências mais exitosas respeitavam o saber e as vontades das comunidades rurais, ao mesmo tempo em que ofereciam a estas comunidades tecnologias mais modernas, capazes de melhorar a produção, a renda e a qualidade de vida destas populações.

Outra questão importante, que se contrapõe à visão mais estigmatizada do campo construída durante o processo de “êxodo rural” empreendido no Brasil, é da falta de oportunidades que o campo oferece ao jovem rural. As novas propostas sobre o tema buscam balancear a permanência no campo, com qualidade de vida e, assim, colocar os jovens como atores deste novo processo de desenvolvimento rural.

No entanto, é importante lembrar que no campo o jovem não é o Chico Bento, o personagem ingênuo e camponês de Maurício de Souza. Ele não está descalço, já tem brinco, tem piercing e tem incorporado, mesmo a distância, a cultura da cidade. Tal como constatou o gerente de projetos do Instituto Souza Cruz, Luiz André Soares, durante o encontro.

O campo é um espaço contíguo à cidade e estas características precisam ser conhecidas e respeitadas. Pode-se dizer que o jovem rural tem uma dimensão econômica importante, mas ele é mais do que isso. Ele gosta das mesmas coisas que a juventude urbana no que diz respeito a lazer, cultura e entretenimento. Apesar disso, a maioria das políticas para o jovem rural continua focada na dimensão econômica, sem atender as outras temáticas.

As iniciativas realizadas pelos associados da Rede GIFE nessa empreitada se dividem em dois grandes blocos de projetos. O primeiro assume uma visão de desenvolvimento de base e local, que trabalha a partir dos saberes da região. Em contrapartida, outro grupo integra baseiam suas atividades na integração das estratégias de investimento social com as práticas de responsabilidade corporativa de suas mantenedoras.

Apesar desta temática ser relativamente nova para nossos associados, o fato do Brasil ser um país cujo desenvolvimento econômico se deve, em boa parte, à exportação de produtos agrícolas e ter empresas de grande impacto no cenário global, deve fazer com que esta temática venha a crescer de importância nos próximos anos.

A busca por um novo desenvolvimento, mais sustentável, que seja inclusivo e respeite as comunidades coloca na pauta das agendas dos institutos e fundações que atuam nesta área a necessidade de se atuar em escala. Como princípio, o desenvolvimento local e comunitário tem uma prerrogativa baseada no diálogo e em uma estrutura mais horizontal de poder.

Como conciliar essa característica a uma necessidade de país, que ainda possui amplas populações no campo e precisa construir novas formas de desenvolvimento econômico e social? Como manter este homem no campo, com qualidade e dignidade? Estes são os grandes desafios que se apresentam nesta temática não só para os associados do GIFE, mas também para o próprio país.

*Silvia Zanotti, é mestre em Administração Pública e Governo pela FGV-SP e especialista em Sustentabilidade. No GIFE é gerente de Articulação .

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