O poder excessivo dos gerentes de programa

Por: GIFE| Notícias| 09/06/2008

Luc Tayart de Borms*

Para ter impacto e realizar mudanças sociais ou mudanças nas políticas, as fundações precisam fazer mais do que conceder fundos. A caixa de ferramentas filantrópicas inclui a defesa de idéias, a reunião das diversas partes envolvidas, publicações, seminários, apoio à geração de idéias e campanhas de comunicação, em sintonia com a concessão pró-ativa de recursos. Mas, muitas vezes, elas prejudicam a sua eficácia concedendo aos gerentes de programas de doações um poder excessivo.

Quando existe abuso de poder, isso pode resultar na concessão de financiamentos com bases subjetivas, muitas vezes em detrimento dos objetivos da fundação. Isso pode também minar a responsabilização e a eficiência, e representa uma visão individualista estreita da melhor maneira de tratar questões importantes.

Muitas vezes, a seleção de doações é feita pelos gerentes de programa para a decisão do conselho ou são os próprios gerentes de programa que tomam a decisão. Todos trabalham dentro de seus próprios paradigmas. Trabalhando com métodos tradicionais, desenhados com base em paradigmas individuais, os gerentes de programas não percebem a riqueza da diversidade que poderia existir se fossem trazidos para a mesa diferentes pontos de vista e experiências.

Trabalhar de forma isolada também dá a impressão de que a fundação é dirigida por um ego. Isso pode criar uma dinâmica de dependência com os beneficiários, que se tornam cada vez mais dependentes da benevolência do tomador de decisões.

Deixar a concessão de fundos nas mãos dos gerentes de programa, ou de qualquer outra pessoa trabalhando de forma isolada, é um terreno escorregadio e perigoso. Para ser verdadeiramente efetiva, a concessão de fundos deve ser um processo orientado pelo impacto e, portanto, norteada pelo envolvimento das partes interessadas.

Esse é um princípio fundamental para a prática das fundações em geral, uma vez que ajuda a definir os objetivos de curto e longo prazo. Através do financiamento pró-ativo, as fundações podem encontrar maneiras inovadoras de trabalhar, testar idéias criativas e incluir novas questões na agenda política. Tal envolvimento pode ser alcançado através de um comitê de seleção independente que inclua as diversas partes interessadas, ou outras formas de criar um espaço de diálogo (reunião). Dessa forma, a fundação abre as portas à inovação e prepara o terreno para reais mudanças.

Esse argumento tem como alvo mais as fundações institucionalizadas do que às doações feitas por impulso por doadores vivos que sentem que têm o direito de fazer o que quiserem com a sua fortuna. Entretanto, se estiverem preocupados com eficiência e impacto, também eles poderão se inspirar nisso.

Existe ainda mais uma virtude no uso de comitês de seleção. Os gerentes de programa perdem muito tempo analisando propostas e se reunindo com possíveis beneficiários. Trabalhando com um comitê de seleção voluntário e um bom software de financiamento, o fluxo dos negócios é mais rápido e mais suave, liberando os funcionários para usar as outras ferramentas disponíveis.

A seleção e a concessão de fundos é um elemento-chave da responsabilização de uma fundação. Além da prestação de contas às autoridades regulamentadoras, precisamos pensar na prestação de contas ao domínio e do setor. Por exemplo, se uma fundação está atacando o problema da imigração, todos os envolvidos no setor devem ser engajados para determinar os melhores meios de intervenção. Do contrário, a fundação dá a impressão de ser dirigida por decisões arbitrárias e tendenciosas. Uma fundação deve ser capaz de responder a esta pergunta-chave: por que apoiar um beneficiário/metodologia e não outro?

Problemas complexos envolvem diferentes partes que têm papel-chave como alavancas de mudança. É essencial entender esses pontos de alavanca e é difícil fazê-lo sem engajar todas as partes envolvidas.

A KBF (sigla para Fundação Rei Baudouin )criou comitês de seleção em cada área de atividade de programa ou projeto. Esses comitês são pluralistas – seus 12 membros têm histórias ideológicas e filosóficas diversas (sem representá-los), além virem de organizações de comunidades de base, ONGs, governo, academia e empresas.

Cada comitê é secretariado por um gerente de programas sem direito a voto e um presidente externo. O conselho do KBF delega todos os aspetos da concessão de financiamentos a esses comitês, o que dá a uma fundação privada que tem um perfil altamente público uma reputação de imparcialidade.

Claro que isso não é tão fácil assim. Escolher e trabalhar com um grupo tão diverso de pessoas por ser difícil. Existem sempre os contestadores (de quem precisamos). Mas é aí que reside a verdadeira criatividade – abrir um espaço onde as partes envolvidas possam discutir pontos de vista e garantir uma maior diversidade na análise e na solução dos problemas.

*Luc Tayart de Borms é Diretor Administrativo da Fundação Rei Baudouin

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