O que a filantropia pode aprender de si mesma?

Por: GIFE| Notícias| 17/11/2008

Alliance Brasil

Existe um velho ditado que diz que “”vassoura nova varre bem””. Luis Ubiñas veio da parte externa do setor da filantropia (ele veio de fora; da Mc Kinsey) para assumir a presidência da Fundação Ford em janeiro deste ano.

Como ele mesmo explicou para a editora da revista Alliance, Caroline Hartnell, no entanto, esta “”nova vassoura”” está preocupada em manter e aumentar os pontos fortes da Fundação como uma instuitução global assegurando que a fidedignidade continue a ser seu valor essencial. Acima de tudo, disse ele, deve continuar a ser uma instituição do conhecimento. Ele também delineia fortes convicções sobre a importância da cooperação com outras fundações, outros setores, beneficiários com parceiros de fato e não somente no nome.

Alliance – Você já está há 11 meses na Fundação Ford. Gostaria de lhe perguntar sobre suas primeiras impressões da Fundação e sobre o setor de Fundações como um todo. Quais são os aspectos que parecem ser os mais contrastantes trabalhando na Ford vindo da McKinsley?

Luis Ubiñas – Em primeiro lugar estou surpreso pelas similaridades. Ford e Mckinsley são realmente duas instituições globais. Começam por entender que o mundo é um lugar heterogêneo, com necessidades locais muito, muito específicas. Estou impressionado pelo fato de que as duas organizações são lideradas por talentos. Aqui na Ford, o ativo principal não é de fato a fundação, mas as pessoas.

Em McKinsley é a mesma coisa. E eu estou impressionado de como as duas organizações são dedicadas a inovar: elas existem para lidar com inovações de forma eficiente; uma em negócios e outra no setor social. Assim, a grande surpresa é o nível da continuidade dos valores e capacidades existentes entre as duas organizações.

Agora, eu não sei se isto é uma surpresa, mas é algo que eu valorizo muito: Eu adoro poder acordar todos os dias e pensar: “”hoje estamos trabalhando em um dos mais importantes desafios, lidando com pessoas à beira da sociedade, gente marginalizada.”” É maravilhoso estar rodeado por pessoas que passam o dia todo se preocupando com assuntos que afetam aqueles que têm menor capacidade de lutar sozinho.

Alliance – Não há nada que o surpreendeu por ser diferente? Seja na Fundação Ford ou no setor como um todo?

LU – A habilidade de colaborar com líderes das diversas fundações é substancialmente diferente. Posso procurar um presidente de outra fundação para aconselhar-me, para trocar idéias, para compartilhar iniciativas programáticas de uma forma que é vedada nos negócios devido à necessidade de competir. Há somente uma coisa que gostaria de ter mais: a habilidade de procurar pelas organizações, pelos programas, pelos temas e trabalhar colaborando com meus pares. Eu acho que existe um valor imenso nisso: valor para a sociedade e valor para a nossa organização.

Alliance – Você acha que poderia ser feito muito mais na área das Fundações compartilhando, de fato, experiências sobre o que dá certo e o que não dá, de modo que as fundações possam começar do ponto onde as outras pararam, em vez reinventar a roda, uma situação que acontece com freqüência?

LU – Bem, muitos dos grandes resultados da Fundação Ford têm sido realizados em parceria. O trabalho da Revolução Verde com a Fundação Rockerfeller foi uma colaboração perfeita. Em alguns trabalhos realizados por nós nas áreas de direitos civis, nós éramos a organização líder, depois disso outras organizações juntaram-se a nós.

O trabalho que fizemos nos movimentos femininos liderados por Susan Berresford atraiu outros doadores e outras Fundações. Por isso, na Ford, há uma história de colaboração efetiva.

Eu acho que aqui você poderá encontrar um dos marcos da minha época no sentido de, praticamente tudo o que fizéssemos deveríamos ter outras fundações como parceiras, beneficiários como parceiros, ONGS como parceiros. Esta questão de parceria é chave e, da forma como penso, é o centro principal na história da Fundação e a chave para o nosso futuro.

Alliance – Você acha que seria de grande valor para o setor como um todo ter uma forma mais sistemática de compartilhar informações de forma que as outras Fundações com as quais a Ford não trabalha diretamente poderiam se beneficiar da experiência Ford e vice-versa?

LU- Eu sou muito novo ainda e, portanto, tenho que ter cautela ao manifestar-me no mundo das fundações. Eu estou aqui apenas há seis ou sete meses. Dito isto, nós temos setores de filantropia dedicados integralmente em trabalhar em temas comuns de justeza e justiça social e, ao trabalhar de forma compartilhada, só pode ser benéfico. Então, sem dúvida nós devemos como setor, procurar mais oportunidades para aprender com os outros mutuamente. Eu já tive muitas outras fundações me procurando para compartilhar suas mensagens e seus pontos de vista conosco a ponto de podermos estimular esse tipo de diálogo. Penso que nós criamos um tipo de valor que as organizações do setor privado não o fazem entre si.

Alliance – Desde que Matthew Bishop cunhou a palavra “”filantrocapitalismo”” num artigo na revista The Economist em Fevereiro de 2006, há muita discussão sobre introduzir práticas empresariais no setor filantrópico. Você também enxerga isso acontecendo? Existem práticas da Mckinsey que poderiam ser úteis para o seu trabalho na Ford?

LU – Acho que o aprendizado nos setores é inerentemente de valor. Penso que assuntos existentes nas fundações seriam muito interessantes para os negócios: ter um foco de mais longo prazo, ter uma abordagem mais holística, atacar problemas por múltiplos ângulos e aprender sobre medições qualitativas.

Ao mesmo tempo, acho que a filantropia poderia aprender muitas coisas com as experiências das empresas: pensar em termos de enxergar a doação como investimento, considerar a possibilidade de ter retorno, visualizar os beneficiários como parceiros em vez de beneficiários e pessoas, com as quais nós trabalhamos, com um diálogo comum e aberto.

Acho que a questão não é o que a filantropia pode aprender com as empresas, mas sim o que a filantropia pode aprender de si mesma, dos negócios, do governo? O que importa é estabelecer ambientes de aprendizados; de quem aprendemos é secundário. Você encontrará que organizações de sucesso em todos os setores são aquelas definidas pela sua capacidade de aprendizado e a Fundação Ford tem uma história sobre isso. Por isso eu penso que a organização se sente muito, muito à vontade com isso.

Alliance – Você acha que a filantropia poderia aprender do setor privado na área de estabelecer objetivos específicos e metas e medir o andamento delas?

LU – Acho que devemos ser extremamente cautelosos em como pensamos medir resultados. Quando você entra em medições quantitativas muito estreitas, você corre o risco em se concentrar em atividades quantitativamente estreitas. Muitos dos temas onde a Fundação Ford trabalha, como por exemplo, nos sociais, são de desenvolvimento de longo prazo, longa gestação, longa fermentação.

Por isso precisamos ter uma visão muito, muito sofisticada para medir e entender o impacto que deve ser levado em consideração nas medições qualitativas de longo prazo. Isso não quer dizer que não há espaço para a quantificação, claro que há, mas tem que ser ponderado: você precisa ter um profundo conhecimento da complexidade da medição e como a medição poderá orientar o comportamento. É por isso que é tão importante para uma organização como a nossa, que lida com mudanças sociais de longo prazo, ter a certeza que as visualizamos de longo prazo tanto em termos qualitativos e, quando necessário, em termos quantitativos.

Alliance – Tenho entendido que está fazendo uma revisão profunda no trabalho da Fundação. O que espera que saia disso tudo?

LU –Eu penso que a Fundação, no final deste processo, encontrará a si mesma, estará mais focada nos temas que têm sido os mais importantes da sua historia, temas que constituem o centro do seu DNA e esse enfoque permitirá trazer muito mais recursos para as atividades que fazemos. Nos permitirá ter objetivos ainda mais claros e até uma maior facilidade para entender, no meio de toda a sua complexidade, como estamos avançando e fazer-nos pensar nos beneficiários como parceiros, com quem nós estamos trabalhando a longo prazo para atingir metas compartilhadas. E nós estamos a caminho disso.

Alliance – Então, quais são as atividades que você tem visto como atividades chave para a Fundação Ford, historicamente falando?

LU – Estamos no começo do processo. Eu só estou aqui há apenas 6 meses. Estes temas serão muito mais específicos no próximo ano e serão comunicados de várias formas, de muito, mas muito claras.

Eu acho que se você pensar nos temas que define a Fundação, assuntos relacionados aos direitos das pessoas marginalizadas, as oportunidades econômicas e o acesso à elas, oportunidades de educação e o acesso à educação de qualidade, todos estes temas são basicamente temas de justeza. Estes são os temas que definem a Fundação; temas que indicam que nós, como cidadãos, não importando onde estejamos, temos o direito á justeza, acesso igualitário às oportunidades e ao direito a ser ouvido.

Alliance – Há áreas que você sente que são mais periféricas?

LU – Acho que é importante não pensar sobre áreas como sendo periféricas. Tudo o que estamos fazendo agora é importante. Eu não poderia apontar uma área onde de alguma forma, consideraria nosso trabalho periférico. A questão é tomar decisões difíceis no meio de assuntos muito importantes de modo que algumas delas possam ser avaliadas.

Alliance – O que você visualiza como seu principal desafio daqui em diante? LU – Cada novo papel traz desafios. Acho que ainda tenho que aprender muito. Todas as manhãs lembro, a mim mesmo, que ainda sou novo, que seis meses é muito pouco tempo. Penso que neste momento meu desafio mais importante é continuar ouvindo e aprendendo. Tenho o desafio para conhecer o ambiente, meus pares, meus amigos daqui da Fundação, nossos parceiros da comunidade filantrópica. E penso que tenho o desafio de saber como viver em Nova York, que é uma cidade mágica, mas que não vivo aqui há quase duas décadas e meia!

Alliance – Onde você gostaria de estar daqui a cinco anos?

LU – Eu gostaria de pensar que serei presidente de uma fundação que pensa realmente nos amplos desafios que estamos enfrentado globalmente; temas sobre acesso às oportunidades, pobreza e desigualdade social, respeito aos direitos humanos básicos dos cidadãos. De que nós, como fundação, estamos tão engajados nesses temas, centro de nossa história, que nossa economia e, o mais importante, nosso pessoal e nossos recursos estão claramente ligados e dimensionados à eles. Estamos progredindo, progresso que não se mede em meses ou até mesmo em anos, mas progresso medido com o tempo.

Alliance – O que espera alcançar no seu período como Presidente da Fundação Ford?

LU –Quando penso no que Frank Thomas e Susan Berresford fizeram, Frank Thomas ajudando a dar fim ao aparatheid e Susan, na área dos direitos civis institucionalizando os movimentos das mulheres e nos direitos humanos delas, a minha aspiração é deixar um legado como esses, um legado que eu possa apontar e dizer: “”este mundo é um lugar melhor porque a Fundação Ford, não Luis Ubiñas, mas a Fundação Ford se concentrou numa variedade de temas que fizeram a diferença entre as pessoas mais pobres e marginalizadas e nós conseguimos fazê-la para algumas delas.””.

Luis Antonio Ubiñas é o nono presidente da Fundação Ford desde Janeiro de 2008, sucedendo a Susan Berresford. Previamente ele foi Diretor da Mckinsey & Companhia, responsável pelas Práticas de Mídia da empresa. Neste cargo ele liderou uma pesquisa sobre o impacto das novas tecnologias nos negócios e na sociedade. Trabalhou junto às companhias tradicionais de mídia responsáveis pelos efeitos da nova mídia e com as empresas de tecnologias emergentes sobre a introdução dos novos serviços de mídia. Ele também fundou o grupo de recrutamento e aconselhamento Latino com o objetivo de introduzir e cultivar a diversidade de talentos dentro da Mckinsey.

Luis Ubiñas também dedicou muito do seu tempo e energia pessoal para trabalhar com empresas sem fins lucrativos. Ele tem sido conselheiro da Diretoria e serviu nos Diretórios da Leadership Edication and Development (LEAD) – algo como liiderança, educação e desenvolvimento – uma organização nacional que oferece oportunidades educacionais para estudantes afro-americanos e latinos de escolas de ensino médio, e a Fundação Steppingstone.

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