OSC em Pauta debate desafios e oportunidades do MROSC na política municipal de assistência social em São Paulo

Por: GIFE| Notícias| 29/08/2019

Durante o evento, o presidente do Tribunal de Contas do Município de São Paulo anunciou, em primeira mão, a abertura de uma Mesa Técnica no órgão para solucionar problemas na gestão de parcerias da área de assistência social

Em 15/08 foi promovida pela FGV Direito SP mais uma edição do OSC em Pauta, parte do projeto Sustentabilidade Econômica das Organizações da Sociedade Civil (Sustenta OSC), com foco na política municipal de assistência social na cidade de São Paulo. Estiveram presentes dezenas de pessoas e centenas participaram pela transmissão on line, sendo representantes de organizações da sociedade civil, gestores públicos, presidente do Tribunal de Contas do Minicípio, acadêmicos e demais interessados para debater os desafios e as oportunidades do MROSC na área.

Foram apresentados dados preliminares da pesquisa aplicada que vem sendo realizada por pesquisadores da FGV Direito SP, sob a coordenação de Thiago Donini, sobre os primeiros anos de implementação da lei 13.019/2014, conhecida como Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC). A pesquisa, iniciada a partir da regulamentação subnacional, foi se aprofundando na análise qualitativa de decretos e, por meio de entrevistas, medindo como os gestores públicos vêm essa implementação.

Patrícia Mendonça, da EACH USP, que desenvolve uma das frentes de pesquisa em parceria com a FGV Direito SP apresentou alguns indicadores colhidos nas entrevistas sobre a percepção dos gestores públicos subnacionais, realizada com 317 respondentes de 241 municípios e de 25 estados. Mais de 30% deles são formados em Serviço Social, e a maioria já tinha alguma experiência prévia com organizações da sociedade civil. Perguntados sobre como percebem o papel das OSC na atuação com o poder público, a maioria diz que há uma relação de complementaridade, e há uma avaliação positiva dos gestores sobre a participação dessas organizações em políticas públicas. Dentre os pontos positivos, boa parte dos respondentes concorda que o MROSC trouxe mais segurança jurídica e transparência. As dificuldades apontadas são dúvidas quanto a questões de interpretação da aplicação com relação aos órgãos de controle e dificuldades para as OSC trabalharem com a administração pública.

O Instituto de Psicologia da USP também tem se deparado com o tema MROSC em suas pesquisas. Mariana Prioli, do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho do Instituto, destacou uma dissertação de mestrado, de autoria de Maria Fernanda Aguilar Lara, que estuda discursos de profissionais do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) sobre as organizações da sociedade civil. Foram entrevistados vários profissionais e o MROSC apareceu no centro as questões abordadas, o que transformou a pesquisa em discursos de trabalhadores sobre os impactos do MROSC no campo dos serviços de assistência social.

Um segundo trabalho realizado no âmbito do Instituto foi a promoção de oficinas com trabalhadores do SUAS para promover espaços de debate e fortalecimento de redes. Os participantes avaliaram a regulamentação das parcerias entre poder público e organizações da sociedade civil como necessária e desejável, mas apontaram que o modo como MROSC foi implementado trouxe limitações, como falta de capacitação, falta de feedback dos gestores das parcerias e rigidez no projeto. As sugestões do grupo foram a realização de cursos de capacitação pela SMADS e a criação de canais de comunicação institucionais para o esclarecimento de dúvidas.

Durante o evento, houve manifestações bastante plurais dos presentes sobre dificuldades trazidas para os agentes que trabalham com serviço social na implementação do MROSC, tanto por parte do poder público como das organizações da sociedade civil. Dentre as questões, foi trazida a necessidade de capacitação dos servidores, de melhor definição acerca das responsabilidades trazidas para o gestor das contratualizações, relato das dificuldades em promover integração entre o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e o MROSC e necessidades específicas da área do serviço social que não seriam contempladas pela legislação, deixando clara a necessidade de espaços de mediação para dirimir dúvidas e encontrar consensos.

A Professora Aldaiza Sposati, da PUC/SP, ex-Secretária de Assistência Social do Município de São Paulo, ponderou que, em sua visão, o MROSC não é uma legislação concebida com foco no cidadão, o usuário final dos serviços. Também destacou que inovações do MROSC, como o chamamento público, já eram definidas pela legislação de São Paulo há muito tempo. Ressaltou, ainda, o risco de que as parcerias na assistência social dificultem a necessária unidade dos serviços sociais – ou seja, a garantia de direitos por meio de prestação de serviços sociais minimamente  padronizados. Destacou que exigências de prestações de contas em múltiplos formatos, como ocorre em alguns casos, é um indicativo dessa falta de unidade. A tipificação dos serviços de assistência social, assim, fica prejudicada na rede assistencial. Sugeriu, ainda, que as entidades integrantes do Fórum da Assistência Social se unam em torno da defesa da política de assistência social e não de interesses individuais. Também observou que os trabalhadores da assistência social da Prefeitura estão sujeitos à indevida responsabilização por acompanhamento de ações administrativas e financeiras que não deveriam ser atribuídas a eles. 

Soninha Francine, vereadora de São Paulo e ex Secretária da SMADS ressaltou problemas do próprio texto do MROSC, como a possibilidade de direcionamento de emendas parlamentares para OSC, que considera um erro legislativo. Salientou, ainda, desafios relacionados à tipificação de serviços sociais por diversas normas que não estão ao alcance do gestor municipal. Lembrou que o MROSC não inova em práticas que já eram da assistência social e não resolve dilemas anteriores, como delegação ou concentração de ações. Concordou que a falta de padronização dos serviços nos territórios é um problema persistente e não solucionado pela legislação. 

O presidente do Tribunal de Contas de Município de São Paulo, Conselheiro João Antonio, mencionou que MROSC representou uma avanço no plano nacional, reconhecendo, no entanto, a particularidade de São Paulo, com seus próprios avanços normativos. Destacou que a lei era necessária nacionalmente, mas está sujeita a aprimoramentos. Também lembrou que o TCM/SP tem mudado sua postura, saindo da posição de controle repressivo e posterior, assumindo posição mais voltada ao controle prévio e concomitante. Um dos mecanismos para essa finalidade será a chamada “Mesa Técnica”, definida no Regimento Interno do TCM, para viabilizar uma atuação de controle externo colaborativo, envolvendo os diversos agentes públicos e até mesmo privados na solução de questões controversas. A iniciativa, segundo ele, está fundamentada pela nova redação da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, que prevê mecanismo de solução administrativa voltada a eliminar irregularidade, incerteza jurídica ou situação contenciosa na aplicação do direito público. Durante o evento, João Antonio anunciou a instauração de uma Mesa Técnica específica para o tema das parcerias na assistência social.

Berenice Gianella, atual Secretária de Assistência Social e também de Direitos Humanos da Prefeitura de São Paulo, lembrou dos seus desafios para instituir parcerias no tempo em que dirigiu a Fundação Casa. Ressaltou a importância das parcerias para tornar a instituição mais transparente, mas lembrando que a padronização dos serviços é fundamental. Anunciou que a Secretaria pretende avançar na definição de normas técnicas por meio de um projeto já em andamento em parceria com o PNUD. Também mencionou a necessidade de centralização das contratualizações e das prestações de contas das parcerias com OSC, deixando as Supervisões de Assistência Social para atuação estritamente técnica. Também justificou a necessidade do decreto que reduziu os valores de parcerias, considerando a diminuição da demanda de determinados serviços. 

Regina Paixão, do Fórum da Assistência Social, destacou a importância do seminário para iniciar um diálogo direto entre os parceiros e a Prefeitura. Ressaltou que a introdução do MROSC exige contínuos aperfeiçoamentos, desafio que convive com os problemas da política pública de assistência social. Kelly Melatti, presidente do CRESS/SP, lembrou dos esforços do Conselho no sentido de exigir adequações por parte da SMADS para que o MROSC seja aplicado de forma compatível com os atributos dos cargos de assistentes sociais. Observou que as instruções normativas da Secretaria produzem insegurança jurídica para esses profissionais. Ressaltou que o CRESS/SP aguarda posicionamento formal por parte da SMADS quanto a esses questionamentos. 

Laís de Figueiredo Lopes, que liderou por cinco anos a articulação técnica e política da agenda do MROSC no Governo Federal, participando ativamente da elaboração da lei e demais alterações normativas no campo, ponderou que o MROSC, sendo transversal, é uma política meio, e explicou fragilidades que já existiam na assistência social antes da legislação. Apontou também a necessidade de um processo de implementação dialogado entre administração pública e organizações da sociedade civi e também a importância dos conselhos de fomento e colaboração, previstos na legislação, que se responsabilize por essa relação intersetorial.

Também estiveram presentes a procuradora Rosana Pinheiro, assessora jurídica de SMADS; Mariana Chiesa, ex-chefe de gabinete de SMADS; Luis Regules, Chefe de Gabinete de Governo à época em que foi editado o decreto municipal do MROSC em São Paulo; Alexis Vargas, Secretário Adjunto de Governo; além dos pesquisadores da FGV Thiago Donini e Aline Gonçalves, da Universidade Federal do ABC, Carolina Gabbas Stucchi e da EACH USP Patrícia Mendonça da.

O OSC em Pauta integra o projeto Sustentabilidade Econômica das Organizações da Sociedade Civil, realizado pelo Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE) e pela Coordenadoria de Pesquisa Jurídica Aplicada (CPJA) da FGV Direito São Paulo, em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e com apoio da União Europeia, Instituto C&A, ICE, Instituto Arapyaú e Fundação Lemann.


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