OSC em Pauta debate Fortalecimento institucional das organizações indígenas

Por: GIFE| Notícias| 27/11/2017

Com o objetivo de gerar espaços de reflexão e debate sobre o universo das Organizações da Sociedade Civil (OSCs), a FGV Direito SP, em parceria com o GIFE, via projeto Sustentabilidade Econômica das OSCs, criou a iniciativa OSC em Pauta.

A iniciativa promove a troca de informações qualificadas entre pesquisadores da FGV e de outras instituições, docentes, discentes, organizações da sociedade civil e especialistas convidados sobre aspectos jurídicos relevantes que estejam em pauta no poder Legislativo, Executivo ou no Judiciário. Eventualmente, podem ser convidados representantes de órgãos públicos que estejam lidando com as temáticas envolvidas.

Um aspecto importante a ser destacado é o esforço de inovação dessa iniciativa, buscando aproximar estudiosos de áreas jurídicas diversas, como direito constitucional, tributário, societário e público, mas que ainda não desenvolvem reflexões específicas no campo das OSCs.

“Além de ‘arejar’ os espaços de debate, contribuindo para a qualificação das reflexões e propostas de aperfeiçoamento normativo, a abordagem do OSC em Pauta se mostra estratégica pois, ao atrair importantes referências acadêmicas para participar de debates sobre os estudos focados nas OSCs, auxilia na disseminação de informações sobre o campo para outras áreas e, com isso, aumenta a possibilidade de melhor compreensão sobre as organizações, seu ambiente normativo e importância de suas atuações”, explica Aline Gonçalves, pesquisadora da FGV.

Segundo Aline, a ideia é realizar seis encontros presenciais por ano, mediados pela Coordenadoria de Pesquisa Jurídica Aplicada da FGV Direito SP. Após os eventos, uma sistematização contendo a síntese dos debates é disponibilizada, de modo a auxiliar na disseminação dos resultados das pesquisas desenvolvidas;  debater seus aspectos metodológicos e de conteúdo; identificar agendas de estudo em comum para construção de potencialidades ao projeto; e subsidiar a elaboração de artigos, vídeos e materiais de comunicação, com posteriores ações de incidência.

O OSC em Pauta se soma às reuniões do grupo de discussão do projeto Sustentabilidade Econômica das OSCs, cujo objetivo é promover escuta e debate junto às organizações da sociedade civil para melhor ajustar os focos de incidência do projeto.

 

Fortalecimento institucional das organizações indígenas

No dia 14/11, a FGV Direito SP em parceira com Dora, Azambuja e Oliveira advocacia para Direitos Humanos,  promoveu o quinto encontro OSC em Pauta, cujo tema foi Fortalecimento institucional de organizações indígenas e o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil.

O evento foi precedido de um encontro na noite anterior, aberto ao público interessado nas questões, que debateu conjunturas e desafios dos povos indígenas.

O debate partiu da premissa que, embora a Constituição Federal de 1988 represente um importante avanço por ter reconhecido aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças, tradições e direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, fortes pressões vêm ocorrendo para restringir esses direitos, como a adoção da tese do marco temporal, iniciativas para o arrendamento de terras, criminalização de lideranças indígenas, CPI da Funai e Incra, além de apresentação de proposições legislativas que ameaçam os direitos indígenas.

Participaram desse momento Paulo Celso de Oliveira Pankararu (Dora, Azambuja e Oliveira – Advocacia de Direitos Humanos); Angela Amanakwa Kaxuyana (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB); Telma Taurepang (União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira – UMIAB); Cacique Darã (Articulação dos Povos Indígenas de São Paulo e Rio de Janeiro – ARPINSUDESTE); Paulo Tupiniquim (Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – APOINME); Eder Terena (Conselho Terena); e Lucia Fernanda Jófej Kaingang, (Instituto Indígena Brasileiro para Propriedade Intelectual – INBRAPI).

O debate foi mediado por Luiz Henrique Eloy, advogado do Conselho Terena, e contou também com a participação do diretor da FGV Direito SP, Oscar Vilhena; e de Aline Gonçalves de Souza (pesquisadora da FGV Direito SP).

A tônica das falas foi a necessidade de se manter os direitos indígenas garantidos por lei e não permitir retrocessos.

“Para que nossos direitos fossem garantidos na Constituição de 1988, lutamos desde 1.500. Isso é resultado de muita resistência, desde 1.500, quando começaram a atacar nossos direitos enquanto povos. O não indígena gosta muito de papel, mas não segue. E nós seguimos o que determinamos como certo. Nossa luta hoje é para defender o que está escrito lá, que vocês escreveram e que a gente lutou para estar lá. Porque os ruralistas querem é exatamente tirar aquelas letas que dizem que garantem nossos direitos. Mas nossos direitos estão muito além daquela escrita”, apontou Angela Amanakwa Kaxuyana.

Paulo Tupiniquim lembrou uma fala de Dalmo Dalari, de que as terras indígenas independem da demarcação. “A demarcação é apenas um ato administrativo, porque nós, os povos indígenas, sabemos onde começa e acaba nossa terra. Fronteira foi o homem branco que colocou. A Constituição fixou um prazo de cinco anos para poder demarcar todas as terras indígenas. Na maioria dos estados do Nordeste o que acontece ainda é a criminalização de indígenas pela defesa do seu território. Quantas lideranças se matam por que não têm suas terras? Quantas mulheres e crianças indígenas morrem na defesa de suas terras? ”

“Não queremos novas leis, basta respeitar as que já existem. Vamos brigar com todos os recursos que nós tivermos para que a Constituição permaneça. Sem terra, não tem povo”, disse Lucia Fernanda Jófej Kaingang.

Oscar Vilhena avaliou, ao fim do encontro, que poucas vezes participou de uma reunião tão legalista: “Vocês só falaram em respeitar a Constituição, os tratados internacionais. Vejo outros grupos que pensam em se armar, em subverter a Constituição, e aqui todas as falas foram sobre de que maneira se protege a Constituição, os direitos, a democracia. De que forma os compromissos firmados nessa democracia curta vão ser respeitados. Como advogado, me sinto emocionado, como todos os outros que partilham dessa fé de que o direito é indispensável para lutar pela paz e pela garantia de direitos, apesar de todas as suas limitações”.

No dia 14/11, as lideranças, pesquisadores, advogados e demais envolvidos com o tema voltaram a se reunir, dessa vez para debater o fortalecimento das organizações indígenas e o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil.

Os temas abordados ao longo do dia foram: organizações indígenas e liberdade associativa, tributação incidente sobre as organizações, parcerias com o poder público, além da apresentação de projetos financiados pela União Europeia sobre a lei nº 13.019/2014. O Instituto Socioambiental (ISA), que desenvolve estudo financiado pela União Europeia exatamente sobre o tema da lei 13.019 aplicada às organizações dos povos tradicionais, apresentou o trabalho que vem sendo desenvolvido.

Carlos Frederico Marés de Souza Filho, professor da PUC/Paraná e advogado, apontou que a diferença entre a representação jurídica exigida pelas associações e as lideranças indígenas é que a representação indígena deve ser definida pela própria comunidade, por questão de autodeterminação. Na relação direta desses povos com o estado brasileiro, ainda existe a previsão do exercício da autodeterminação, mas quando são estabelecidos contratos com particulares a dificuldade aumenta.

Marés destacou a necessidade de criar alternativas para resolver esse problema, formas de fazer diferente. Na comercialização dos produtos, por exemplo, muitas vezes é preciso ter estruturas jurídicas capitalistas para a mercantilização e distribuição dos produtos. Algumas organizações têm resolvido fazer via cooperativa, mas ele vê desvantagens porque dá muito poder à direção. E como vantagem, aponta o fato de que podem participar apenas os que fazem a produção.

Paula Storto, advogada, mestre em Direito e membro do NEATS PUC SP, levantou a necessidade de uma proposta específica para as associações indígenas, no caso do MROSC e de outras legislações, tendo em vista que o universo dessas organizações é especialmente reconhecido pela Constituição Federal, mas na prática não se efetiva. Dentre exemplos de condutas que corroboram essa afirmação ela cita: Código Civil que fere a liberdade de auto-organização; o acréscimo, pelos cartórios, de várias outras questões sem amparo em lei; barreira ao acesso aos espaços de participação e ao direito de financiamento público/privado.

Participaram do evento também Paulo Celso de Oliveira Pankararu e Marcelo Azambuja (advogados do escritório Dora, Azambuja e Oliveira), Luiz Henrique Eloy (advogado do Conselho Terena), Dinaman Tuxa (advogado da Apoinme), Eloísa Machado (Supremo em Pauta – FGV Direito SP), Dimas Fonseca Pereira (advogado da COIAB​), ​Élida Lauris​ (Fórum Justiça), Laís de Figueiredo Lopes (ex-assessora Especial da SG/PR e advogada na área do terceiro setor), Carolina Gabas Stuchi (pesquisadora da FGV Direito SP), Susana Kaingang (advogada do Inbrapi), Rosivaldo Rodrigues Teles (FOIRN), Carlos Barreto (Gestor de Projetos do PRN/ISA), e Juliana Batista (advogada do ISA).

O encontro contou com o compartilhamento de relatos por parte das lideranças e organizações indígenas a respeito dos obstáculos que enfrentam, abrindo assim uma agenda de temas a serem estudados e trabalhados para que haja aperfeiçoamento do ambiente normativo e de sua aplicação prática.

Outros Temas

Além desta edição do OSC em Pauta, outras quatro já foram realizadas. Um sexto encontro está previsto para o dia 15/12, quando serão apresentadas as principais questões desenvolvidas em cada pesquisa em andamento.

A iniciativa OSC em Pauta é parte do projeto Sustentabilidade Econômica das Organizações da Sociedade Civil, realizado pelo GIFE e pela Coordenadoria de Pesquisa Jurídica Aplicada (CPJA) da FGV Direito São Paulo, em parceria com o IPEA (Instituto de Pesquisas Aplicadas) e com apoio da União Europeia, Fundação Lemann, Instituto Arapyaú e Instituto C&A.

Confira como foram os encontros anteriores:

Mapeamento Preliminar dos temas das Pesquisas

Realizado em 13 de julho, na FGV Direito SP. Foram apresentados metodologia e conteúdo do mapeamento de referências acadêmicas, dados e comunicação sobre os temas das pesquisas do Projeto Sustentabilidade Econômica das OSCs. O encontro contou com a presença de especialistas da área, com o objetivo de identificar os próximos passos e demais esforços de produção de conteúdo, sobretudo no que diz respeito à Lei 13.019/2014.

Estudos elaborados na EACH/USP

Realizado no dia 14 de agosto de 2017, na FGV Direito SP.O encontro contou com a presença da Professora Patrícia Mendonça para apresentação do resultado de pesquisas sobre parcerias com OSCs para o desenvolvimento de políticas públicas brasileiras, com recomendações para a pesquisa que está sendo realizada sobre a Lei 13.019/2014.

Direito do Terceiro Setor no Reino Unido: Riscos e Conformidade

Este encontro foi realizado pela FGV, em parceria com o Comitê de Estudos de Criminal Compliance da OAB-SP, e contou com a presença da advogada britânica Nicole Reed. Realizado no dia 06 de outubro de 2017, explorou as questões de direito comparado com o Reino Unido e Charity Commission, além de se aprofundar nas questões relacionadas aos endowments (fundos patrimoniais) e incentivos fiscais para doações às OSCs. Assista ao debate na íntegra aqui.

Seminário de Pesquisa: O processo de implementação da Lei 13.019/2014

Realizado no dia 30 de outubro de 2017, na FGV Direito SP. O encontro apresentou uma versão preliminar da pesquisa sobre o MROSC, que está sendo realizada no âmbito do projeto Sustentabilidade Econômica das OSCs. O evento contou com cerca de 30 convidados, dentre dirigentes de OSCs, pesquisadores, estudantes e advogados.

Como conclusão preliminar da pesquisa apresentada no Seminário, a equipe responsável destaca a baixa regulamentação do MROSC nos Estados e Municípios (aproximadamente 5.490 Municípios ainda não implementaram). Já no que se refere aos atos normativos da União, os pesquisadores concluem: (1) existência de uma grande quantidade de atos normativos relacionados ao MROSC; (2) diversidade de órgãos/pessoas jurídicas que tratam do assunto; (3) diferentes espécies de atos, sendo que o tema é muito debatido em diversas áreas de atuação; (4) e a importância da verificação da implementação do MROSC e sua regulamentação, especialmente na União.


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