Pesquisa aponta oportunidades para advocacy em ações de interesse das OSCs em andamento no STF

Por: GIFE| Notícias| 13/02/2020

O primeiro encontro do Grupo Sustenta OSC em 2020, realizado no dia 04 de fevereiro, na sede da Fundação Tide Setubal, em São Paulo, foi oportunidade para apresentar os  principais achados da pesquisa Agenda da sustentabilidade das organizações da sociedade civil no Supremo Tribunal Federal, um levantamento inédito de ações judiciais em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF) relacionadas ao tema da sustentabilidade das organizações da sociedade civil (OSCs).

A iniciativa consiste no mapeamento de ações em andamento no STF de interesse das OSCs de modo a incentivar e facilitar a incidência de atores do campo. Na ocasião, a pesquisadora Luíza Pavan Ferraro, da FGV Direito SP, compartilhou com os representantes das organizações presentes informações sobre a pesquisa, com destaque para seis ações.

O estudo foi desenvolvido a partir do trabalho das pesquisadoras Eloísa Machado e Luíza Pavan, do Supremo em Pauta, grupo de acompanhamento permanente das pautas do STF.

Além do relatório com a síntese das ações, o estudo deu origem também a um banco de dados que compila informações detalhadas sobre cada ação. A ideia é que esse banco seja atualizado permanentemente e possa servir como ferramenta de advocacy para as organizações. Tanto o relatório, quanto o banco devem ser disponibilizados em breve.

Metodologia

O levantamento foi realizado a partir de um universo de 30 mil ações que compõem hoje o acervo do STF. Por meio da busca e do mapeamento de ações de controle concentrado de constitucionalidade, recursos extraordinários com repercussão geral, notícias do STF e termos na planilha do acervo do STF, os pesquisadores do Supremo em Pauta chegaram a 181 ações de interesse para a agenda de sustentabilidade das OSCs.

Esse conjunto de ações foi classificado por classe processual, relator, autoria, relevância, tema, entre outras categorias. Entre alguns dos temas de alta relevância para a agenda das organizações da sociedade civil estão Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), licitação e OSCIP, caracterização da imunidade e pertinência, prestação de contas e controle do governo sobre as atividades das OSCs, por exemplo.

Luíza destaca que mais de 76% das ações não possuem amici curiae, expressão em Latim utilizada para designar uma instituição ou pessoa que tem por finalidade fornecer subsídios às decisões dos tribunais, oferecendo-lhes melhor base para questões relevantes e de grande impacto. Neste caso, as organizações podem atuar como amici curiae fornecendo informações relevantes sobre o tema ou pauta da ação de modo a prover o juiz de perspectivas que suportem sua decisão. Ou seja, requerer participação como amici curiae é um modo de incidir nas pautas de interesse das OSCs.

“Nosso objetivo com essa pesquisa não é somente chamar atenção para questões que serão decididas pelo tribunal, mas também para o que a sociedade civil pode fazer para auxiliar os ministros levando informações para promover, quem sabe, algum tipo de alteração nessas decisões”, explicou a pesquisadora.

Das 181 ações de interesse para a agenda de sustentabilidade das OSCs mapeadas pelo levantamento, apenas 24% possuem algum pedido de participação como amici curiae, o que, segundo a pesquisadora, está abaixo da média das ações de forma geral, que é de 33%. Entre as ações de alta relevância, esse número cai para 12%.

Entre os critérios para a permissão dos amici curiae pelos ministros está a relevância do tema e a representatividade dos solicitantes. Os principais requisitantes são associações de classe, associações profissionais, sindicatos, federações e confederações; associações de defesa de direitos/organizações não governamentais; e associação de empresas.

“Essa forma de participação ajuda os ministros a ter a visão de quem está inserido na discussão e dos interesses que envolvem a ação. E é muito positiva para quem tem interesse no resultado das ações. A contribuição dos amici curiae pode se dar por meio de memoriais, sustentação no dia do julgamento, articulação entre atores interessados, etc.”, observou Luíza.

Ações de destaque

A pesquisadora destacou seis ações entre as 181 que compõem o levantamento. São elas:

► ADI 2028, ADI 2036, ADI 2228, ADI 2621 e RE/RG 566622 – caracterização da imunidade e pertinência, movidas por entidades de educação e assistência social sem fins lucrativos (as ADIs não possuem requisição de amici curiae, mas o RE/RG 566622 sim)

► RE/RG 851108 – competência legislativa / possibilidade de os estados legislarem a respeito do ITCMD enquanto não houver uma lei nacional (não possui requisição de amici curiae)

► ADI 5236 – participação nos lucros, movida por Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (não possui requisição de amici curiae)

► RE/RG 636886 – ressarcimento ao erário (somente Tribunal de Contas da União como amici curiae)

► ADI 6076 – supervisão das OSCs, movida por Rede Sustentabilidade – decisão da ministra Cármen Lúcia por perda de objeto em virtude de retirada de artigo da lei (não recebeu requisição de amici curiae)

► PET 8481 – queixa-crime movida por Greenpeace contra declaração de ministro Ricardo Salles (não possui requisição de amici curiae)

A escolha da estratégia para requisição como amici curiae, se individualmente ou de forma articulada, foi um dos pontos debatidos pelos presentes. As falas registraram pontos positivos em ambas as condutas, tanto a força e a convergência demonstradas por manifestações diversas, quanto a força acumulada e coletiva representada por uma articulação de organizações com legitimidade sobre determinado tema. Outro ponto levantado pelo grupo foi a importância de identificar outros atores interessados na ação, o que pode dar mais força ao trâmite.

Futuro

Sobre os próximos passos da iniciativa, Aline Viotto, coordenadora de advocacy do GIFE, destacou o desafio de dar continuidade à atualização do banco de dados. “Precisamos identificar organizações interessadas e disponíveis tanto para dar seguimento à atualização do banco, quanto para construir uma estratégia conjunta de atuação no judiciário.”

A publicação que apresenta uma análise detalhada deste banco de ações está no prelo com previsão de publicação no final do primeiro semestre de 2020.

Tributação da doação e Lei de Fundos Patrimoniais

Além da apresentação e do debate em torno da pesquisa, o grupo aproveitou o primeiro encontro do ano para informes e atualizações sobre o andamento de agendas como ITCMD e Lei de Fundos Patrimoniais.

Inspirado na lei federal 13.800/2019 (conhecida como Lei dos Fundos Patrimoniais), o estado do Rio de Janeiro publicou a Lei nº 8.718/2020, que regula os fundos patrimoniais que apoiam instituições públicas do próprio estado. 

A Secretaria de Estado da Fazenda do Rio de Janeiro (SEFAZ/RJ) emitiu parecer técnico favorável à isenção tributária de doações a fundos patrimoniais, fundamentando-se no inciso XVIII do art. 8º da Lei nº 7.714/2015 (a Lei Estadual do ITD – Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos). De acordo com o posicionamento da SEFAZ/RJ, a atual legislação de ITD é suficientemente ampla e abrangente para beneficiar as doações destinadas a fundos patrimoniais com a isenção tributária.

Apesar do parecer favorável, Aline Viotto, coordenadora de advocacy do GIFE, observou o desafio de reconhecimento do direito previsto em lei pelo poder executivo, além da necessidade de as organizações entrarem com pedido de isenção a cada doação e a demora do estado na resposta.

Já em relação ao ITCMD, o governo do estado de São Paulo publicou no dia 14 de dezembro três resoluções conjuntas que ampliam de um para três anos o prazo de vigência dos certificados de reconhecimento de instituição e da declaração de isenção do imposto.

A medida foi celebrada pelas organizações a partir do entendimento de que facilita os procedimentos para reconhecimento da isenção.

O grupo lembrou, no entanto, que a medida se aplica apenas às organizações que atualmente já têm suas isenções previstas na legislação, ou seja, organizações culturais, ambientais ou de direitos humanos.

Nesse sentido, tem sido debatido com o governo do estado de São Paulo uma proposta de ampliar a isenção para todas as doações direcionadas a organizações de interesse público, independente da causa em que atuam.

Os encontros do Grupo Sustenta OSC são bimestrais. A próxima reunião está prevista para acontecer em 07 de abril.


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