Pesquisa aponta tendências de investimento para a causa dos direitos das mulheres
Por: GIFE| Notícias| 12/05/2014Questões ligadas aos direitos das mulheres, cada vez mais, ganham projeção na imprensa, no mercado formal de trabalho e nas discussões sobre relações familiares. Contudo, ao passo que o tema engaja parte da população, alguns assuntos ainda são encarados como tabu.
A pesquisa “Onde está o dinheiro para os direitos das mulheres no Brasil?”, que teve dados preliminares apresentados em primeira mão no Congresso GIFE 2014, aponta como investidores se associam à causa e como organizações, coletivos e movimentos sociais lutam para sobreviver com poucos recursos.
Coordenada pela AWID (Association for Women’s Rights in Development), a sondagem foi realizada entre fevereiro e maio de 2013 e contou com a participação de 403 organizações na fase quantitativa e, na etapa qualitativa, com sete entrevistas com lideranças de organizações de mulheres e feministas e oito entrevistas com financiadores.
Rosana Heringer, professora da UFRJ, colaboradora de AWID e Conselheira do Elas Fundo de Investimento Social, conversou com o redeGIFE para comentar os dados e refletir porque organizações sociais que atuam com direitos das mulheres no Brasil ainda encontram tanta dificuldade para se desenvolver institucionalmente, garantir sua sustentabilidade econômica e ajudar a pautar o debate sobre o papel e os direitos da mulher no Brasil atual.
Tabus e obstáculos
O estudo aponta que a maioria das entrevistadas possui mais de cinco anos de atuação (cerca de 39% nasceram entre 2000 e 2009). Outra parcela relevante, 29%, começou a atuar ainda na década de 1990. Por outro lado, mesmo em estágio de maturidade, essas organizações afirmam ainda encontrar grandes dificuldades para mobilizar recursos e conquistar financiamento para suas causas.
Temas específicos, dentro da temática geral, representam dificuldades ainda maiores. Assuntos como tecnologias de informação e comunicação; microcrédito; laicidade do Estado; feminismo e saúde e direitos reprodutivos parecem ser pouco atrativos para financiadores, de acordo com o resultado da pesquisa.
Rosana explica que alguns temas ainda são considerados tabus e acabam espantando investimentos. “Percebemos que a resistência a estes temas não tem diminuído, mas aumentado. Infelizmente assistimos nos últimos anos um aumento da visibilidade do discurso conservador no âmbito dos costumes, comportamentos, práticas religiosas etc., e isso se reflete também na disponibilidade de recursos para trabalhos de advocacy relacionados, por exemplo, aos temas apontados na pesquisa.”
O estudo mostra também que as organizações atuantes nessa causa passam por sérias dificuldades para manter seus custos operacionais e conquistarem sua sustentabilidade financeira. Entre as 92 organizações que responderam a essas questões, 39% informaram que tiveram uma redução de valores em relação ao que haviam planejado para o ano. E mais: 40% das organizações informaram que não possuíam nenhum tipo de reserva e apenas 39% informaram possuir algum tipo de patrimônio.
Apesar dos dados alarmantes, Rosana acredita haver espaço para financiamento de programas e projetos ligados aos direitos das mulheres e que os investidores privados podem ser um importante elemento para a virada desse cenário. Confira trechos da entrevista com a pesquisadora:
redeGIFE – Olhando especificamente para o cenário de financiadores privados, você acha que ainda existe certa resistência para o financiamento de programas e projetos ligados aos direitos das mulheres no país?
Rosana Heringer – Acredito que existe uma abertura para o financiamento de programas e projetos ligados aos direitos das mulheres, mas talvez com maior possibilidade de apoio para determinadas temáticas como violência contra a mulher, por exemplo, e menor abertura para outras. Mas devemos levar em conta que o universo dos financiadores privados é muito variado e existe espaço para diferentes possibilidades de apoio. Não é um quadro fechado, mas sim de grande diversidade.
redeGIFE – O Elas Fundo de Investimento aparece como a segunda principal fonte financiadora de ações. Como o fundo consegue mobilizar recursos para apoiar essas organizações e de que forma esse trabalho conecta potenciais investidores e organizações que demandam recursos?
Rosana Heringer – O Elas Fundo de Investimento Social é uma organização que atua no Brasil há mais de 10 anos justamente como a única organização no país dedicada a apoiar projetos, organizações e iniciativas de mulheres, e já beneficiou centenas de organizações nesse período. O Fundo capta recursos junto a financiadores internacionais e nacionais e redistribui estes recursos através de concursos de projetos que acontecem regularmente. Neste sentido, o Fundo é um importante meio de conectar potenciais investidores e organizações e que, sem o Fundo, dificilmente chegariam a acessar esses recursos.
redeGIFE – Muitas organizações afirmaram não terem recursos de reserva, pouco verba para comunicação e não contarem com patrimônio próprio. Você acredita que ainda falte capacitação para a gestão entre as organizações que atuam com essa causa no Brasil? Qual seria o “”caminho das pedras”” para seu desenvolvimento institucional? A pesquisa aponta possibilidades?
Rosana Heringer – O tema da gestão apareceu como um ponto importante da pesquisa, reconhecido tanto por parte das organizações de mulheres quando pelos financiadores entrevistados. Infelizmente não há um “caminho das pedras”, mas sem dúvida é importante que financiadores apoiem também ações para fortalecimento das organizações e grupos de mulheres. Essa é, por exemplo, uma preocupação central do Fundo Elas. Entre as possibilidades apontadas pela pesquisa está, por exemplo, a atuação conjunta de organizações em projetos comuns, com a finalidade de reduzir custos e otimizar a gestão dos projetos.
redeGIFE – Pelo cenário observado, quais são as principais perspectivas de financiamento para os próximos anos?
Rosana Heringer – A pesquisa aponta para uma diversificação das fontes de financiamento para os projetos e organizações de mulheres, com a presença mais forte do investimento social privado, ao lado do investimento público, das doações individuais de pessoas físicas, juntamente com a área de financiamento coletivo que tem crescido bastante no Brasil, mas ainda é pouco utilizada pelas organizações de mulheres.
redeGIFE – Caso um investidor social privado queira apoiar programas, projetos ou ações de instituições que atuam com direitos das mulheres, por onde começar? Como chegar no tema e apoiar iniciativas relevantes?
RH – É muito importante que o investidor social privado interessado em apoiar projetos neste tema em primeiro lugar se informe sobre as organizações existentes, observando não apenas o indicador de resultados dos projetos, mas também seu histórico, sua relação com a comunidade e onde atua, seus princípios e objetivos de longo prazo. Os fundos independentes que atuam no Brasil, como o Elas Fundo Social, também podem ser uma fonte importante de informação sobre os grupos que apoiam e o cenário das organizações de mulheres que fazem diferença no Brasil.
Para saber mais, acesse o site do Elas Fundo de Investimento Social.