Pesquisa apresenta recomendações para a melhoria da qualidade da gestão escolar a partir dos desafios e estratégias vivenciados na pandemia em dez municípios brasileiros

Por: Fundação Itaú Social| Notícias| 22/05/2023

Durante a pandemia de Covid-19, os diretores de escolas no Brasil tiveram a responsabilidade de coordenar todos os esforços para garantir que os vínculos dos estudantes com a escola fossem mantidos, assim como a aprendizagem. Nesse processo, colocaram em prática estratégias e enfrentaram desafios que devem ser levados em consideração para embasar políticas e recomendações não só para tempos de crise, mas para o cotidiano escolar.

Assinado por Lara Simielli, Maria Teresa Gonzaga Alves, Valéria Cristina Oliveira, Flavia Pereira Xavier e Gabriela Lotta, o Relatório de Política Educacional Gestão Escolar em Tempos de Crise – O Que a Pandemia Pode Nos Ensinar Para o Futuro? apresenta as estratégias e os problemas comuns vividos por diretores escolares de dez municípios do Brasil que declararam boas ações de enfrentamento à pandemia.  

A pesquisa destaca os desafios agravados no período, como aprofundamento das desigualdades, problemas relacionados ao acesso e uso das tecnologias e rotatividade de gestores escolares. Dentre as recomendações, destacam-se a necessidade de fortalecer a gestão escolar e permanência de diretores por meio de atribuição de critérios técnicos para a  seleção,  além de garantir  formações contínuas e oferecer espaços de trocas entre pares e entre a comunidade escolar, sobretudo com as famílias dos estudantes.

“O estudo reforça o papel fundamental que os gestores e demais membros das comunidades escolares têm para gerar uma  transformação mais sistêmica e perene na educação do nosso país, como por meio do maior envolvimento da escola com a família, da colaboração entre secretarias e da estruturação de planos de desenvolvimento para os gestores escolares. Além disso, o relatório foi crucial para que os diretores pudessem compreender as dificuldades e a realidade dos alunos, principalmente daqueles em situação de vulnerabilidade social, e oferecessem alternativas para manter a rotina de aprendizagem. O relatório apresenta um compilado com informações riquíssimas e com potencial de trazer reflexões que podem mudar o olhar de toda a comunidade escolar, a partir das experiências e desafios impostos pela pandemia”, destaca Patricia Mota Guedes, superintendente do Itaú Social – instituição parceira na realização. 

Para organizar o estudo, os pesquisadores usaram como base os dados da pesquisa “Resposta Educacional à Pandemia de Covid-19 no Brasil”, realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), entre fevereiro e maio de 2021. Detalhes sobre a metodologia utilizada são apresentados no artigo Isolamento para todos, educação para poucos: o que a análise das estratégias educacionais no primeiro ano da pandemia nos ensina sobre o acirramento das desigualdades escolares no Brasil, assinado por Maria Teresa Gonzaga Alves, Valéria Cristina Oliveira e Flavia Pereira Xavier, pesquisadores do Núcleo de Pesquisas em Desigualdades Escolares da Universidade Federal de Minas Gerais (Nupede/UFMG); e Pedro Araújo Patrício. x

Desafios enfrentados pelos diretores
Os profissionais entrevistados pelos pesquisadores revelaram oito problemas que enfrentaram durante o período da pandemia:
1. Sobrecarga de trabalho e saúde mental: o Whatsapp ampliou as jornadas de trabalho e os gestores passaram a ser acionados a todo momento. Sobrecarregados e muitas vezes com baixo apoio do Estado, foram frequentes relatos de piora da saúde mental.
2. Rotatividade: muitos diretores assumiram o cargo na pandemia, sem nenhum tipo de formação, o que gerou custo adicional de aprendizagem com a troca e com a gestão da crise.
3. Resistência ao ensino remoto: no início do isolamento, docentes e estudantes tiveram dificuldade para lidar com a tecnologia, tanto pelo acesso à internet e equipamentos quanto pela falta de conhecimento das ferramentas.
4. Variações nos apoios dos governos: na ausência de coordenação do governo federal, variou o apoio oferecido pelas secretarias de Educação municipais e estaduais. Em muitos casos, as responsabilidades recaíram sobre diretores e professores.
5. Demora na tomada de decisões: na expectativa de que a pandemia fosse passageira, muitos municípios demoraram a tomar decisões estruturadas, transcorrendo-se meses até que as aulas fossem oferecidas em formato remoto. Várias estratégias foram desenhadas de maneira improvisada.
6. Tecnologia: o acesso à internet e a equipamentos foi um dos fatores que determinou as experiências de ensino e aprendizagem. Com isso, evidenciou-se uma desigualdade já existente no País, mas que recebia pouca atenção no período pré-pandemia.
7. Ausência de infraestrutura nas escolas: na retomada presencial, diretores tiveram de enfrentar desafios antigos de infraestrutura das escolas, evidenciados pela pandemia, como ausência de computadores, pias e acesso à água.
8. Ampliação das desigualdades: estudantes mais vulneráveis de comunidades rurais, quilombolas e com deficiência foram os mais prejudicados. Além da conectividade, houve dificuldade de deslocamento até as escolas para recebimento das atividades impressas e de acompanhamento das aulas em casa.

Estratégias colocadas em prática
O estudo identificou boas estratégias de ensino adotadas durante a pandemia:
1. Atividades impressas: entregues aos estudantes nas escolas ou diretamente no endereço residencial. Em alguns casos, foram complementadas por atividades on-line, com vídeos no Whatsapp ou aulas em plataformas, como o Google Meets.
2. Comunicação:
os grupos de Whatsapp foram a principal estratégia de comunicação com a comunidade escolar, e muitos diretores participaram de todos os grupos criados. Uma escola nomeou o seu grupo de “Perdidos na Noite”, traduzindo o sentimento de desamparo do início da pandemia.
3. Foco prioritário da gestão escolar:
durante o isolamento, o foco dos diretores foi manter o vínculo com estudantes e familiares, assegurando que as atividades fossem acompanhadas pelo maior número de alunos possível.
4. Nova relação família-escola e aproximação da comunidade escolar:
grupos de Whatsapp, visitas domiciliares e contato na retirada dos materiais aproximaram diretores, estudantes e suas famílias, gerando maior empatia. Os diretores conheceram melhor os estudantes e seu contexto. As famílias passaram a valorizar professores e escolas.
5. Gestão democrática:
frente a desafios muito complexos, as decisões foram tomadas de maneira mais participativa, envolvendo os docentes, o grupo gestor e a comunidade escolar, de modo a construir consensos e engajamento coletivo nas decisões.
6. Redes e intersetorialidade:
o enfrentamento da pandemia dependeu da articulação em rede de atores do setor público, do setor privado, do terceiro setor e das universidades para atender às necessidades dos estudantes de forma integral.

Recomendações
Com base no que foi levantado no estudo, os pesquisadores apresentam sete recomendações para melhorar o cotidiano escolar:
1. Humanizar as relações entre família e escola: manter as estratégias de comunicação, especialmente por meio de grupos de Whatsapp, e atender as famílias individualmente, seja por meio de visitas domiciliares (quando possível), seja em horários individuais de atendimento na escola para todos.
2. Desnaturalizar injustiças: estabelecer e monitorar padrão mínimo de infraestrutura a ser alcançado por todas as escolas e pactuado entre os diferentes níveis de governo, que inclua quesitos relativos à conectividade e tecnologia; alocar recursos a partir de discriminação positiva e inserir conteúdo sobre equidade na preparação de futuros líderes escolares.
3. Definir com clareza o papel do Estado e dos gestores escolares para não depender de heróis: na discussão sobre o Sistema Nacional de Educação, definir competências e responsabilidades de cada ente federativo e da gestão escolar, apontando como serão avaliados, monitorados e cobrados pelos órgãos de controle.
4. Repensar as políticas públicas voltadas aos gestores escolares: desenvolver um marco para a gestão escolar, com definições das dimensões centrais da função; utilizar critérios técnicos para a seleção dos diretores escolares; estabelecer tempo mínimo de permanência no cargo; oferecer um programa de desenvolvimento aos diretores escolares, que pense na formação de maneira integrada (inicial, indução e continuada) e criar e institucionalizar espaços de trocas de experiências entre pares.
5. Valorizar colaboração, intersetorialidade e parcerias com outros setores: expandir atuação intersetorial entre as diferentes secretarias; ampliar parcerias com diferentes setores, garantindo uma rede de apoio para escolas e estudantes e garantir o trabalho colaborativo entre os diferentes níveis de governo.
6. Focar na aprendizagem dos estudantes: dar ênfase na retomada das aprendizagens de forma ampla, com diferentes estratégias e atentando para diferentes necessidades dos estudantes nesse período, além de fortalecer a atuação em rede com outras organizações/equipamentos, garantindo apoio integral aos estudantes, sem sobrecarregar a escola com questões que fogem à sua alçada.
7. Implementar políticas de cuidado: criar espaços de acolhimentos para a comunidade escolar, colocando o bem-estar e a saúde mental do corpo docente e discente no centro do projeto educacional; desenvolver políticas de apoio à saúde mental do corpo docente e dos diretores e criar uma rede de apoio para a comunidade escolar. “A importância do diretor para o funcionamento das escolas ainda não figura no radar das prioridades governamentais. Quando as escolas fecharam, as estratégias de atuação mais efetivas passaram pela aproximação com as famílias e os estudantes. Para tentarmos minimizar o enorme impacto causado pela pandemia, que acirrou as desigualdades, é fundamental melhorar as condições no desenvolvimento das atividades do diretor escolar”, diz Antonio Bara Bresolin, diretor do D3e, instituição parceira na realização.

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