Pesquisa revela dificuldades das empresas ao investir na área social

Por: GIFE| Notícias| 10/02/2003

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

Diversos fatores internos e externos podem prejudicar a atuação social de investidores privados, que ainda estão aprendendo a diferença entre a lógica do terceiro setor e a dos negócios.

Para analisar como funciona o processo de apoio a projetos sociais por parte de grandes empresas, a arquiteta Vanessa Goulart desenvolveu como tese de mestrado na Escola de Negócios da PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro) a pesquisa Projetos sociais: Dificuldades dos Investidores na Decisão de Apoio.

O estudo, realizado com empresários cariocas, revelou os principais aspectos que podem interferir no apoio a um projeto social proposto por uma organização sem fins lucrativos.

“”A princípio, imaginei que encontraria mais problemas externos às empresas do que internos. No entanto, ao longo da pesquisa, percebi que elas aprenderam muitas coisas durante o próprio desenvolvimento dos projetos. Positivo ou não, o que acontece é que algumas acreditam que encontraram sua forma de lidar com a área social, mas se esquecem de olhar para o lado, de pesquisar outras formas de atuação””, explica Vanessa.

Entre os fatores internos, a autora aponta a falta de visão estratégica e de profissionalização da área social nas empresas. Já os fatores externos referem-se à falta de capacitação do proponente, do próprio terceiro setor e, inclusive, da falta de incentivos fiscais atraentes, identificados por alguns entrevistados como uma fonte alternativa de recursos.

Institutos e fundações – Com a falta de visão estratégica e de profissionalização da área social das organizações financiadoras, a criação de diretrizes e a integração dessas com as estratégias corporativas ficam comprometidas.

Vanessa explica que, quando isso ocorre, surgem mais dúvidas na definição dos recursos físicos e financeiros a serem destinados para a área social. Percebe-se, então, uma tendência a se empregar menos pessoas e menos recursos, ou ainda, uma maior vulnerabilidade às situações de crise, já que os investimentos não constituem uma vertente estratégica incorporada ao cerne da empresa.

Uma maneira encontrada para profissionalizar as ações sociais é a criação de institutos ou fundações. Geralmente isso parte da busca por uma melhor estruturação dos projetos, com coordenação centralizada e estratégica, definição de um foco de atuação para maior homogeneidade no controle dos recursos, formação de parcerias e alianças e transparência na gestão.

“”Com o instituto, existe maior sinergia entre os projetos que estão sendo desenvolvidos pelas empresas do grupo, o que proporciona troca de experiências e otimiza alguns custos””, observa Eliane Garcia, coordenadora executiva do Instituto Algar. Criada recentemente, a organização centralizou todas as ações sociais do Grupo Algar, de Uberlândia (MG).

Comunicação – Ao profissionalizar e formalizar o investimento social privado, todo o processo de comunicação entre financiador e proponente também pode se tornar mais claro e organizado, eliminando-se mais um dos entraves apontados na pesquisa.

De um lado, os investidores criticam a elaboração inadequada de algumas propostas. De outro, eles nem sempre fornecem todas as informações sobre suas diretrizes e critérios de seleção.

Elizabeth Leeds, assessora de programas da Fundação Ford, conta que a organização utiliza diversos meios para divulgar suas linhas de atuação, como brochuras e um site na internet.

“”Sendo transparentes, trazemos um público maior. Se estivermos muito abertos em termos de prioridades, as pessoas entendem que podem trabalhar em determinada linha, mesmo sem uma história de trabalho da fundação nessa área””, afirma.

Vanessa conta que a pré-definição dos procedimentos para a solicitação de financiamento também facilita a alocação de recursos. Por outro lado, existe o risco de se incorrer em uma excessiva burocratização.

Para o presidente do Instituto Holcim, Francisco Milani, ter um modelo de projeto tem prós e contras. “”O pró é que as propostas chegam dentro de um mesmo padrão de informação, o que torna possível comparações entre projetos no momento da avaliação. O contra é que, provavelmente, deixamos de receber bons projetos porque algumas organizações não querem enviar seus dados dentro da estrutura solicitada.””

Lis Hirano, junior program associate da Fundação Kellogg, aponta outro problema na criação de modelos de apresentação de projetos: eles podem moldar a proposta muito mais pela necessidade do investidor do que pela demanda da sociedade. “”O proponente deve ser totalmente livre para se apresentar da maneira que ele acredita que seja mais original ou legítima para o que se quer propor. Quando se percebe que a instituição tem potencial, mas não apresentou uma proposta congruente com a visão da Fundação, três coisas podem ser feitas: reenviar o material com a programação, conversar por telefone com o representante da entidade ou, eventualmente, visitar o local.””

Falta de foco – A pulverização dos investimentos e a falta de critérios bem definidos para seleção dos projetos também são apontados pela pesquisa como problemas na decisão pelo apoio.

Para Rosaly Todeschi, diretora de ação comunitária da Fundação Acesita, se os recursos estiverem bem definidos e existir um plano de desenvolvimento, não há perda de foco. “”Procuramos a melhor maneira de atender diversas entidades, de diversas áreas. E isso acontece principalmente porque não inventamos projetos, mas damos suporte aos serviços já existentes. A atuação em parceria com a comunidade, com o setor público e com outras empresas permite otimizar os recursos””, explica Rosaly.

Quanto à definição de critérios para a seleção dos projetos, Elizabeth Kfuri, superintendente da Fundação Otacílio Coser, acredita que o melhor é congregar valores objetivos, como qualidade do projeto, e subjetivos, como indicação ou sensibilização por determinado público. “”Ambos são critérios de avaliação e aprovação de projetos, cada um com seu peso específico. O que é preciso é conjugar foco e qualidade com parceiros sensíveis às mesmas causas que apoiamos, com capacidade técnica comprovada””, afirma Elizabeth.

Incentivos fiscais – A relação causa-conseqüência entre incentivos fiscais e investimento social privado é um dos pontos polêmicos do estudo.

O diretor executivo do Instituto Telemig Celular, Francisco Azevedo, não trata a questão como certa ou errada. Para ele, o incentivo do governo deve ser ampliado, mas sempre exigindo uma contra-partida das empresas. “”A verdade é que, se o governo criar incentivos, certamente o volume do investimento social privado aumentará. Os incentivos para as empresas investirem na área social são insignificantes se considerarmos o tamanho dos problemas sociais que temos neste país””, diz Azevedo.

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