Podemos nos sair melhor se acontecer outra vez?

Por: GIFE| Notícias| 28/03/2006

Caroline Hartnell
Editora da Alliance

Existe uma definição que diz que catástrofe é um evento que “”supera a capacidade da comunidade agüentar usando seus próprios recursos””. A Ásia tem 52% da população da Terra, mas tem 87% das mortes causadas por catástrofes, particularmente devido a níveis de proteção insuficientes.

Um ano depois do tsunami asiático, uma das catástrofes naturais de maior custo, mesmo em termos de perda de vidas, umas das principais perguntas que se coloca para os participantes da conferência do APPC/CAF, A Filantropia em Catástrofes: Tsunami e Depois, foi, como disse o presidente do conselho do APPC, Iftekhar Zaman: “”Podemos aprender com essa catástrofe para que possamos nos sair melhor de uma outra vez?””

Estima-se que serão necessários US$14 bilhões para a reconstrução após o tsunami. Da quantia, cerca de US$11 bilhões foram obtidos por meio de doações privadas (pessoas, empresas, fundações, ONGs). O gasto real do dinheiro é uma grande questão, com estimativas da quantia gasta em 2005 entre US$529 milhões e 35% dos fundos angariados.

Erna Witeloar, Embaixadora Especial da ONU para as Metas de Desenvolvimento do Milênio, apontou que a catástrofe não afetará muito a situação macroeconômica da região: é no nível micro, entre os mais pobres, que os efeitos serão mais sentidos. Por isso, as metas de desenvolvimento podem não ser atingidas em alguns países.

No evento, Linetta Gilbert, da Fundação Ford, levantou o mesmo ponto em relação ao furacão Katrina: os mais afetados foram os mais pobres. Ela disse que raça, pobreza e classe são centrais nas catástrofes.

Que lições aprendemos?

Algumas das lições mais claras parecem óbvias: a importância de se trabalhar com as comunidades locais; certificando-se de que a ajuda seja apropriada – “”muitos cobertores em toda parte, mas nenhum sarong para usar””. Foi sugerido que os funcionários das ONGs fossem treinados em sensibilidade social antes de chegarem.

Muitos palestrantes da conferência do APPC/CAF enfatizaram que os esforços de socorro formam dificultados por falta de coordenação. Um palestrante comentou que muitas agências estavam envolvidas porque tinham coletado dinheiro, mas não tinham nenhuma experiência em assistência em catástrofes.

Nesse sentido, teria sido melhor se elas tivessem trabalhado junto com as agências experientes, embora uma boa coordenação tivesse, sem dúvida, melhorado o desempenho, mesmo das organizações menos amadoras. Foi apontado também que algumas ONGS não coordenaram os esforços simplesmente porque tinham bastante dinheiro e não precisavam fazê-lo.

A conferência produziu também exemplos de novas alianças. Uma veio de Okty Damayanti da Unilever Indonesia. Formada apenas um mês antes do tsunami, em 26 de novembro de 2004, em resposta a um terremoto em Papua, Indonésia Peduli é uma parceria informal de empresas, ONGs e agências governamentais.

O número de membros aumentou de sete para mais de 100 após o tsunami. A experiência deles é que a colaboração pode trazer benefícios muito além do objetivo tangível, incluindo uma imagem melhor da empresa, dedicação dos funcionários e compreensão de outros setores. A necessidade mais premente agora é um processo de tomada de decisões mais eficiente. A Ashoka também está formando uma rede de resposta a desastres na Índia.

Prestação de contas

A questão da prestação de contas naturalmente surgiu. A falta de prestação de contas é vista como um sério obstáculo à doação em toda a região. “”Foi coletado dinheiro, mas ninguém sabe como ele é gasto””, disse Josie Fernandez, da ONG Philanthropy Malaysia.. Muitos doadores novos responderam ao apelo do tsunami, mas a sensação é de que eles podem ser perdidos se as “”suas expectativas muito altas”” não puderem ser atendidas.

Mas, prestar contas de quê? Trata-se apenas de uma questão de administração financeira? “”Existe sempre uma grande preocupação com os custos administrativos das ONGs, mas e a questão da eficiência nos gastos?””, perguntou Paula Johnson, da Philanthropic Initiative, EUA. Existem também questões importantes sobre como prestar contas do dinheiro não gasto, até a gora a maior parte do dinheiro do tsunami.

Recuperação e desenvolvimento a longo prazo

Como a ajuda a longo prazo obtida por causa do apelo do tsunami pode ser coordenada com os programas de desenvolvimento de longo prazo? Essa foi a questão levantada por muitos participantes da conferência. O tsunami afetou os mais pobres e um retorno à situação anterior ao tsunami não basta. Existe também o perigo de que o processo de reconstrução crie divisões dentro das comunidades se, por exemplo, se novas casas forem dadas às vítimas do tsunami e não aos outros pobres.

Uma sessão de discussão interessante foi se as fundações comunitárias podiam ser uma maneira de distribuir dinheiro a longo prazo. Uma catástrofe pode gerar condições favoráveis para a criação de uma fundação comunitária, disse Shannon St John, da Triangle Community Foundation, dos Estados Unidos.

Com o espírito comunitário galvanizado, novo líderes comunitários surgindo e recursos externos entrando, uma fundação comunitária pode fornecer controle e tomada de decisões locais. Na verdade, uma fundação comunitária está sendo criada em Phuket. Mas, ela advertiu, a iniciativa deve emergir da comunidade e o financiamento externo deve ser estruturado de forma a exigir uma contribuição local cada vez maior.

Outros sugeriram que seria mais fácil uma fundação comunitária já estabelecida assumir essa função. Se as fundações comunitárias devem ser um repositório do capital social da comunidade, como elas podem assumir o papel do dia para a noite, apenas porque existem fundos disponíveis? Depois do Katrina, disse Linetta Gilbert, as fundações comunitárias têm, sim, o potencial de atuar como intermediárias e de se certificarem de que os grupos excluídos sejam envolvidos na tomada de decisão à medida que as comunidades forem reconstruídas.

Mas, Greg Berzonsky, da United Way International advertiu, mesmo as organizações comunitárias estabelecidas podem não conhecer toda a comunidade. O Katrina mostrou que praticamente os grupos únicos que realmente conhecem as suas comunidades são os grupos baseados na fé.

Finalmente, Barnett Baron, da Asia Foundation, lembrou de que cada país tem as suas próprias tradições filantrópicas e organizações comunitárias tradicionais. “”Não precisamos criar comunidades””, disse ele, “”elas já existem. Precisamos examinar os mecanismos tradicionais de superação de problemas e ver como podemos fortalecê-los para o caso de futuras catástrofes.””

Foi sugerido na sessão final que o APPC investisse em pesquisar a filantropia comunitária tradicional em toda a região.

O papel da filantropia

Uma pena é que a conferência não tenha se concentrado mais no papel da filantropia. A maior parte da discussão sobre sistemas de preparação para catástrofes tinha uma relevância mais óbvia para os que de fato prestam socorro e preparam para catástrofes do que para o mundo da filantropia.

Uma questão que a conferência poderia ter analisado é o papel de organizações como a CAF India, que não é uma organização de socorro, mas que foi forçada a responder porque as empresas que são suas clientes queriam ajudar. Como elas trabalham com eficiência em uma área que não conhecem bem? A conferência poderia também ter analisado os desafios que esperam os novos fundos estabelecidos em resposta à catástrofe, como o Bitsunami na Índia e o Force of Nature Fund na Malásia.

Vale a pena mencionar um comentário final de Barnett Baron. O assunto da conferência era “”tsunami e depois””, mas pode não haver outro tsunami por 400 anos. A gripe aviária pode ser a próxima catástrofe e até agora não houve envolvimento da sociedade civil nisto. As organizações filantrópicas devem assumir um papel mais forte para forçar o governo a assumir as suas responsabilidades, ele sugeriu – pela gripe aviária, pelo aquecimento global, pelo que quer que possa estar aguardando na próxima esquina.

Para obter um relatório completo das diversas apresentações da conferência, visite o site da APPC: www.asianphilanthropy.org

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