Polêmica marca aprovação da CPI das ONGs
Por: GIFE| Notícias| 26/03/2007Rodrigo Zavala
Os partidos de oposição ao governo no Senado conseguiram instalar, no último dia 15, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os repasses de dinheiro público feitos para organizações não-governamentais. Conhecida como CPI das ONGs, a comissão tem sido questionada por uma série de organizações sociais, pois, segundo elas, pode levar a uma criminalização generalista das entidades.
O senador Heráclito Fortes (PFL-PI), que protocolou o pedido na Mesa Diretora, defende a CPI porque vê nela um instrumento rápido para apurar “”irregularidades que têm sido apontadas pela imprensa e pelo TCU (Tribunal de Contas da União)””, e para propor novas normas ao setor. “”A situação hoje é de total descontrole em todo o processo, da escolha das entidades, à prestação de contas, passando pela execução dos projetos””, critica.
As discussões sobre a criação da comissão começaram no final do ano passado, quando a ONG Contas Abertas fez uma denúncia ao jornal Folha de S.Paulo. Na reportagem, veiculada no dia 17 de setembro, a organização apontava que a ONG UniTrabalho – que tinha como colaborador o ex-petista Jorge Lorenzetti – teria recebido mais de R$ 18 milhões da União desde o início do governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Na época, também pretendia-se incluir nas investigações a denúncia de que a Petrobras teria repassado pelo menos R$ 31 milhões para ONGs ligadas ao PT. “”A idéia não é promover nenhuma caça às bruxas, mas fazer um trabalho que ajude a preservar as entidades que têm prestado relevantes serviços ao País, das que apenas se aproveitam do dinheiro público””, explica o senador.
Críticas – A Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong), no entanto, questiona a criação da CPI. Em nota divulgada ao redeGIFE, a Abong levanta alguns pontos. O primeiro refere-se “”ao estranho recorte de tempo abordado pela CPI, a qual propõe investigar convênios do governo federal com ONGs apenas a partir de 2003″”. Segundo o Tribunal de Contas da União, as irregularidades no repasse começaram em 1999, ainda no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), quando o PFL era partido governista, hoje oposição.
O documento também cita “”a criminalização das entidades, uma vez que se propõe a tratar em uma CPI questões relativas a irregularidades, para as quais o TCU tem instrumentos cabíveis de ajuste e que não necessariamente relacionam-se à má fé no trato do dinheiro público””. Nesse sentido, acusa a CPI de ser generalista, pois as irregularidades foram apontadas em 28 convênios realizados entre o governo e 10 ONGs, distante do universo de quase 300 mil existentes no país.
Para o secretário geral do GIFE, Fernando Rossetti, esses casos não devem ser encarados como regra, já que não refletem o diverso trabalho realizado pelas organizações sociais. “”O corruptor nesse caso é o Estado, que criou canais para que isso ocorresse””, critica.
O Estado, na visão de Rossetti, deve criar regras e acordos de como prestar contas de maneira mais transparente possível, porém, sem dificultar o trabalho das organizações sociais. “”Quando o Estado se mete a controlar, ele burocratiza o sistema. Isso poderia trazer conseqüências para o trabalho de pequenas entidades, que se tornariam inviáveis sem um amplo respaldo jurídico””, afirmou.
Soluções – Uma das formas de sanar o problema é levantada pelo advogado, especialista em legislação do terceiro setor, Eduardo Szazi, que defende a criação de um cadastro compulsório e nacional de ONGs que recebem recursos públicos. “”O objetivo é tornar transparentes as informações. Hoje, apenas as Oscips (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público) estão obrigadas a publicarem suas movimentações financeiras””, afirmou Szazi.
O Estado de S. Paulo deu o primeiro passo no tema. No dia 08 de dezembro de 2006, frente à avalanche de denúncias, o então governador Cláudio Lembo (PFL) assinou um decreto que regulamenta a atividade de ONGs e Oscips que atuam junto ao Estado.
O documento obriga as organizações a encaminhar, todos os meses, documentos que comprovem a aplicação dos recursos recebidos do Estado à Secretaria da Fazenda, além de submeter as entidades à fiscalização do governo.
Lembo disse, na época, que as auditorias nas instituições já eram feitas, mas ressaltou que essas fiscalizações devem mudar. “”Agora, nós vamos fazer auditoria e aqueles que a gente sentir qualquer problema de ordem administrativa ou financeira, a gente susta o pagamento, porque o pagamento agora é centralizado””, disse ele, em evento realizado na Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) no dia 07 de dezembro.
Se as ONGs ou Oscips não cumprirem o estabelecido no decreto, estarão sujeitas à suspensão de recursos do Estado.
Próximos passos – A CPI das ONGs já foi aprovada, mas não instalada. Faltam cumprir algumas etapas, o que deve ocorrer até a próxima semana. Em primeiro lugar, os líderes dos partidos têm que indicar os seus representantes de acordo com a seguinte proporcionalidade: PMDB – 3, PFL- 2, PSDB – 2, PT – 1, PTB – 1, PDT – 1, PR – 1. São onze titulares e sete suplentes, assim divididos: PMDB – 2, PFL – 1, PSDB – 1, PT – 1, outros partidos – 2.
“”Minha idéia é a de que ela fuja dos depoimentos longuíssimos e dos holofotes da mídia. Além, é claro, da simples disputa ideológica ou político-partidária. A CPI tem poderes para requisitar documentos, cruzar informações, produzir provas. E depois, claro, apresentar um conjunto de propostas. O importante, agora, é que haja uma mobilização não apenas para tirá-las do papel, mas para modernizarmos a legislação, evitando os grandes ralos que hoje existem e separando o joio do trigo””, defende senador Heráclito Fortes.