População considera mecanismos de influência a políticas públicas chatos e ineficientes
Por: GIFE| Notícias| 17/12/2003MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE
A pesquisa Controle Social foi encomendada ao Ibope pelo Observatório da Educação e da Juventude, programa da Ação Educativa patrocinado pela Petrobras. Lançado no final de novembro, o levantamento teve como principal objetivo identificar como os brasileiros estão participando da elaboração, do monitoramento e da avaliação de políticas públicas, especialmente na área educacional.
Em entrevista ao redeGIFE, Camilla Croso, coordenadora geral do Observatório, fala sobre os principais resultados do levantamento, os mecanismos de influência nas políticas públicas e o desafio de buscar formas de tornar essas práticas mais interessantes.
redeGIFE – Como surgiu a idéia da pesquisa e qual foi o universo abrangido?
Camilla Croso – O Observatório da Educação e da Juventude avaliou ser estratégico ter uma fotografia do momento atual no que se refere à percepção de poder da população, bem como ao seu conhecimento dos diferentes meios e espaços de influência de políticas e sua motivação ou desmotivação em participar de tais espaços. Os resultados da pesquisa dão pistas importantes sobre caminhos que o Observatório pode trilhar para cumprir seu objetivo de ampliar e qualificar o controle social das políticas públicas por parte da sociedade civil. A pesquisa ouviu duas mil pessoas de 16 anos ou mais, das diferentes regiões do país.
redeGIFE – A maioria dos entrevistados (56%) manifestou que não deseja participar das práticas capazes de influenciar políticas públicas. A que podemos atribuir isso? O que deve ser feito para inverter este quadro?
Camilla – Dentre aqueles que manifestaram não desejar participar das práticas que influenciam políticas, o principal motivo foi falta de informação (35%), seguido de falta de tempo (26%) e considerar as práticas chatas (21%). Apenas 9% não quer participar por não considerar isso importante. Esse resultado é interessante no sentido de demonstrar que há um contingente significativo de pessoas que participaria se tivesse maior acesso a informações, algo possível de ser melhorado pelo esforço conjunto de diversos atores sociais. O mesmo vale com relação às práticas serem consideradas chatas, ou seja, o desafio de buscar formas de tornar essas práticas mais interessantes é algo que pode ser abraçado por diferentes atores sociais. Vale ressaltar que os que se sentem desmotivados a participar por falta de informação são principalmente os mais jovens – faixa de 16 a 24 anos-, pessoas com menor grau de instrução e moradores das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
redeGIFE – Quais outros resultados podem ser destacados?
Camilla – Destacamos que 84% dos entrevistados vêem a educação como um direito de todos os cidadãos, e não como um serviço prestado à população (3%) ou como uma boa ação, feita por quem tem boa vontade (11%). Esse resultado indica que a noção de educação como direito é apropriada pela população, sendo esse um importante ponto de partida para o controle social das políticas decorrentes da implementação desse direito. No entanto, chama a atenção que 1/4 da população sequer soube opinar a respeito de seu exercício de poder quando foi citado o artigo 1º da Constituição, o qual afirma que todo poder emana do povo, e questionado se o entrevistado considerava que exercia tal poder. Isso mostra que a questão do poder ainda está muito distante do cotidiano dessas pessoas. Dos 44% que acham que exercem poder, a maioria acredita que o faz elegendo representantes, 26% pela sua participação direta e apenas 6% por ambas as formas. Assim, a pesquisa constata que há ainda um longo caminho a trilhar até que o país alcance o exercício de uma cidadania mais ativa. Há ainda um resultado a destacar: os jovens são os mais interessados em participar de práticas que influenciam as políticas públicas. Isso contesta a percepção de desinteresse dos jovens por política e a percepção do jovem como foco de problema.
redeGIFE – Algum dos resultados surpreendeu?
Camilla – Nos surpreendeu positivamente 84% da população considerar educação um direito, ao invés de serviço ou boa ação. Imaginávamos que a percepção de serviço seria bem maior e que a concepção de educação como direito fosse mais esvaziada. Para todos aqueles que lutam pela educação pública de qualidade, esse resultado é muito promissor. Por outro lado, nos surpreendeu também que, ao ser questionada sobre o desejo de participar de mecanismos de influência de políticas, a maioria da população (56%) manifestou não querer participar. Esperávamos que, ainda que a participação nos diferentes mecanismos capazes de influenciar políticas fosse baixa, a vontade de participar fosse maior.
redeGIFE – Quais são os mecanismos que a população pode utilizar hoje para buscar influenciar as políticas públicas?
Camilla – Os Conselhos são instâncias estabelecidas na Constituição que permitem um maior envolvimento de representantes da sociedade civil no rumo das políticas públicas, sendo que eles podem ter um caráter mais consultivo ou mais deliberativo. Em geral, eles são paritários, ou seja, há presença de representantes de governo e da sociedade. A população também pode influenciar participando de audiências públicas no Legislativo, inclusive acompanhando a elaboração da Lei Orçamentária Anual (LOA) e a execução da mesma. Também é possível encaminhar pedidos de ações junto ao Ministério Público ou, ainda, ter uma atuação mais direta participando de mobilizações e atos públicos, por exemplo. Estes são apenas alguns mecanismos.
redeGIFE – A sociedade tem utilizado esses mecanismos como poderia?
Camilla – A pesquisa de opinião mostra que o grau de conhecimento dos diferentes mecanismos citados é baixo, variando de 46% (conselhos) a 31% (orçamento participativo). Além disso, dos que conhecem os diferentes mecanismos, a taxa dos que efetivamente participam é ainda menor. No entanto, é interessante que, quando perguntamos aos que participam de conselhos se consideram que influenciam o rumo das decisões, 80% acredita que suas ações influenciaram de alguma forma o conselho. Ou seja, a percepção dos que participam é que sua ação é eficaz.
redeGIFE – E quais os motivos que levam as pessoas a participarem?
Camilla – Aos que afirmam participar, perguntamos se a motivação estava mais ligada ao desejo de beneficiar a comunidade como um todo ou a alguma situação mais de âmbito privado. O resultado aponta que a maioria (68%) tem como motivação melhorar a situação da comunidade de uma maneira geral, o que sugere que prevalece, dentre os que participam, uma noção de bem comum.
redeGIFE – Qual é a visão dos entrevistados sobre a eficácia dos mecanismos?
Camilla – Das opções listadas acima, o Conselho de Educação é considerado o mecanismo mais eficaz por um maior número de pessoas (35%), muito à frente dos demais, que foram citados na seguinte seqüência: mobilização de massa (10%), movimentos sociais (9%), orçamento participativo (9%), audiências públicas (7%) e, por último, encaminhamento de ações ao Ministério Público (4%). Vale ressaltar que um contingente de quase 1/3 dos entrevistados (29%) preferiu dizer que nenhum desses mecanismos é eficiente, demonstrando que há uma considerável percepção de falta de alternativas para uma efetiva influência de políticas.