Primeira infância: prioridade absoluta às crianças ainda é desafio no país

Por: Fundação FEAC| Notícias| 01/08/2022

Há 63 anos, em 1959, com a Declaração Universal dos Direitos das Crianças, as Nações Unidas conclamaram todos os países a respeitarem as necessidades básicas das crianças, o que inclui o direito à brincadeira, à educação, a um ambiente favorável e a cuidados de saúde.

Um novo avanço nas políticas protetivas para a infância viria com a Convenção sobre os Direitos da Criança, que tornou crianças e adolescentes sujeitos de direitos, e foi adotada pela Assembleia Geral da ONU em 20 de novembro de 1989 e ratificada por 196 países.

No Brasil, este novo olhar para a infância foi consolidado em 1990, com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), principal marco normativo desta mudança, que assegurou, com absoluta prioridade, “o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.

Hoje, três décadas após a promulgação do ECA, temos uma legislação que é referência internacional em proteção integral da infância, mas muito do que ela preconiza ainda não saiu do papel. A rede de proteção construída para assegurar que estes direitos sejam cumpridos, formada por diversos setores do poder público, por organizações da sociedade civil, entidades e instituições dedicadas ao tema, segue trabalhando em diversas frentes pela sua implementação.

Priorizar infância é uma decisão política

“A criança na primeira infância e o conhecimento sobre o desenvolvimento infantil têm de ser tema de estudo e debate permanente nas áreas de saúde, educação, assistência social e cultura de uma cidade. Estes setores precisam conversar. A intersetorialidade é fundamental para entender e tratar a criança como sujeito integral. Mas ela não pode estar diluída nas diversas pastas, tem de haver centralidade”, ensina o educador Vital Didonet, especialista em políticas para primeira infância e membro da Rede Nacional Primeira Infância.

Para Vital Didonet, que participou da formulação do artigo 227 e hoje presta consultoria a diversos organismos internacionais e nacionais sobre o assunto, um fator determinante para que a criança alcance o lugar prioritário que lhe pertence é o político. “É preciso haver decisão política em dar importância ao tema. Essa escolha transforma o panorama de um município. E para isso o gestor precisa imantar toda a administração municipal com essa causa”, afirma.

Lugar de criança é no orçamento

Além de estudos científicos mostrando que a primeira infância abrange os anos de desenvolvimento cruciais da formação da pessoa humana, cálculos econômicos também vieram comprovar a tese de que investir maciçamente nesta fase gera múltiplos avanços socioeconômicos a uma comunidade. O economista norte-americano James Heckman, Nobel de Economia em 2000, ganhou notoriedade ao apresentar trabalho apontando que a cada US$ 1 investido na primeira infância, o retorno é de US$ 10.

Uma pesquisa que analisou registros da população de 0 a 30 anos de duas comunidades diferentes e seus respectivos investimentos públicos em educação, saúde, assistência social, cultura trouxe evidências empíricas do impacto positivo sobre o desenvolvimento humano, em especial, sob a perspectiva de ruptura com o ciclo intergeracional da pobreza.

“Heckman fez uma fórmula de cálculo e comprovou que o que se gastou com as crianças naqueles poucos anos de vida, no começo da existência, foi o melhor investimento que aquela comunidade poderia ter feito”, diz Didonet, salientando que, para isso, no entanto, é preciso garantir que os recursos destinados à infância estejam previstos no orçamento.

Rede de proteção integral

Sintonizada nestes mesmos princípios da proteção integral, a prefeitura de Campinas criou em 2019 o Comitê Intersetorial do Plano de Primeira Infância Campineira, coordenado por Thiago Ferrari. “O PIC foi criado para fomentar esta cultura de proteção integral à primeira infância na sociedade como um todo. É a aplicação prática deste conceito e funciona como uma política intersetorial ligada ao gabinete da prefeitura de Campinas”, explica Thiago Ferrari.

O PIC parte do esforço integrado de diversos setores da sociedade e foi um caminho pensado para avançar na implementação das garantias constitucionais da infância. A Fundação FEAC, através do Programa Primeira Infância em Foco (PIF), integra o comitê “para apoiar a realização de projetos multissetoriais que visam efetivamente garantir melhores condições de vida e desenvolvimento para a primeira infância no município”, explica Stelle Daphine Goso, analista de projetos do PIF, da Fundação FEAC.

“As ações realizadas de modo multissetorial e integrado são imprescindíveis para alcançar a implementação efetiva dos direitos da criança”, reforça Stelle, apontando que atualmente há dois projetos sendo trabalhados que possuem como foco fortalecer a função protetiva das famílias.

“As pessoas falam que a criança é o futuro. Eu gosto de dizer que criança é o presente. Investir na qualidade de vida das crianças traz retorno imediato à própria criança, sua família e à comunidade. Você cria uma rede de proteção e cuidados. Essa visão é transformadora”, conclui Thiago.

Por Natália Rangel

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