Primeiros dados do Censo acendem alerta para políticas públicas e investimento social privado
Por: GIFE| Notícias| 24/07/2023Após sofrer restrições orçamentárias, o Censo 2020 está acontecendo apenas em 2022.
Os dados demográficos mais importantes do Brasil começaram a ser divulgados. Entre os destaques, a população é menor do que a projetada, com 203,1 milhões de habitantes; o ritmo de crescimento diminuiu; as famílias estão menores; e o ranking das cidades e estados mais populosos do país mudou. As informações ainda são preliminares.
O Censo IBGE deveria ter sido realizado em 2020, mas foi adiado devido à pandemia de Covid-19, e no ano seguinte devido a cortes orçamentários da última gestão federal.
Apagão de dados
A última vez que tivemos dados atualizados sobre a população brasileira e a base territorial foi em 2010. “Esses dados foram base na implementação de ações afirmativas em todo o território nacional”, afirma o geógrafo e pesquisador e coordenador científico da Associação de Pesquisa Iyaleta, Diosmar Filho. Ele explica que houve um retrocesso no Censo 2020 devido a fatores como o impeachment de 2016; a aprovação da PEC 55/2016 no governo seguinte, limitando os gastos públicos por 10 anos; além da pandemia.
“O planejamento foi fortemente impactado e nos colocou diante de um atraso censitário não visto nos últimos 40 anos. O novo Censo, além de reduzido no questionário, traz uma realidade de 12 anos e não 10, como é regulamentada a metodologia no país.”
Cenário também observado pela socióloga-demográfica Raquel Alonso. “Planejar com base em dados de mais de uma década é muito complicado. Sempre haverá as estimativas populacionais, mas elas ficam cada vez menos precisas”. Para ela, o IBGE tem o maior potencial para revelar os que estão invisibilizados. Por isso, “é preciso tratar a instituição como instrumento estratégico de Estado que não deve estar suscetível a inflexões em nível de governo.”
Flávia Constant, diretora de Investimento Social na Vale e conselheira do GIFE, completa o diagnóstico chamando atenção para os efeitos diretos da ausência desses dados na alocação de recursos entre os entes federativos. A diretora lembra ainda da importância desses resultados para a tomada de decisões na aplicação dos investimentos sociais, sejam eles da iniciativa privada ou de qualquer nível de governo. Principalmente em territórios empobrecidos e invisibilizados historicamente, como favelas e comunidades ribeirinhas. “Nesses territórios, um retrato geográfico e estatístico constitui um insumo para a mobilização de lideranças para qualificarem suas reivindicações junto ao poder público ou mesmo à iniciativa privada.”
Políticas públicas e investimento privado
Além do retrato populacional e territorial do país, o novo Censo também aponta para os desafios da década no planejamento público e privado. Diosmar Filho aponta alguns, como o aprofundamento das desigualdades para pessoas negras e mulheres nas regiões Norte e Nordeste. Além disso, apesar do Nordeste despontar como grande matriz energética renovável, o pesquisador considera que os dados de acesso a saneamento representam o grande desafio para todos os estados das regiões.
Para o setor privado, o geógrafo destaca a importância dos dados censitários para projetar investimentos nos setores do varejo e em matrizes de transformações na indústria. Além das questões climáticas. “Estamos vivendo de asfalto e petróleo, o que nos coloca no desafio de produzir carros, ônibus e caminhões, uma contradição diante do país que sediará a COP30. Isso deveria ser uma grande preocupação dos empresários nacionais.”
Para Raquel Alonso, no investimento social privado a expectativa pelos microdados do Censo segue enorme. “Há um notório interesse em identificar a movimentação de características demográficas e socioeconômicas dentro dos municípios para investir em pontos específicos considerados críticos.”
Flávia Constant concorda. Na Vale, a maior expectativa está voltada para as taxas de escolarização, saldos migratórios, Índice de Desenvolvimento Humano e Municipal, e dados sobre desigualdade, para assim priorizar investimentos em territórios mais vulnerabilizados.
“Saberemos de forma mais clara o tamanho da exclusão escolar em cada município, será mais fácil identificar as principais questões enfrentadas por cada UBS e CRAS. Nossos projetos poderão auxiliar as secretarias municipais na articulação intersetorial e no endereçamento das questões mais críticas indicadas pelo Censo.”