Projeto oferece formação em justiça restaurativa para OSC em Campinas

Por: Fundação FEAC| Notícias| 17/10/2022
Projeto T-Sendo Redes Fundação FEAC

Círculos de diálogo: dinâmica é parte da formação do projeto T-Sendo Redes

É possível uma justiça menos punitiva, mais preventiva e efetivamente reparadora? Este é a proposta da justiça restaurativa, uma abordagem metodológica que busca não apenas resolver conflitos e diminuir violência, mas também apontar, por meio do diálogo, as implicações e danos emocionais que um conflito causa a todos os envolvidos. Em termos mundiais, o modelo data do final dos anos 1970 e foi implantado inicialmente na Nova Zelândia, no Canadá e nos Estados Unidos, inspirado nos costumes de tribos indígenas.

No âmbito do Judiciário, a justiça restaurativa é aplicada no Brasil há 18 anos, principalmente na Vara da Infância e Juventude, e reconhecida e autorizada pelo Conselho Nacional de Justiça. Para além do sistema judiciário, a prática dos princípios e métodos restaurativos foi incorporada em diversos segmentos da sociedade, que trabalham no atendimento à população, como forma de reduzir danos, promover harmonia e fortalecer vínculos comunitários.

Empatia, responsabilização e escuta

Com esse objetivo nasceu o projeto T-Sendo Redes, parceria do Centro Educacional Integrado Padre Santi Capriotti – CEI com o Programa Enfrentamento a Violências, da Fundação FEAC. Ele foi desenvolvido ao longo de um ano em parceria com cinco organizações da sociedade civil (OSC), que atuam em cinco regiões diferentes de Campinas. O  T-Sendo Redes beneficiou lideranças comunitárias e profissionais dos serviços de média complexidade do município, oferecendo nove cursos de formação, mentoria, supervisão e formação ampliada, com palestras, lives e grupos de estudo.

A ideia é que esses profissionais capacitados possam aplicar a justiça restaurativa para administrar ou prevenir conflitos em suas comunidades. “O projeto tem um papel importante na promoção de uma cultura de respeito, empatia, tolerância e paz, criando polos irradiadores dessa metodologia e novas abordagens e soluções para o enfrentamento das violências”, afirma Natália Valente, líder do programa.

A proposta parte de conceitos simples, mas muito potentes quando trabalhados coletivamente. Suas intervenções propõem escuta, relações respeitosas, de alteridade e solidárias, o que favorece o diálogo e a superação dos ilícitos, brigas ou agressões que configuram situações de violência. A meta é restaurar as relações naquela família ou coletividade, e não culpar ou punir o agressor ou a pessoa que causou o dano. 

“A justiça restaurativa quebra o paradigma da punição e propõe um olhar para a responsabilização. Entende que, enquanto sociedade, se um indivíduo comete ato danoso, todos nós, de alguma forma, temos responsabilidade. E precisamos cuidar disso”, afirma o psicólogo Christian Nogueira, coordenador do projeto T-Sendo Redes, lembrando que a justiça restaurativa é complementar à justiça tradicional e não substituta.

Projeto supera metas iniciais

Encontro do grupo do projeto T-Sendo Redes.
Encontro do grupo do projeto T-Sendo Redes

E como se dá esse cuidado? Com técnicas como os Círculos de Fortalecimento de Vínculos e de Construção de Valores, guiados por facilitadores. Essas dinâmicas circulares foram aplicadas na formação para preparar os profissionais para que eles possam conduzir grupos assim junto ao público com o qual trabalham. As OSC participantes do T-Sendo Redes atendem famílias em situação de vulnerabilidade social, população de rua, crianças e adolescentes. Nessas dinâmicas, as pessoas se reúnem em roda e o facilitador conduz o diálogo. Todos têm direito à fala e todos exercitam a escuta.

“A metodologia foi criada para que o diálogo realmente circule e cada participante possa ter seu momento de fala. E isso remete à cultura de povos originários que se sentavam em torno de uma fogueira, por exemplo, para estabelecer um diálogo”, compara Christian. Ele conta que as pessoas chegam distantes, ressabiadas, desconfiadas do que vai acontecer naquele espaço. Mas o clima vai mudando ao longo das dinâmicas e o círculo termina com relatos pungentes. “Só de você respeitar o tempo de fala de alguém, a oportunidade de fala, já significa bastante.”

A realização do projeto superou as expectativas de seus organizadores. A meta de participação nos cursos formativos era de 60 pessoas. Ao todo, houve 161 participantes em 12 meses. E 98 profissionais e lideranças comunitárias atuaram como facilitadores, superando a expectativa inicial de 30. “Trata-se de uma ferramenta muito potente para esse cuidado. Na situação de violência, o vínculo está fragilizado. E a proposta do serviço é fortalecer esse vínculo, restabelecê-lo.”

Toda a jornada dos cursos foi documentada e reunida em um seminário de encerramento que abordou as diversas experiências vividas por cada um dos grupos. O passo a passo do projeto foi reproduzido no recém-disponibilizado Guia Prático de processos circulares: uma experiência do projeto T-Sendo Redes. 

O projeto T-Sendo Redes em números

  • Parceria e articulação com mais 12 organizações para a aplicação de círculos de Justiça Restaurativa
  • 15 círculos de fortalecimento de vínculos desenvolvidos com famílias atendidas pelas OSC parceiras.
  • Participação de 161 pessoas nos processos formativos de justiça restaurativa, superando a meta de 60 pessoas.
  • 98 profissionais e lideranças comunitárias atuando como facilitadores de processos circulares em justiça restaurativa, superando a meta de 30.
  • Realização de um seminário sobre o tema com especialistas discutindo experiências nacionais e internacionais.
  • Produção de guia simplificado com roteiros de círculos de valores, que foi impresso e distribuído aos parceiros.

Por Natália Rangel

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