Projeto Semear prepara jovens de Repúblicas para o mercado de trabalho
Por: Fundação FEAC| Notícias| 29/08/2022O Projeto Semear orienta jovens de Repúblicas a entrarem no mercado de trabalho por meio da oferta de educação e formação profissional.
Nos últimos anos, as empresas passaram a priorizar candidatos com conhecimento prévio, e o mercado de trabalho não tem se mostrado promissor para pessoas que possuem poucos anos de estudo, ou que não completaram o Ensino Médio, e estão em busca do primeiro emprego – até mesmo para o jovem aprendiz.
De acordo com uma pesquisa realizada pela empresa de monitoramento e diagnósticos Kairós Desenvolvimento Social, com base na Relação Anual de Informações Sociais (Rais), o número de jovens aprendizes com Ensino Médio completo contratados dobrou em 10 anos: em 2010 ocupavam 19,5% das vagas, já em 2020 este número subiu para 43%.
O cenário é desafiador para jovens moradores de repúblicas, que possuem defasagem escolar e falta de apoio familiar, e precisam deixar o serviço de acolhimento institucional assim que completam 21 anos.
Diante disso, a Fundação FEAC e o Instituto Padre Haroldo desenvolveram o Projeto Semear, que tem o objetivo de ajudá-los a conquistar seu papel no mundo e qualidade de vida. “É um projeto que está bastante focado na redução de desigualdades, geração de renda e de sensibilização ao mercado de trabalho”, conta Renato Franklin, líder do Programa Acolhimento Afetivo da FEAC.
Uma semente para o futuro
A República Jovem é um serviço de acolhimento institucional destinado a jovens, de 18 a 21 anos, que não tiveram oportunidades de reatarem vínculos familiares ou serem adotados.
Na república, eles trabalham com as questões emocionais, adquirem conhecimentos e elaboram planos para o futuro. Entre eles, o ingresso no mercado de trabalho, que é essencial para que esses jovens tenham autonomia e independência financeira ao se desligarem do serviço.
“[Eles] estão há muito tempo no serviço de acolhimento e é fundamental que eles consigam um emprego e condições de uma vida saudável, pois não vão ter mais nenhuma outra modalidade de acolhimento”, diz Newton César Caetano Monteiro, coordenador das repúblicas administradas pelo Instituto Padre Haroldo.
O objetivo do Projeto Semear é guiá-los nessa nova etapa da vida que estão prestes a entrar por meio da oferta de educação e formação profissional. Vitor Mafra, educador social do projeto, ressalta que o propósito é também possibilitar que os jovens se tornem uma mão de obra qualificada, afastando-os de subempregos.
Para dar início às atividades, eles responderam um questionário para informar quais são as áreas que se identificam e o que buscam. As próximas etapas do projeto consistem na criação de um currículo, cadastro em plataformas de empregabilidade, busca de cursos, simulação de entrevista de emprego e contato com empresas.
Os cursos são executados em instituições de ensino contatadas pelo projeto levando em consideração os interesses dos jovens, metodologia, carga horária e material didático, e englobam diferentes áreas: mecânica, cabeleireiro, barista e enfermagem, por exemplo. Nos próximos meses, os jovens também terão a chance de participar em workshops de áreas como RH, marketing e mídias sociais lecionados por profissionais que atuam nesses mercados.
Vitor aponta que o Projeto Semear vai além do conseguir um emprego: significa um salto qualitativo na vida dos jovens. “O projeto tem uma questão que eu visualizo que é a de empoderamento. Trazer para eles um acompanhamento mais qualitativo e mais próximo para pensar no projeto de vida e na colocação deles no mercado de trabalho.”
O feedback é o que mantém o projeto vivo. Dar voz e escutar os jovens é importante para que sintam que são donos de suas próprias escolhas. “O tempo todo a gente está ali, através de um vínculo afetivo, buscando saber quais são as demandas desses jovens, sempre pensando na autoestima deles”, diz Hellio Augusto Avelar Couto, educador social do projeto.
Trabalhando os aspectos socioemocionais
Até o momento, quatro de dez jovens foram empregados. Mas o trabalho do projeto não termina por aí. É preciso continuar acompanhando cada um deles de perto até a sua saída do serviço de acolhimento institucional.
A falta de vínculo familiar, a defasagem escolar ou baixa escolaridade e a sensível saúde emocional são obstáculos que os levam a desistir dos estudos, do emprego e de outras atividades que se propõem a fazer e que serão positivas para a sua vida.
“Normalmente, as pessoas em situação de vulnerabilidade estão preocupadas com o aqui e o agora. Elas não têm muita possibilidade de pensar em projetos de vida. Quando chegamos com propostas a longo prazo, elas precisam ser trabalhadas porque não é algo fácil de eles entenderem, acreditarem e confiarem. Por isso que criar um vínculo é muito importante, para que eles confiem na gente e que o trabalho faça sentido”, explica Vitor.
Para ajudá-los a enfrentar estas barreiras, o Instituto Padre Haroldo, única entidade responsável em Campinas pelo serviço de acolhimento em república, conta com uma equipe de psicólogos, educadores, assistente social e coordenador.
A equipe realiza tanto atendimentos individuais quanto dinâmicas em grupo para estreitar os laços e trabalhar com assuntos delicados. Neste mês, por exemplo, as jovens da república feminina vão se reunir em um jantar.
Newton Monteiro destaca a importância do trabalho de educadores, como Vitor e Hellio, que apoiam os jovens em momentos de vulnerabilidade para que não abandonem os estudos. “Esses jovens vêm com uma grande defasagem escolar. Então, quando eles são muito questionados no curso ou quando não estão entendendo [o conteúdo], eles tendem a desistir e ficam introspectivos. Então é fundamental a participação dos educadores”, fala.
“O projeto traz o olhar da sensibilização. Sensibilizar esses jovens diante do que eles vão encontrar daqui pra frente. O mercado de trabalho é muito agressivo, concorrido, e você tem que saber lidar com isso. E o projeto está focado em tratar esses aspectos socioemocionais”, diz Renato.
Empresas voltadas à diversidade
A resistência das empresas em contratar jovens de repúblicas também é trabalhada pelo projeto. Newton conta que essa relutância não é novidade. “Você traz essas propostas para as empresas e elas já ficam com o pé atrás, não querendo muito vínculo e pensando na questão produtiva”.
Segundo Renato, uma das estratégias do projeto é buscar empresas que têm um olhar voltado para a diversidade e inclusão. “Quando você olha para esses jovens, você não pode olhar para eles com a mesma régua de criticidade que você olha para um jovem que teve diversas oportunidades que esses jovens não tiveram”, observa.
Algumas empresas de Campinas se mostraram bastante receptivas ao projeto. A Café Aroma, por exemplo, contratou uma jovem que fez o curso de barista e tinha o sonho de trabalhar na área. A empresa também chegou a demonstrar interesse em criar uma parceria com o Instituto Padre Haroldo para oferecer estrutura para outros jovens que têm interesse em atuar no setor.
“O que a gente quer mesmo é que eles tenham muitas oportunidades. Então eu acho que [o projeto] é uma boa porta de entrada para eles colocarem em prática o que gostam”, avalia Hellio.
Por Pietra Bastos