Redução do efeito estufa também depende de mais ações da sociedade civil

Por: GIFE| Notícias| 21/02/2005

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

Um dos principais assuntos da última semana foi a implementação do Protocolo de Quioto, que entrou em vigor na quarta-feira (16/2). A cerimônia oficial aconteceu em Tóquio (Japão), onde o tratado foi firmado exatamente oito anos antes, em 1997. Ratificado por 141 países, o acordo internacional estabelece metas, que variam de país a país, de redução da emissão de gases causadores do efeito estufa até 2012.

Países em desenvolvimento, como Brasil, China e Índia, fazem parte do grupo chamado Anexo 2, que ratificaram o documento mas só participam por meio do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Com ele, nações desenvolvidas podem comprar cotas de redução de emissão das nações em desenvolvimento ou investir em iniciativas de diminuição nesses países.

Com a vigência do protocolo, a advogada ambiental e autora do livro Viabilização Jurídica do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) no Brasil (Editora Peirópolis), Flavia Frangetto, afirma que o setor privado passa a ter um forte respaldo jurídico para implementar projetos de geração de créditos de carbono a partir do MDL, o que deve significar um aumento do número dessas iniciativas. “”Ainda há a necessidade de reforços em termos de investimento financeiro necessário ao êxito desses projetos, mas iniciativas nesse sentido já estão começando.””

É o caso do Banco Real ABN AMRO, que oferece um fundo de investimento para projetos de MDL. Também está em estudo, conta Flávia, o substitutivo do Projeto de Lei n° 3902/2004, que prevê, entre os instrumentos da política nacional de mudanças climáticas, um fundo, a compensação dos tributos, incentivos fiscais, disponibilização de linhas de crédito e financiamento.

Para Fernando Almeida, presidente executivo do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), o governo brasileiro já vem cumprindo suas obrigações com o novo tratado internacional, mas ainda há muito por fazer para que o setor empresarial se envolva efetivamente e de forma ampla com o MDL. “”A questão central está em como potencializar a geração de créditos de carbono. É neste ponto que o governo e a própria sociedade precisam trabalhar para capacitar empreendedores, para que os complexos percursos do MDL sejam melhor conhecidos e os custos transacionais reduzidos””, afirma.

Almeida acredita que o Protocolo de Quioto formaliza uma nova relação entre economia e meio ambiente. “”Um clima estável não precisa ser atingido necessariamente às custas de prejuízos econômicos para todos. Ao contrário, no caso do Brasil, os esforços para estabilização do clima significam uma oportunidade inédita de aumento de competitividade””, afirma. Ele explica que, ao estimular atividades de reflorestamento, o MDL também faz da biodiversidade um bom negócio. “”Quioto coroa a visão do desenvolvimento sustentável, que deve ser entendido como a busca pela sinergia entre as dimensões econômica, ambiental e social.””

Inovação – Este é um dos motivos pelos quais, segundo Flávia Frangetto, o Protocolo de Quioto é considerado o mais promissor dos cerca de 200 acordos sobre o meio ambiente da Organização das Nações Unidas. Ela explica que, ao criar o MDL, que é um instrumento financeiro, o acordo conjuga os três elementos do desenvolvimento sustentável (econômico, social e ecológico). “”Ainda não tinha sido inventada modalidade de instrumento financeiro que compreendesse os países em desenvolvimento no comércio de certificados decorrentes de atividades favoráveis ao meio ambiente””, explica.

O primeiro projeto aprovado no âmbito do MDL é brasileiro. O NovaGerar, da cidade de Nova Iguaçu (RJ), trata da captura e do aproveitamento do gás metano (de alto potencial de aquecimento global) emitido em um aterro sanitário. Entre outros aspectos positivos, no lugar da poluição do ar e da atmosfera, tem-se o uso correto do recurso ambiental, potencializando o gás como matéria-prima para a produção de energia.

Marcio Santilli, do conselho diretor do Instituto Socioambiental (ISA), no entanto, alerta para o fato de que apenas após algum tempo será possível avaliar como as instâncias formais credenciadas pela ONU vão proceder na apreciação de projetos de interesse de governos, empresas ou organizações da sociedade civil. “”Até o momento, tem funcionado um mercado informal de carbono, em que algumas empresas investem em projetos, ainda com razoável grau de risco, e algumas iniciativas de organizações civis têm obtido financiamento. No entanto, o papel mais destacado dessas instituições é no âmbito da pressão política e da formação de opinião pública mundial em relação à gravidade da situação do clima.””

Ele considera o MDL um instrumento com impacto potencialmente diminuto em relação ao agravamento do efeito estufa, até pelo fato das metas de redução acordadas no Protocolo de Quioto serem exígüas frente às que os cientistas consideram necessárias para evitar as conseqüências mais graves da mudança climática. Ainda assim, é importante que as organizações sociais se empenhem. “”A sociedade civil não pode renunciar ao seu papel principal no processo, que é o de pressionar por iniciativas mais profundas dos Estados nacionais, das empresas e dos organismos multilaterais para reduzir emissões e, em particular, pressionar os Estados Unidos, responsáveis por mais de 25% das emissões globais, a fazer a sua parte.””

Sociedade civil – Marcelo Rocha, pesquisador associado do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), conta que as organizações não-governamentais que atuam com a temática ambiental têm sido atores importantes no processo de negociação da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e do Protocolo de Quioto. “”Elas têm participado das Conferências das Partes como ′observadores′, porém influenciando diretamente as negociações diplomáticas. A maior parte dos países leva em consideração as idéias e preocupações das ONGs, em especial o Brasil””, afirma.

Segundo ele, além dos projetos de MDL, essas organizações podem realizar, por exemplo, ações de adaptação aos efeitos das mudanças climáticas que já estão ocorrendo e de educação ambiental. “”Essas ações servem para orientar as negociações internacionais. As mudanças climáticas são um problema que afeta a todos e todos devem buscar soluções.””

O gerente geral de meio ambiente da CSN, Luiz Cláudio Ferreira Castro, lembra que fundações e institutos que possam implementar programas reais de captura de carbono podem propor parcerias com empresas, grupos comunitários e cooperativas de produção. A venda dos créditos gera recursos financeiros, que podem sustentar os projetos e ajudar a financiar o desenvolvimento econômico e social dos países mais pobres. “”Muitos projetos que não seriam economicamente viáveis antes do mercado de carbono podem passar a ter sua viabilidade reconhecida, em face da nova receita oriunda da venda dos créditos””, explica.

Empresas brasileiras que já vinham trabalhando na mudança de sua matriz de energia na economia de recursos e na redução de emissões, diz Castro, já estão estudando a possibilidade de transformarem essas mudanças e melhorias em propostas elegíveis à geração de créditos de carbono negociáveis. Segundo ele, no entanto, a grande contribuição do Brasil sobre a emissão mundial de gás carbônico não está na poluição industrial ou urbana, mas sim na questão do desmatamento da Amazônia, oriundo da falta de educação para a sustentabilidade.

“”Assim, acredito que a maior contribuição que as fundações e institutos brasileiros podem e devem dar à causa ambiental e à própria redução das emissões de carbono está no fomento e na geração de ações e projetos sustentáveis de erradicação da pobreza, atravessados pelo viés da educação ambiental. Projetos que gerem renda sustentável para populações pobres, ao mesmo tempo em que desenvolvam o sentido da conservação e renovação dos recursos naturais e o aprimoramento das condições de saúde pública e saneamento””, afirma Castro.

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