Relação das empresas com as causas sociais é avaliada por consumidores

Por: GIFE| Notícias| 05/04/2004

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

Lançada no último dia 15 de março pelo Instituto Akatu, a pesquisa Descobrindo o Consumidor Consciente: Uma Nova Visão da Realidade Brasileira buscou identificar e caracterizar o consumidor conforme seu grau de adesão ao chamado “”consumo consciente””. Foram listados 13 comportamentos, como o ato de fechar a torneira enquanto escova os dentes, apagar as luzes ao deixar um recinto, separar lixo para reciclagem, pedir nota fiscal e ler o rótulo de um produto antes de comprá-lo.

A partir daí, foram definidos quatro grupos de consumidores: conscientes (que adotam de 11 a 13 dos comportamentos listados), comprometidos (de 8 a 10), iniciantes (de 3 a 7) e indiferentes (de 0 a 2). O presidente do Akatu e conselheiro político-estratégico do GIFE, Hélio Mattar, fala ao redeGIFE sobre a evolução do comportamento das pessoas quando se trata de consumo consciente e o papel das empresas e organizações da sociedade civil na mobilização para o aumento dessa prática.

redeGIFE – Qual foi o público pesquisado e quais os critérios para a sua definição?
Hélio Mattar – Foram entrevistadas mil pessoas em nove regiões metropolitanas (São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Recife, Belo Horizonte, Fortaleza, Salvador, Curitiba, Belém) e duas capitais (Brasília e Goiânia). O critério foi a representatividade da população adulta brasileira: homens e mulheres, pertencentes às classes sociais A, B, C e D, entre 18 e 74 anos de idade e alfabetizados.

redeGIFE – Houve algum resultado que o surpreendeu?
Mattar – Sim, o fato de haver consumidores conscientes em todas as classes sociais e em todos os níveis de escolaridade. É certo que a concentração de pessoas das classes A e B entre os consumidores conscientes é maior do que na população geral. Porém, se analisarmos apenas o universo dos consumidores conscientes, veremos que 52% deles pertencem às classes C e D. Além disso, pensávamos que a consciência no consumo estava diretamente ligada à maior escolaridade. De fato, nesse aspecto há uma concentração de pessoas com nível superior e médio de escolaridade. No entanto, 37% dos consumidores conscientes só têm o ensino fundamental, o que é uma boa notícia.

redeGIFE – 54% dos pesquisados estão no escopo dos iniciantes, enquanto apenas 6% estão no grupo dos conscientes. A que podemos atribuir essa diferença?
Mattar – Quando analisamos quais comportamentos os iniciantes adotam, vemos que estão no grupo que chamamos de comportamentos “”de eficiência””, ou seja, estão ligados ao bom uso de um produto ou serviço, com benefícios diretos ao consumidor. É o caso de fechar a torneira enquanto se escova os dentes, evitar deixar lâmpadas acesas em ambientes desocupados ou não guardar alimentos quentes na geladeira. Não por acaso, esses são temas que aparecem com mais freqüência na imprensa. Falou-se muito de economia durante o racionamento de energia elétrica, há três anos, assim como se fala hoje da falta de água nas represas de São Paulo. Os consumidores conscientes, no entanto, vão muito além disso. Eles adotam também o que chamamos de “”comportamentos de reflexão””, como ler um rótulo atentamente antes da compra, e “”comportamentos de solidariedade””, que não trazem benefícios diretos a quem os pratica, mas a toda a sociedade. Um exemplo é a separação de lixo para reciclagem, algo que não faz diferença para quem separa, mas pode ajudar a manter uma cooperativa de catadores e a diminuir o volume de lixo que vai para os aterros. O consumidor consciente, portanto, pensa não só no seu bem-estar, mas no bem-estar da sociedade e na sustentabilidade do planeta.

redeGIFE – Ao mesmo tempo, 37% ficaram no grupo dos comprometidos, ou seja, que adotam de 60% a 77% – aproximadamente – dos comportamentos listados. Podemos dizer que isso se traduz numa caminhada para o estado de consciência total da população com relação a isso?
Mattar – A porcentagem dos comprometidos foi outra boa notícia da pesquisa. Se quiséssemos olhar os números com pessimismo, poderíamos dizer que 6% de conscientes é uma porcentagem baixa. Porém, quando vemos que o grupo seguinte (que adota entre 8 e 10 comportamentos) é tão grande, temos de ser otimistas. Os conscientes são desbravadores de caminhos, estão de fato apontando as tendências que todos os consumidores vão acabar seguindo. Os comprometidos hoje adotam os comportamentos “”de eficiência”” e “”de reflexão””. A tendência é a de que eles incorporem cada vez mais os comportamentos “”de solidariedade””, passando então a integrar o grupo dos consumidores conscientes.

redeGIFE – Apesar de 93% dos iniciantes concordarem que economizar energia e água é uma boa maneira de preservar o meio ambiente, apenas 73% sempre fecham a torneira enquanto escovam os dentes e 70% desligam os aparelhos eletrônicos enquanto não estão usando. Quais ações podem ou já estão sendo feitas pelas empresas e organizações da sociedade civil para aumentar a conscientização dessas pessoas?
Mattar – Essa diferença entre o discurso e a prática fica bem evidente nos consumidores com menor grau de consciência no consumo. Uma das características do consumidor consciente, que detectamos na pesquisa, é a de que ele não só fala, mas faz. Então, vemos que a população em geral, que tem um perfil parecido com o dos iniciantes, percebe que esses temas são importantes, mas não age na mesma intensidade da percepção. Ou seja, essas pessoas até estão sensibilizadas, mas não mobilizadas. Cabe às empresas e às organizações da sociedade civil trabalharem em ações que possam não só despertar a consciência, mas levar as pessoas à prática do consumo consciente. Acho que um meio de fazer isso é mostrar aquilo que o consumidor consciente já percebeu: que as pequenas ações do cotidiano podem melhorar sua vida, a vida das pessoas que vivem na sua cidade e garantir um futuro melhor para as próximas gerações.

redeGIFE – 94% dos entrevistados consentem que as empresas deveriam se preocupar mais com o meio ambiente e 90% acreditam que elas devem adotar padrões éticos mais elevados, além do que a lei estabelece, ajudando a construir uma sociedade melhor. Isso tem se traduzido nas atitudes de consumo de um modo geral?
Mattar – Sim, mas ainda é uma atitude típica do consumidor consciente. Na pesquisa, 44% dos conscientes responderam ter deixado de comprar um produto de alguma empresa como forma de puni-la por uma atitude com a qual não concordam, enquanto só 18% da população geral fez isso. Como acreditamos que o consumidor consciente é um formador de opinião, ele está estabelecendo comportamentos que deverão ser seguidos pelos outros. De outro lado, 42% dos consumidores conscientes fizeram compras tendo como critério o cuidado com o meio ambiente, e 28% tendo como critério ações sociais das empresas. Assim, as ações das empresas em relação ao meio ambiente ou a padrões éticos serão critérios considerados por um número cada vez maior de consumidores na hora de comprar um produto, seja para punir ou para valorizar uma empresa.

redeGIFE – Quando falamos em critérios de compra, as questões ambientais ainda são as que os consumidores mais levam em consideração, em se comparando com a realização de projetos sociais, por exemplo?
Mattar – Quando se trata de valores e crenças, acho que as duas coisas estão hoje no mesmo patamar. As respostas nos mostram que 72% estariam dispostos a pagar mais pelo produto de uma empresa que realiza projetos em favor do meio ambiente. Mas 71% fariam isso se soubessem que parte do lucro será destinado a obras sociais, e 70% se for uma empresa que combate o trabalho infantil. Portanto, é um “”empate técnico”” entre questões sociais e ambientais. Quando perguntamos às pessoas se de fato levam em conta as ações ambientais ou sociais das empresas ao comprar um produto, a resposta da população em geral foi idêntica nos dois critérios: 83% disseram que não, 14% disseram que sim. A única diferença marcante aparece entre os conscientes: 42% levam em conta critérios ambientais, enquanto 28% levam em conta critérios sociais. Talvez isso possa ser explicado pelo fato de as questões ambientais serem um atributo ligado à responsabilidade social há muito mais tempo do que as questões sociais. Ou até pela própria facilidade do consumidor em reconhecer os produtos ecologicamente corretos, como os que têm embalagens recicláveis.

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