Relatório da UNESCO aponta crise mundial na educação e a importância dos professores para superá-la
Por: GIFE| Notícias| 10/02/2014“Há uma crise mundial de educação. Somente com professores de qualidade teremos uma educação de qualidade”. A fala é de Maria Rebeca Otero, coordenadora do setor de Educação do escritório da UNESCO no Brasil, mas reflete um dos principais destaques apontados pelo novo Relatório de Monitoramento Global de Educação Para Todos – EPT, publicado anualmente pela instituição.
O Relatório, que nesta edição tem como tema “Ensinar e aprender: alcançar a qualidade para todos”, traz uma atualização do progresso do cumprimento das seis Metas de EPT estabelecidas por 164 países no Fórum Mundial de Educação de Dakar, em 2000, e que devem ser cumpridas até 2015. As metas são: 1. Cuidados na primeira infância e educação; 2. Educação primária universal (EPU); 3. Habilidades para jovens e adultos; 4. Alfabetização de adultos; 5. Paridade e igualdade de gênero; e 6. Qualidade da educação.
A publicação destaca que a educação é um direito humano fundamental e é essencial para o exercício de todos os direitos. Mesmo assim, existem ainda cerca de 774 milhões de analfabetos no mundo, e cerca de 57 milhões de crianças ainda se encontram fora da escola primária.
O relatório revela que uma crise mundial na aprendizagem está custando aos governos uma perda de US$ 129 bilhões por ano. Dez por cento do custo mundial em educação primária está sendo desperdiçado na educação de baixa qualidade, que não garante a aprendizagem das crianças. Cerca de 175 milhões de jovens em países de baixa renda – equivalente a cerca de um quarto da juventude mundial – não sabem ler nada ou somente conseguem ler parte de uma sentença. Um terço dessa quantia são mulheres jovens no Sul e Oeste da Ásia.
Conforme as tendências atuais, o Relatório prevê que as mulheres jovens mais pobres dos países em desenvolvimento podem não alcançar a alfabetização universal até 2072, e possivelmente, as meninas das famílias mais pobres na África Subsaariana só conseguirão completar o primeiro nível do ensino secundário no próximo século.
Em contraste, a publicação mostra que garantir a educação igualitária e de qualidade para todos pode gerar um enorme retorno econômico, elevando o produto interno bruto per capita de um país em até 23% em um período de 40 anos.
A situação do Brasil
O Brasil está entre os 53 países que ainda não atingiram grande parte dos Objetivos de Educação para Todos até 2015, apesar de ter apresentado importantes avanços no campo da educação ao longo das duas últimas décadas.
Maria Rebeca Otero destaca que o país apresentou grandes avanços na meta 2, sendo que o acesso ao Ensino Fundamental está quase universalizado. A meta 5, em relação à igualdade de gênero, também não é motivo de preocupação para o Brasil. No entanto, a especialista lembra que é preciso reduzir o abandono da escola pelas meninas, que ficam grávidas ainda muito jovens ou são vítimas de violência de gênero.
O Brasil também avançou na meta 4. A proporção de jovens na idade adequada que se encontra no Ensino Médio é mais que o dobro da existente em 1995, mostrando expressivo avanço no acesso à educação secundária. No entanto, a evasão e abandono escolar continuam altíssimos. “Temos ainda no país muitos problemas no Ensino Fundamental e os jovens não conseguem aprender e desenvolver habilidades básicas de leitura e escrita e matemática, assim como habilidades para a vida, que não permitem que ele permaneça no Ensino Médio. Isso gera um impacto também na educação profissional e de acesso ao ensino superior”, comenta Rebeca.
Já em relação à meta 1, que diz respeito à educação infantil e o cuidado com a primeira infância, há muitos desafios a serem enfrentados. A representante da Unesco destaca que, no Brasil, não há ainda estrutura física suficiente para receber as crianças e também quantidade adequada de professores para atendê-las. Com a obrigatoriedade estabelecida no país de que todas as crianças a partir de quatro anos deverão estar na escola, Receba acredita que será possível avançar.
Na opinião da representante da UNESCO, será preciso um esforço conjunto, com investimento forte do setor privado também, para que a educação no Brasil supere as dificuldades encontradas até agora. “O apoio oferecido para a educação aumentou, mas ainda é muito pouco. É preciso que a contribuição seja direcionada prioritariamente para a educacao básica. Além disso, é possível que a inicitiva privada colabore de forma mais efetiva em questões críticas, como aproveitar o seu conhecimento para apoiar uma boa gestão de recursos, por exemplo”, ressalta.
Recomendações para a mudança
O Relatório da Unesco aponta caminhos para superar a crise na aprendizagem. De acordo com a publicação, para atingir uma educação de qualidade para todos, os governos deverão desenvolver cada vez mais políticas públicas voltadas para os professores. E isso inclui desde a melhoria na formação inicial nas faculdades e universidades, passando por capacitações continuadas em tempo de serviço, além do estabelecimento de um plano de carreira que possa atrair os melhores candidatos para a profissão de ensino, oferecendo-lhes incentivos para que se comprometam a longo prazo com a profissão.
Em um terço dos países analisados pelo Relatório, menos de três quartos dos professores de ensino primário são treinados de acordo com os padrões nacionais de seus países. Na África Ocidental, onde poucas crianças aprendem o básico, metade da força docente do país é formada por professores com contratos temporários, sub-remunerados e com pouca formação educacional formal.
A coordenadora de Educação da UNESCO no Brasil destaca que este será um grande desafio a ser enfrentado também pelo Brasil, devido a situação atual crítica enfrentada pelo país em relação à falta de professores e a baixa qualidade dos profissionais.
“No Brasil, a formação inicial tem que ser muito revista, pois está pautada em conceitos ainda muito antigos. Além disso, os professores precisam ter condições, ou seja, tempo e recursos, para se preparar melhor, estudar, ler e conhecer as novas tecnologias, além de melhores salários. É preciso uma atuação conjunta entre governos, universidades e sociedade civil para revertemos esse quadro. Não vai ser a curto prazo, mas é preciso investir e dar prioridade a estas políticas”, comenta.
Outro ponto de destaque do Relatório é a importância da inserção de novas estratégias nos currículos e a avaliação para promover a inclusão e melhorar a aprendizagem. “As avaliações nacionais são importantes, mas os resultados demoram muito para chegar às escolas. Até lá, o aluno já foi reprovado e não deu tempo para o professor correr atrás do prejuizo. Por isso, é preciso oferecer aos professores mecanismos para que possam avaliar o seu próprio trabalho e a aprendizagem dos alunos imediatamente, a fim de que ofereçam apoio direto aos seus estudantes”, acredita Rebeca.
Por fim, o estudo aponta que os novos objetivos após 2015 devem garantir não somente que todas as crianças estejam na escola, como também que estejam aprendendo o que precisam aprender. Para isso, os objetivos deverão ser claros, com metas mensuráveis e com indicadores que monitorem o progresso dos mais desfavorecidos.
Acesse o relatório completo em inglês (clique aqui) e também uma visão geral sobre os dados em português (clique aqui)