Relatório mostra que as mulheres são as mais atingidas pela pobreza

Por: GIFE| Notícias| 10/03/2003

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

Em meio às comemorações do Dia Internacional da Mulher, surge o debate sobre a relação entre os índices de pobreza e a atual condição feminina no desenvolvimento mundial.

O relatório anual do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA, em inglês), intitulado A situação da população mundial 2002: população, pobreza e oportunidades, revelou que as mulheres são mais atingidas do que os homens. O estudo destaca a importância de reduzir as divergências de gênero na saúde e na educação para promover a diminuição da pobreza e reforçar o crescimento econômico.

De acordo com o documento, é fundamental que ações concretas sejam adotadas para eliminar todas as barreiras à participação das mulheres e ao seu desenvolvimento na sociedade. Em muitos países, elas não têm garantia aos direitos humanos e jurídicos básicos, como acesso à escola, emprego, remuneração equivalente ao homem e participação política.

Em grande parte do mundo, as mulheres trabalham mais horas que os homens e pelo menos metade desse tempo é dedicado a tarefas não-remuneradas, como cuidar dos filhos e dos afazeres domésticos. Porém, esse trabalho geralmente não é incluído no sistema de contas nacionais.

Dados de 31 países mostraram que, nos países em desenvolvimento, as mulheres absorvem 53% da carga total de trabalho, remunerado ou não. No entanto, apenas 25% deste esforço é computado nas contas nacionais.

Nos países desenvolvidos, por exemplo, 67% do tempo total dedicado pelos homens ao trabalho são incluídos no PNB (Produto Nacional Bruto). Para as mulheres, essa proporção é de 33%.

Thaís Corral, coordenadora da Rede de Desenvolvimento Humano (Redeh) e vice-presidente da Women, Environment and Development Organization (WEDO), diz que uma velha reivindicação é que o trabalho doméstico seja reconhecido no cálculo da produção nacional. Ela aponta a necessidade de se definir políticas públicas diferenciadas, tendo em vista a relação de gênero.

“”Políticas de combate à pobreza que têm na mulher uma agente de implementação acabam trazendo melhores resultados. Experiências demonstram que focalizar a figura feminina no papel central da família traz maior garantia de que os benefícios se reverterão para todos os outros membros””, afirma Thaís.

Educação – Especialistas concordam que a educação é a via mais rápida para que a mulher se liberte da pobreza. Ao investir neste público, contribui-se para reduzir as taxas de fecundidade e de desnutrição infantil e para melhorar a qualidade de vida, o desenvolvimento e o bem-estar geral dos filhos e de toda a família.

Nos países onde as meninas têm metade da probabilidade de ir à escola do que os meninos, há uma média de 21 mortes a mais de bebês por cada mil nascidos vivos do que nos países onde não existe essa discrepância de gênero.

A pesquisa também revelou que 43% da redução da desnutrição infantil pode ser atribuída aos avanços na educação da mulher, mais do que a própria melhoria na distribuição de alimentos (23%).

Política – Nos debates sobre economia e desenvolvimento geralmente são omitidas as vozes femininas e suas experiências de vida, seja como trabalhadoras ou como consumidoras. Com mais acesso à educação, elas também podem assegurar maior participação política e buscar sua plena representação na tomada de decisões.

Para Maria Aparecida da Silva, presidente da ONG Geledés – Instituto da Mulher Negra, é preciso que se reconheça a desigualdade, para depois desenvolver políticas e ações que explicitem e enfrentem essa distinção.

“”As empresas e organizações da sociedade civil podem ajudar, promovendo mulheres a cargos de chefia, reparando as desigualdades salariais, construindo creches próximas ao local de trabalho e adotando políticas de inclusão de grupos específicos de mulheres.””

Além disso, as mulheres podem mobilizar esforços pessoais para melhorar seu poder de negociação em casa e no trabalho. Pertencer a organizações, ter acesso a redes familiares e sociais, assim como outras formas de “”capital social””, são apontadas pela pesquisa como capazes de acrescentar esse poder.

Muitas atitudes são intrínsecas, como o conhecimento dos direitos pessoais e a auto-confiança para utilizá-los. Thaís Corral aponta a insegurança como um dos principais fatores que afetam a atuação feminina na sociedade.

“”Esse é um mundo ainda muito masculino e são poucas as mulheres que se sentem seguras o suficiente para falar sobre temas como finanças e desenvolvimento. Mas isso vem mudando. O Brasil tem uma legislação bastante avançada, que exige que os partidos políticos tenham 30% de mulheres entre seus candidatos nas eleições, e muitas mulheres gostariam de concorrer a postos políticos””, explica.

O relatório apontou um grande benefício na participação políticadas mulheres: elas estão menos dispostas a receber e oferecer suborno. Em 98 países, os dados indicaram que há menos corrupção quando as mulheres têm maior proporção no parlamento e altos postos governamentais.

Saúde – Outro aspecto levantado pelo estudo do Fundo de População das Nações Unidas relaciona-se à epidemia de Aids. Atualmente, as mulheres constituem quase a metade do total de adultos infectados. Nos países mais afetados da África, elas somam 58% desse público.

Os encarregados de formular políticas já reconhecem que as mulheres se contaminam devido à sua condição feminina. Em muitos lugares, a cultura da população impede que elas se neguem a práticas sexuais de risco e não permite o acesso às informações sobre prevenção.

É muito importante proteger e melhorar a saúde das mulheres, aponta o relatório, incluindo sua saúde reprodutiva, e fornecer informação e serviços para que isso aconteça.

Amália Fischer, coordenadora técnica do Fundo Ângela Borba, lembra que a questão de gênero implica em relações culturais, sociais, políticas e sexuais entre homens e mulheres. “”Essas relações também são de poder e continuamos vivendo de maneira patriarcal. Nesta lógica se inserem o abuso sexual e a violência contra a mulher, a invisibilidade sexual ou a hipererotização feminina, etc.””

Para ela, além de programas voltados à educação e à saúde da mulher, é preciso desenvolver ações específicas com relação à sexualidade, à erradicação da violência contra a mulher e à conscientização dos direitos femininos para a superação do processo de feminização da pobreza apontado pelo Fundo de População das Nações Unidas.

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