Remuneração variável em organizações sociais busca simetria entre profissionais
Por: GIFE| Notícias| 20/08/2012Rodrigo Zavala
As práticas de remuneração variável, tão comuns no setor privado, ainda causam certa divergência quando levadas a organizações sociais, em especial na gestão de fundações e institutos (associações) de origem empresarial. Com uma legislação dúbia, o que gera interpretações jurídicas contra e a favor, iniciativas de participação nos resultados ainda engatinham no setor social.
Ciente do dilema, o GIFE realizou em agosto, um diálogo avançado sobre o tema para identificar os desafios e possibilidades da realização dessas práticas, junto a advogados e organizações dispostas a implementá-las. Além da participação de Flávia Regina, sócia do Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados, e Eduardo Szazi, sócio fundador do Szazi Bechara Advogados, foram apresentados os casos do Instituto Ecofuturo e Fundação Lemann.
O ponto central do debate se apoia na Lei n°10.101, de dezembro de 2000, que regula a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados de uma empresa, nos termos do art. 7°, inciso XI, da Constituição. É nesse ponto, diretamente sobre o artigo 2°, que os juristas divergem, pois ao mesmo tempo que a lei não equipara organizações sem fins lucrativos a empresas, também não veta explicitamente a adoção.
Legalmente, a Participação nos Lucros e Resultados (PLR) não se incorpora aos salários dos empregados e está atrelada à performance da organização. Assim, a PLR pode ser considerada um prêmio pelos resultados atingidos com participação de todos, concedido através de acordo previamente firmado entre colaboradores, sindicatos e direção da organização.
Amparados por pareceres positivos de suas respectivas áreas jurídicas, algumas organizações já implantaram iniciativas nesse sentido. No entanto, sobre essas instituições paira sempre a dúvida que uma fiscalização do ministério público possa vir com um entendimento contrário, levando assim a uma sanção, e possível perda de isenções e imunidades tributárias. Este é o receio de muitas organizações sociais.
O advogado Eduardo Szazi, com base no texto da lei, acredita que não há proibições jurídicas para as organizações sociais adotarem, desde que não haja distribuição, mas participação. “”Desobrigar é diferente de proibir””.
Um exemplo vem da Fundação Telefônica Vivo, que pôs em prática a PLR há dois anos. Embora não estivesse presente no evento, a organização foi considerada especialmente para esta matéria. “A lei se chama participação nos resultados. As pessoas que estão aqui participaram do resultado da Fundação, ainda que ele não tenha se materializado em lucro, porque não nos cabe lucrar”, afirma a diretora-presidente da fundação, Françoise Trapenard (veja entrevista completa).
De acordo com ela, a decisão para implementar PLR se centrou em dois motivos: por uma simetria entre funcionários da fundação e da mantenedora, e a cultura organizacional, em que resultados coletivos impactam na remuneração de cada um. Com esse foco, a fundação e o Senalba (Sindicato dos Empregados em Entidades Culturais, Recreativas, de Assistência Social, de Orientação e Formação Profissional no Estado de São Paulo), fecharam um acordo, que é revisto anualmente.
“A área jurídica do sindicato também analisou o pedido e entendeu que, respeitada as condições de que o sistema vale para todos e não está baseado em resultados financeiros, mas em métricas pactuadas entre os representantes dos empregados e a instituição”, afirma.
Sobre uma possível discordância por parte da administração pública, Françoise é assertiva: “o fato de existirem debates e diferentes posicionamentos é valido. Mas o meu departamento jurídico fez um parecer e o sindicato que representa os funcionários analisou e assinou um PRL comigo”.
Bonificação
Outro ponto tocante à remuneração variável é a bonificação, prática adotada pelo Instituto Ecofuturo e Fundação Lemann, casos demonstrados durante o Diálogo Avançado promovido pelo GIFE. Em ambas iniciativas há uma avaliação de desempenho anual, atrelada a metas mensuráveis.
Na Fundação Lemann, como explicou seu diretor executivo, Denis Mizne, as metas se dividem em globais, projetos, áreas e pessoais, acompanhadas mensalmente, com fechamento anual atrelado ao pagamento de bonificação. São levadas em consideração também notas de gerenciamento de rotina das áreas meio (veja apresentação).
Já no Instituto Ecofuturo, metas coletivas (do instituto como um todo), individuais (processos, e projetos) e comportamentais (plano de desenvolvimento individual). O pagamento é feito através de gratificação, como apontou o coordenador financeiro do instituto, Edmar Barros. (veja apresentação).
“As metas não devem ter foco financeiro, mas eficiência administrativa e gerencial, além de maximização dos recursos destinados do desenvolvimento das atividades fins do instituto”, lembrou.
No entanto, juristas apontam que a prática de bonificação deve ser adotada com cautela, já que ela pode acabar se transformando em direito adquirido. Desta forma, caso o colaborador não o receba em determinado ano, pode exigir judicialmente a bonificação.
Valorização
A discussão sobre remuneração variável em organizações sociais passa pela percepção de que um veto à prática cria um trabalhador de segunda classe sem os mesmos direitos. Essa é a tal assimetria entre funcionários das fundações e institutos empresariais em comparação aos de suas mantenedoras.
Françoise Trapenard resume essa percepção: “a mensagem subliminar de que não geramos resultados me incomoda”. Para ela, se buscamos a profissionalização no setor, temos de ter modelos de remuneração compatíveis.
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“A mensagem subliminar de que não geramos resultados me incomoda”