Três cuidados sobre dados

Por: GIFE| Notícias| 24/09/2012

Luc Tayart de Borms*

Esta edição da Alliance apresentando como tema central os dados é muito oportuna. Poucas pessoas duvidarão ou questionarão a importância dos dados no contexto profissional. Estou certo de que esta “nova classe de ativos” será o centro de discussões no setor filantrópico nos próximos anos. Como sempre acontece quando um novo tema é colocado na agenda, há o perigo de exagerar com as promessas. Deixe-me apenas contrabalançar alguns pontos escritos aqui com três bandeiras de cautela, cada uma com o cabeçalho de uma citação de Einstein.

“A perfeição dos meios e a confusão dos fins parecem caracterizar a nossa época”

Para não ter que receber mais e mais pesquisas em nossa caixa de correios é fundamental refletirmos antecipadamente sobre o uso e o valor agregado dos dados sendo coletados. A coleta de dados é cara tanto em termos de orçamento quanto de alocação de tempo. É importante que todos no setor entendam isto e utilizem a coleta de dados com cuidado, evitando os exageros sem se esquecer dos compromissos orçamentários.
O perigo é que as pesquisas pedem muitos dados esquecendo que, na realidade, são necessários alguns poucos para efeitos de defender e definir políticas. Também é fácil esquecer que os dados são quase sempre relevantes se comparados ano pós ano. Isto significa que a coleta de dados precisa estar estruturalmente integrada na organização e as necessidades orçamentárias garantidas em cada exercício.
Seguindo essa mesma linha, apela-se a uma transparência no setor de fundações; deverá existir um acordo sobre o que realmente importa nesse debate. Devemos evitar criar “transparência em temas triviais”, como afirma Phil Buchanan do Centro de Filantropia Eficaz.

‘A informação não é conhecimento’
É evidente que seria acéfalo afirmar que usando dados se poderia simplificar a realidade olhando-a através de uma lente específica. Isto obviamente poderia ser muito útil desde que se tenha sempre em mente essa situação. Os dados devem ser colocados num contexto e a história real das fundações está nos detalhes.

Há alguns anos um estudo de uma Comissão Européia afirmou que as fundações européias eram maiores em termos de dotação e gastos que as suas colegas americanas. Isto fazia sentido somente porque o estudo olhava apenas para as fundações doadoras e fundações operacionais dos EUA, enquanto que para as fundações européias as duas foram consideradas iguais porque não existe uma distinção legal na Europa entre as fundações operacionais e as doadoras. Este exemplo mostra que ao focar nos dados globais, às vezes, pode se tornar um exercício intergaláctico e que o valor agregado tem que ser examinado com cuidado.

É fácil falar baseado em números, mas o conhecimento dos números não é formado por uma acumulação de dados. No raciocínio sistemático é feita uma distinção entre os enfoques superficiais e profundos e os dois são relevantes. Os que pensam mais a fundo desenvolvem modelos de uma parte do mundo. Os que pensam mais superficialmente estão cientes de que uma representação objetiva da realidade não é possível e que o observador é também um fator. Sem a intenção de querer fazer as coisas muito complicadas parece que, falando pragmaticamente, não é possível confiar apenas em um único enfoque.

“O conhecimento do que é não abre a porta diretamente para o que deveria ser”

A compilação de dados é uma tarefa que toma tempo, é um exercício caro e também há o risco de que as pequenas caridades e fundações serão confrontadas com uma espécie de fosso digital por não possuírem funcionários ou orçamento para compilar e manter dados sobre as suas atividades.

Além disso, alguns chegam rápido demais à conclusão de que a divulgação transparente de dados e informações sobre as fundações podem ser rotuladas para servir de ferramenta de benchmarking. Como já mencionei anteriormente, a realidade é muito complexa para ser baseada apenas em dados quantitativos. As pessoas que desejam utilizar rótulos qualitativos têm, logicamente, seus próprios sistemas de valores. Para se fazerem creditáveis é essencial que esses rótulos de qualidade e benchmarking sejam construídos envolvendo todas as partes interessadas, especialmente as que serão julgadas: caridades, fundações e associações. As fundações e as organizações de caridades não existem num vácuo: elas estão incorporadas numa comunidade grande ou pequena.
Ao assinalar essas bandeiras de cautela não quero diminuir o valor da coleta de dados no setor de fundações. Outras bandeiras de cautela poderiam também ser erguidas. Isto não deve nos impedir de investir neste novo “recurso não natural”, mas ao lidar com os nossos desafios devemos aceitar a sua complexidade.

*Luc Tayart de Borms é Diretora Gerente da Fundação Rei Baudoin

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