Voluntário remunerado: a novidade da Lei 10.748

Por: GIFE| Notícias| 12/01/2004

Erika Bechara
Advogada da L.O Baptista Advogados Associados

Um dos traços mais característicos do trabalho voluntário é a sua gratuidade. Ou era, já que a Lei 10.748, de 22 de outubro de 2003, criou uma exceção à tão antiga regra. O processo de amadurecimento e de profissionalização do terceiro setor tem atraído para esse campo profissionais de todas as áreas, os mais qualificados, que, por uma remuneração condizente com o mercado, colocam seu talento e conhecimento a serviço das questões sociais.

Mas nem só de profissionais remunerados vive o terceiro setor – ainda bem! – e as organizações sem fins lucrativos podem contar também com o empreendedorismo e a boa vontade de diversos atores que, sem contraprestação alguma, dedicam parte de seu tempo e de seus esforços para a causa. Nessa linha se destacam os dirigentes eleitos e os prestadores de serviço voluntário.

Quanto aos primeiros, não recebem remuneração por força de proibição legal (não esqueçamos de excepcionar os dirigentes das entidades qualificadas como OSCIP – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – que atuam na gestão executiva, uma vez que a Lei 9.790/99 autoriza que eles sejam remunerados). Quanto aos demais, não recebem remuneração por escolha própria, por vontade de doar tempo e esforços para uma causa relevante, sem qualquer contrapartida.

Para esses últimos, a Lei 9.608/98 criou um regime especial. E a Lei 10.748/03 o tornou mais especial ainda. Sim, porque enquanto a Lei 9.608 – a chamada Lei do Voluntariado – disciplina o serviço voluntário, definindo as suas principais características, afastando-o das obrigações trabalhistas e previdenciárias e reafirmando a sua gratuidade, a Lei 10.748, inserindo dispositivos na primeira, passa a permitir que os prestadores de serviço voluntário recebam uma pequena “”remuneração””, chamada de AUXÍLIO FINANCEIRO.

Este auxílio financeiro, de até R$ 150, não alcança todos os prestadores de serviço voluntário. Diz a nova lei que ele somente poderá ser concedido ao voluntário que tenha entre 16 e 24 anos e que, além disso, seja integrante de uma família cuja renda per capita mensal não ultrapasse meio salário mínimo. A lei também demonstra preferir que o auxílio seja concedido a jovens egressos de unidades prisionais ou que estejam cumprindo alguma medida socioeducativa ou a jovens trabalhadores que, pelo grupo específico em que se encontrem, estejam mais expostos ao desemprego.

Foram expressamente excluídos do benefício os jovens que, mesmo atendendo aos requisitos mencionados, tenham algum parente até o terceiro grau, consangüíneo ou afim, trabalhando na entidade para a qual prestem serviço voluntário bem como aqueles beneficiados pelo Programa Nacional de Estímulo ao Primeiro Emprego.

O auxílio ainda só poderá ser prestado por um período de seis meses a cada voluntário, decerto para possibilitar que outros na mesma situação se beneficiem da medida e para impedir que o serviço voluntário se transforme em um verdadeiro emprego sob o “”disfarce”” de serviço voluntário.

Em regra, a União patrocinará o auxílio, inclusive quando o serviço for prestado a entidades privadas sem fins lucrativos (essas, após cadastro no Ministério do Trabalho e Emprego, receberão recursos da União mediante convênio, e os repassarão para os beneficiários). Mas se tiverem condições, as organizações privadas poderão fazê-lo com recursos próprios.

Cumpre ressaltar que o auxílio em questão não configura salário e as entidades que optarem por pagá-lo não correrão o risco de, mais tarde, virem a ser consideradas empregadoras e, portanto, devedoras de obrigações trabalhistas e previdenciárias. Isso, porém, se realmente se tratar de prestação de serviço voluntário, de uma relação constituída com base e nos termos da Lei 9.608/98. Daí porque recomendarmos às organizações interessadas na utilização desse benefício a celebração do Termo de Adesão com o voluntário e a adoção de todas as cautelas, no dia-a-dia, que impeçam seja esta relação desnaturada.

Advertimos, por fim, que as entidades terão que estar preparadas para lidar – ou não lidar – com os “”voluntários de ocasião”” que a nova lei, mesmo recheada das melhores intenções, poderá atrair para este trabalho: jovens bastante interessados na contrapartida financeira, mas totalmente indiferentes à causa. Seduzi-los e transformá-los será possível? Tomara…

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