Pesquisa aponta barreira para periferias acessarem recursos filantrópicos no Brasil

Por: GIFE| Notícias| 03/04/2023
periferias

Complexo da Maré. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

No Brasil, 31% das organizações de periferia vivem com menos de R$ 5 mil por ano; em 89% dessas organizações, as equipes gestoras têm mais de um emprego; em 58%, toda a equipe é voluntária. Esses são alguns dos resultados da pesquisa Periferias e Filantropia: as barreiras de acesso aos recursos no Brasil, lançada na última quinta-feira (30).

Vale destacar que 74,1% dos integrantes dessas organizações são pessoas negras, e 68% são mulheres. 

Para Gelson Henrique, coordenador executivo da Iniciativa Pipa, que está à frente do levantamento em parceria com o Instituto Nu, são dados alarmantes e que demonstram quão importante é o financiamento para essas organizações.

Financiadores precisam conhecer a realidade das periferias

Patrícia Kunrath, coordenadora de Conhecimento do GIFE, esteve presente no lançamento da pesquisa. Para ela, o evento foi potente. “Eu destacaria a centralidade das pessoas. Foi uma série de pessoas dos territórios que conduziram a pesquisa, inclusive em regiões sem energia elétrica ou internet, e trouxeram dados preciosos.” 

Para ela, a missão a ser executada a partir dos resultados é entender como construir pontes para que os recursos possam fluir de forma mais democrática e acessível para quem vive nas regiões de periferia, que vão de favelas, a aldeias, sertões, quilombos e assentamentos, onde estão cerca de 90% das iniciativas que responderam à pesquisa.

Gelson Henrique explica que toda a equipe da Pipa vem das periferias, e consegue atestar a realidade traduzida pelos números agora disponíveis. No entanto, havia a necessidade realizar a pesquisa para “dar legitimidade”.

“As organizações de periferia não possuem acesso aos financiadores, e quando acessam dificilmente existe uma relação de confiança, porque não fazem parte da rede, não conhecem o trabalho, o território. Esse desconhecimento do setor filantrópico para com a realidade dos gestores das periferias brasileiras é um grande desafio.” 

Nesse sentido, chama atenção de Patrícia Kunrath, que 41,8% das organizações respondentes se identificam como coletivos, enquanto apenas 12,2% se identificam como Organização da Sociedade Civil (OSCs)

“Quando a gente olha para o investimento social privado se engajando com terceiros, na sua maior parte ainda são OSCs. Ainda temos uma série de exigências nos editais como ter CNPJ, cumprir determinados critérios, quando às vezes a realidade dos coletivos é que eles não conseguem nem acessar esses editais.”

Outra barreira ressaltada pela pesquisa é a impossibilidade de remunerar equipe suficiente para implementar o projeto com o recurso disponibilizado. Além das condições de prestação de contas muito burocráticas e a falta de flexibilidade para execução do recurso.

“O GIFE tem batido bastante nessa tecla: ter recursos mais flexíveis, com longo prazo, que possa pagar a equipe e que consiga estabelecer relações mais próximas para construir junto o trabalho de monitoramento e avaliação”, afirma Patrícia Kunrath.

Assim, além do diagnóstico, a pesquisa visa alcançar maior inserção do Investimento Social Privado (ISP). Ou seja, trazer o olhar dos grandes doadores do país para a realidade das periferias, potencializando o financiamento para essas organizações.

“As periferias são parceiros estratégicos”

Através da sua experiência na Pipa, Gelson Henrique defende que o principal caminho de conexão entre essas realidades é que os financiadores conheçam de perto o trabalho realizado pelas organizações de base periférica. Assim como considera importante que os gestores conheçam melhor quem está financiando seu trabalho.“É uma estratégia de articulação que no final do dia vai ampliar o impacto dessas organizações que estão trabalhando muito há muito tempo e sabem como fazer. Além disso, fazer com que tenham sustentabilidade e dignidade para trabalhar”, argumenta. “É imprescindível que se olhe para as periferias não apenas como beneficiários, mas como parceiros estratégicos da transformação social do país que a filantropia e o ISP buscam potencializar e fazer acontecer.”

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