Por uma educação transformadora no Rio de Janeiro
Por: Instituto João e Maria Backheuser| Notícias| 15/05/2023Enquanto o Brasil tem razões, mesmo que modestas, para comemorar avanços em alguns indicadores educacionais, o estado do Rio de Janeiro, segundo maior PIB do país, apresenta dados preocupantes. Se olharmos para o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) – principal indicador de qualidade educacional no país –, as redes públicas do estado não alcançam, há ao menos uma década, as metas de aprendizagem do governo federal, seja para o Fundamental (1º ao 9º ano) ou para o Ensino Médio. E, dos alunos do 5º ano do Fundamental em 2021, menos da metade apresentou aprendizagem adequada em língua portuguesa; e menos de um terço, em matemática – desempenho abaixo da média nacional e inferior aos demais estados do Sudeste.
O estado do Rio segue em marcha ré e quem paga o preço são os alunos das redes públicas de ensino. Talvez o fato de sermos o estado com o maior percentual de matrículas do Ensino Fundamental na rede particular (30% nos Anos Iniciais e 26% nos Finais) contribua para a nossa apatia coletiva diante de tamanha negligência do poder público. Um cenário que fica ainda mais gritante quando nos deparamos com a carência de políticas voltadas para a alfabetização – momento de aprendizagem que interfere em toda a trajetória escolar das crianças.
Em 2021, o estado do Rio chegou a lançar o programa Rio+Alfabetizado que não foi sequer regulamentado e, na prática, se resumiu a uma especialização de 180 horas, online, oferecido pela UERJ, para pouco mais de 2 mil professores das 91 redes de ensino municipais. Ações pontuais como essa não vão fazer do estado fluminense um exemplo nacional em política de alfabetização. Um caminho possível foi trilhado pelo Ceará que, ao apostar em políticas públicas consistentes para alfabetizar as crianças na idade certa, se tornou a maior referência em política de alfabetização em regime de colaboração do país, mesmo tendo um dos menores PIBs per capita do Brasil.
A transformação da educação Cearense se inspirou no caso de sucesso da educação de Sobral, considerada a capital nacional da educação, e começou com a criação do Programa de Alfabetização na Idade Certa (PAIC). Em 2005, dois anos antes de se tornar uma política do governo estadual, o PAIC nasceu de uma parceria entre entidades governamentais e do terceiro setor. Dos 184 municípios do estado, 56 adotaram o programa e abriram caminho para sua adoção em nível estadual. É importante destacar que, no Ceará, diferentemente da maioria dos estados, praticamente 100% da oferta de Ensino Fundamental são de responsabilidade dos municípios. Mas, com o PAIC, o estado se responsabiliza pelo sucesso dos estudantes das redes municipais.
O Programa se baseia numa visão sistêmica do processo educacional para oferecer suporte pedagógico a alunos e professores, apoio para a gestão das redes e avaliação da aprendizagem, focado em garantir a alfabetização até o 2º ano do Fundamental. Há ainda duas políticas de incentivo: uma para as redes municipais, que atrela o repasse da parcela variável do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) à melhora dos resultados educacionais; e outra para as escolas, por meio do programa Escola Nota 10. O PAIC começou focando na alfabetização e, aos poucos, estendeu seu alcance para todo o Fundamental, passando a se chamar Programa de Aprendizagem na Idade Certa (Mais PAIC) em 2015.
A experiência bem-sucedida do Ceará inspirou outras iniciativas em todo o Brasil, como a Parceria pela Alfabetização em Regime de Colaboração (PARC), iniciativa da sociedade civil organizada, que já está em 15 estados. É um esforço hercúleo e ainda mais urgente considerando a piora dos resultados da avaliação do 2º ano do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), de 2021, sob o impacto da pandemia (certamente subestimado diante do baixo percentual de alunos avaliados).
A reforma educacional cearense também inspirou os legisladores a incluir, como pré-requisito para o recebimento do Valor Adicionado Aluno Resultado (VAAR) – um dos três tipos de complementação da União ao FUNDEB –, que os estados adotem leis de ICMS Educacional até o final de 2022. O valor estimado do VAAR a ser distribuído para estados e municípios em 2023 é de R$1,7 bilhão. Infelizmente, nem Minas Gerais, nem o Rio de Janeiro cumpriram a condicionalidade. Além de se tornarem inelegíveis para o recebimento deste recurso, perdem a oportunidade de incentivar seus municípios a melhorarem a qualidade e reduzir a desigualdade da sua educação por meio de uma lei de ICMS Educacional.
O Ceará nos mostra, nos últimos anos, que é possível transformar a educação, multiplicando nas redes iniciativas que deram certo. Felizmente, o Ministério da Educação é hoje liderado por dois dos principais responsáveis pelas reformas cearenses que já deixaram claro que a alfabetização será prioridade absoluta. Esperamos assim que a política nacional de alfabetização a ser lançada em breve convoque o estado do Rio de Janeiro a assumir sua responsabilidade junto às redes municipais de ensino em regime de colaboração. Afinal, todos os 2,5 milhões de alunos matriculados nas redes públicas de ensino do RJ precisam ter seu direito à uma educação de qualidade garantido. O Instituto João e Maria Backheuser se soma a este movimento para transformar realidades e reverter indicadores educacionais que muito nos preocupam. Não podemos esperar mais. Nossas crianças não têm tempo a perder. #EducaçãoJá
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Texto de Teca Pontual, diretora-executiva do Instituto João e Maria Backheuser