ECA 35 anos: avanços, desafios e o papel do ISP na proteção de crianças e adolescentes
Por: GIFE| Notícias| 14/07/2025
Em julho de 1990, nascia o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), resultado da mobilização de movimentos sociais, militantes dos direitos humanos e Organizações da Sociedade Civil (OSC). Passados 35 anos, o Brasil acumula avanços significativos na proteção da infância e adolescência, mas ainda carrega desigualdades estruturais que exigem atenção e investimentos contínuos.
A partir do ECA, a legislação passou a reconhecer crianças e adolecentes como sujeitos de direitos, exigindo do Estado, da família e da sociedade o dever de protegê-los.
Entre as frentes que tiveram papel essencial para a efetivação da política que passa a considerar crianças e adolescentes sujeitos de direitos, destaca-se o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua (MNMMR), como explica José Ribeiro da Silva, ex-educador de Rua e militante do MNMMR no Município de Pombal, na Paraíba.
“Primeiro, a gente tem uma mudança de paradigmas. O que antes era punitivo, com uma visão pejorativa e discriminatória, passa a ter um olhar humanizado. A criança deixa de ser tratada como um ‘menor problema’ e passa a ser vista como prioridade absoluta”, afirma.
“Fui menino do movimento. Desde 1985, participei de encontros e ações em que meninos e meninas relatavam a ausência de direitos básicos. Essas falas viraram base para a formulação do ECA. Tudo isso foi incorporado a partir dos encontros nacionais de 1986 e 1989, com forte influência no artigo 227 da Constituição e no artigo 4º do ECA”, completa.
Avanços concretos e desafios persistentes
Desde a sua promulgação, o Estatuto gerou políticas públicas que reduziram significativamente indicadores como mortalidade infantil. De acordo com informações divulgadas pela Organização das Nações Unidas (ONU), no período de 2000 a 2022 o Brasil alcançou uma redução de 60% desses casos. Diminuuição da evasão escolar e combate ao trabalho infantil também são outros fatores alcançados, além das novas iniciativas na saúde.
No entanto, persistem gargalos na aplicação da lei, especialmente no funcionamento da rede de proteção. Segundo José Ribeiro da Silva, um dos principais entraves ainda é a compreensão limitada por parte do poder público, e de setores da Justiça, sobre o papel dos Conselhos Tutelares. “O Estado muitas vezes não compreende a importância da requisição de serviços. Ainda há uma inversão de papéis na rede de atendimento”, denuncia.
Outro ponto alarmante são as violências contra crianças e adolescentes no Brasil. De acordo com dados do 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, houve aumento entre 2011 a 2023 das agressões de crianças no ambiente doméstico. Na faixa etária de 0 a 4 anos esse aumento correspondeu a 9,4%; de 5 a 9 anos, 11,4%; e de 10 a 13 anos, 2,6%. O crescimento dos casos de estupro também são agravantes: houve um crescimento de 91,5%; 61,6% das vítimas tinham até 13 anos.
“É fundamental avançar em respostas que não revitimizem as vítimas, além de investir em um programa nacional de prevenção das violências, que promova a proteção integral e enfrente as desigualdades econômicas, étnico-raciais e de gênero”, observa Itamar Gonçalves, superintendente de Advocacy na Childhood Brasil. “No caso da violência sexual, é imprescindível incorporar uma abordagem de educação para a saúde sexual, fomentando uma cultura de prevenção junto às famílias e à sociedade”, completa.
Uma aliança a ser fortalecida
Na busca por ferramentas eficazes para fortalecer a efetividade do ECA perante as áreas que ainda se apresentam como desafios, está o Investimento Social Privado (ISP), opina Itamar Gonçalves. No entanto, ele chama atenção para o que ainda pode ser feito.
“Apesar dos avanços em orientações e boas práticas, a adesão ainda é baixa e poucas políticas estão institucionalizadas nas empresas para garantir direitos adequados. Um exemplo disso é a licença-paternidade, que ainda é pouco utilizada e insuficiente para promover uma parentalidade positiva.”
Segundo o Censo GIFE 22-23, a primeira infância, por exemplo, é uma das faixas etárias menos priorizadas pelos respondentes do levantamento. Por outro lado, “adolescentes de 15 a 17 anos e jovens de 18 a 29 anos são grupos enfocados diretamente por 45% das organizações”.
“O setor privado pode contribuir mais efetivamente ao adotar políticas internas robustas, investir em formação e sensibilização de seus colaboradores e apoiar programas e iniciativas de impacto social e coletivo que possam contribuir diretamente na proteção e garantia dos direitos de crianças e adolescentes em todas as suas dimensões”, conclui Itamar Gonçalves.