Epidemia de dengue é um alerta a filantropia para a necessidade de investimento permanente na saúde
Por: GIFE| Notícias| 08/04/2024Primeiro dia de vacinação contra dengue em crianças de 10 a 14 anos na Unidade Básica de Saúde - UBS Vila Jaguara, na região oeste. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
O Brasil enfrenta em 2024 a maior epidemia de dengue já registrada. De acordo com o quadro de atualização dos casos de arbovirose do Ministério da Saúde (MS), o país passou de mil óbitos e corre o risco de superar recorde histórico de 2023, quando foram contabilizadas 1.094 mortes por causa da doença. Além disso, até o momento foram registrados 2.747.643 casos prováveis de dengue. Pessoas negras, principalmente mulheres, são as maiores vítimas. Para especialista, racismo ambiental e desigualdade social agravam a atual conjuntura.
“É uma situação alarmante, pois historicamente sabe-se que o aumento de casos de dengue se dá entre março e abril. No entanto, a estimativa do Ministério da Saúde é que cheguemos ao final de 2024 com mais de 4,2 milhões de casos registrados”, aponta Thâmarah Albuquerque, docente e pesquisadora do Laboratório de Bioquímica de Proteínas (BioProt) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Quantitativo que, se alcançado, ultrapassará o registro histórico de 2015, que foi de 1.688.688 casos.
“Os altos registros de dengue neste início de ano podem estar associados às mudanças climáticas ocasionadas pela alta emissão de poluentes, levando à um aquecimento global acelerado, aumento da temperatura nos trópicos e aceleração do ciclo de vida do Aedes Aegypti, mosquito vetor do vírus da dengue”, reflete Thâmarah Albuquerque.
“Para ter uma ideia, o ciclo de vida do A. Aegypti dura cerca de 10 dias, esse ano já foi observado que houve uma redução de quase 50% na duração do ciclo causado pelo aumento da temperatura, ocasionando um aumento na população de insetos adultos, portanto uma maior incidência da doença”, completa a pesquisadora. Conjuntura que atrelada a fatores sociais tornam-se forte ameaça a grupos vulnerabilizados, especialmente as mulheres negras que são uma das principais vítimas da desigualdade social brasileira.
Dados do painel do MS atualizados na última sexta-feira (5), mostraram que 55,4% dos casos prováveis de dengue este ano correspondem a pessoas do sexo feminino, desse total, 53,6% são negras.
Sendo um dos principais problemas de países subdesenvolvidos, a falta de saneamento básico se apresenta como um dos agravantes que favorecem ambientes propícios para o desenvolvimento do mosquito da dengue.
“Nesse raciocínio conseguimos entender por que as mulheres negras estão nesse grupo de risco, porque elas, em sua maioria, moram nas periferias e comunidades, locais com pouco ou nenhum saneamento básico”, aponta Thâmara Albuquerque.
Altamiza Melo, presidente da CUFA (Central Única de Favelas) de Pernambuco, também vê na falta de água um agravante.
“Andando pelas favelas, observamos que a falta de abastecimento de água ocasiona o armazenamento errado e isso é o que gera mais focos da dengue. E como as casas nesses territórios são muito próximas uma das outras, o mosquito consegue infectar mais pessoas nesses raios.”
Comprometimento permanente
Apesar da tendência de estabilidade ou queda na incidência de dengue, 11 unidades da federação permanecem em situação de emergência, o que revela a necessidade de esforços conjuntos para que o Brasil consiga enfrentar os obstáculos ocasionados por essa epidemia. Nesse sentido, o investimento social privado (ISP) surge como um aliado importante, assim como foi durante o período de pandemia da Covid-19.
No entanto, dados do Censo GIFE 22-23 revelam o desaceleramento de investimentos no setor, tendo em vista que apenas 23% das organizações têm a saúde como área temática de atuação, ficando em 10º lugar. Em 2020 a área ocupava a 5ª posição.
“Contar com o apoio do ISP é aliar a capacidade que o setor tem de captar recursos com a especialidade que as organizações sociais têm em mobilizar a sociedade e criar mecanismos de prevenção e combate”, ressalta Altamiza Melo.