Exposição à tecnologia está associada com melhora na aprendizagem; mas o acesso nas escolas ainda é desigual
Por: GIFE| Notícias| 08/07/2024Imagem: Istock Foto
Assim como a tecnologia tem potencial para transformar o cenário educacional positivamente, ela também pode, se não integrada ao ensino de maneira equitativa, ser instrumento catalisador de desigualdades. É isso que indica a pesquisa Tecnologia e Desigualdades Raciais no Brasil, lançada pelo Núcleo de Estudos Raciais do Insper (NERI), com apoio da Fundação Telefônica Vivo.
Os pesquisadores avaliaram a presença e infraestrutura tecnológica adequada nas escolas e seu uso pelos professores, constatando que alunos brancos têm maior acesso a computadores, internet e laboratórios de informática e ciências. Também foi medido o uso de internet, computador, projetor e softwares de ensino pelos professores. A desigualdade chega a 24% na relação entre o acesso de um aluno branco da rede privada da região Sul, ao de um estudante preto da rede pública do Nordeste.
“Os resultados mostram mais uma camada na qual os negros tendem a estar em desvantagens em relação aos brancos”, afirma Michael França, coordenador do NERI.
Para Lia Glaz, diretora presidente da Fundação Telefônica Vivo, os resultados são especialmente importantes, pois a relação com a tecnologia e a matemática pode influenciar a decisão de carreira dos alunos. Como alunos com maior exposição à tecnologia tendem a obter melhores resultados em matemática, isso pode aumentar a probabilidade de optarem por carreiras nas áreas de STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática). Segundo o levantamento, as disparidades raciais são maiores exatamente nessa área.
“É importante mencionar que essa área é altamente valorizada, associada a remunerações mais elevadas. Tais resultados mostram como as desigualdades de acesso a tais carreiras podem influenciar desigualdades salariais no mercado de trabalho.” acrescenta a diretora.
Ela lembra ainda das desigualdades regionais, já que estudantes negros estão concentrados em regiões com menores índices de desenvolvimento, onde o acesso a recursos tecnológicos é ainda mais limitado.
Sub-representação nos cursos superiores de tecnologia
Outro apontamento do estudo é que, embora haja um aumento geral na representação dos negros no ensino superior no decorrer dos últimos anos, especialmente em decorrência de políticas de ação afirmativa, ainda há uma sub-representação nos cursos de STEM.
“Essa diferença é relevante porque o acesso desigual a cursos de maior prestígio e melhores perspectivas de emprego pode limitar oportunidades profissionais e contribuir para as disparidades salariais observadas posteriormente na carreira”, pontua Michael França. “O Estado pode perpetuar desigualdades de várias formas, incluindo com disparidades nos investimentos na infraestrutura escolar. Ao oferecer aos negros menos acesso à tecnologia, o Estado se torna uma fonte relevante de reprodução das desigualdades educacionais e socioeconômicas preexistentes”, complementa o coordenador.
Alysson Portella, pesquisador do NERI, chama atenção para a ausência de imaginários que estimulem jovens negros a aspirarem as áreas de tecnologia como uma carreira possível. “Muitas vezes em função do racismo nem passa pela cabeça desses jovens tentar esse tipo de curso. É importante levar referências para esses alunos no ensino médio, que dialoguem com a realidade deles.”
ISP pode apoiar mais pesquisas e fazer monitoramento das políticas públicas
O documento do NERI faz ainda recomendações para políticas públicas de redução das desigualdades, como realizar acompanhamento continuado do acesso e uso da tecnologia na educação básica e seu impacto no desempenho; e exigir um percentual mínimo de alunos ou bolsistas negros em cada curso de ensino superior para condicionar o acesso a subsídios governamentais e programas de fomento.
Quanto ao investimento social privado (ISP), Lia Glaz defende que o setor pode desempenhar um papel crucial. Tanto no investimento em mais pesquisas como essas, como no apoio às redes de ensino tanto na implementação como no monitoramento de políticas públicas.
“Embora a computação já esteja prevista na Base Nacional Comum Curricular, muitas redes de ensino enfrentam desafios na implementação devido, principalmente, à falta de recursos e suporte adequados”, pontua.
Acesse a pesquisa completa aqui.