Tendências em fortalecimento e ampliação da cultura da doação

Por: GIFE| Notícias| 06/03/2017

Dando sequência à série que o GIFE está produzindo sobre tendências para o Investimento Social Privado, agora chegou a vez de falar sobre ampliação da doação. Convidamos Rodrigo Alvarez, sócio-diretor da Mobiliza e articulista voluntário da Plataforma Captamos, para nos apoiar na elaboração de reflexões sobre este tema.

O assunto vem sendo amplamente explorado em reportagens, publicações, pesquisas, eventos e debates no campo social – inclusive foi um dos destaques do Congresso GIFE de 2016 e é uma das agendas estratégicas da organização para os próximos anos. Mas, em meio a tanta inovação e novidade, o que é, de fato, aposta e o que é apenas especulação?

Inovação, a propósito, talvez seja a senha para decifrar um código tão complexo: como trazer mais atores para este campo e como gerar mais impacto para cada partícula do recurso investido? Logo, é preciso inovar para mobilizar, inovar para cooperar, inovar para captar recursos, inovar para buscar soluções para problemas complexos e inovar para comunicar causas e resultados.

No fim da linha, o que se espera é ampliar os recursos disponíveis no campo filantrópico e também fortalecer a cultura de doação entre os investidores sociais. Este é um esforço capaz de fazer uma sociedade civil mais forte e solidária, com infraestrutura capaz de resolver problemas socioambientais de diversas naturezas.

Confira algumas apostas:

 

Investimento em inovação tecnológica

Novas tecnologias devem movimentar o campo social brasileiro. Plataformas digitais de mobilização social, aplicativos móveis, sistemas de doação via internet – como crowdfunding – tendem a surgir e, por consequência, a fortalecer a cultura da doação no Brasil.

Rodrigo Alvarez acredita que as ferramentas tecnológicas devem, de fato, ampliar a capacidade de identificar, atrair e estabelecer relações mais profundas com parceiros e doadores. “O crowdfunding é um exemplo, mas existem muitas outras nem tão novas, como as ferramentas de CRM (Custumer Relationship Manager), cada vez mais sofisticadas; e novidades, como a realidade virtual, que podem aproximar um doador de um trabalho de campo distante (em uma floresta ou em um campo de refugiados, por exemplo).”

Além destas estratégias de mobilização de recursos, deverá ser uma tendência o uso de dados para ampliar a inteligência das organizações, fazendo com que seu trabalho seja cada vez mais eficaz e de impacto – tal qual já fazem há tantos anos as organizações da iniciativa privada.

 

Cooperação entre atores e criação de modelos híbridos para financiamento de projetos

Conceitos como cooperação, co-criação e colaboração – entre indivíduos e/ou organizações sociais – devem se fortalecer no campo social. Contudo, para o consultor, esta ideia ainda está mais no campo das apostas do que da concretude. “Na prática, as organizações têm dificuldade de abrir mão de suas próprias agendas e de pensar em torno de uma causa comum.”

Rodrigo acredita que coletivos e grupos não institucionalizados têm mais flexibilidade para encampar projetos colaborativos do que as organizações mais estruturadas, que tentem a agir mais individualmente. “O que poderemos presenciar, em breve, são grandes organizações se tornando mais leves e simples ou criando áreas ou protótipos de projetos novos. Para isso, também os investidores sociais precisam estar abertos ao risco.”

Outra aposta são os modelos híbridos de financiamento do impacto social. Com a maior integração entre Investimento Social Privado e o negócio, devemos presenciar novos formatos de financiamento de projetos para impacto social, que misturem recursos filantrópicos (a fundo perdido) com recursos de investimento de impacto (com expectativas de retornos variáveis). Empréstimos e financiamentos governamentais com juros baixos poderão também se somar na composição de recursos.

 

Criação de novos fundos setoriais ou fortalecimento dos existentes

Muito se especula sobre o campo social evoluir para criação de um grande fundo capaz de fortalecer a estrutura que melhore o ambiente de doações no Brasil – o Fundo BIS já é uma iniciativa que nasce com essa missão.

A tendência é que tenhamos mais informação, conhecimento e estrutura para que o ambiente de doações prospere no Brasil. A questão é que apenas isso não será suficiente para que, de fato, se instale uma cultura de doação. “Junto com a infraestrutura intermediária, será necessário um trabalho, de um lado, para o desenvolvimento de uma nova cultura filantrópica [como doar para um fundo, por exemplo] e, de outro, que as organizações sociais e empreendedores sociais saibam como construir relações de confiança que façam com que um investidor sinta que seu recurso foi bem investido e que vale a pena continuar investindo.”

 

Fortalecimento da cultura da solidariedade e de causas menos tradicionais ao ISP

Eventos que contrapõem o estímulo ao consumo excessivo na sociedade atual devem se fortalecer – como é o caso do Dia de Doar, que ocorre logo após à ‘Black Friday’. O consultor aponta que este tipo de iniciativa deve envolver outros públicos que não estão pensando no assunto ou que já são solidários, mas não se percebem como parte de um ‘campo filantrópico’.

A tendência do crescimento do número de doadores individuais vem sendo apontada por vários estudos. De acordo com a Pesquisa Doação Brasil, liderada pelo IDIS (Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social) no ano de 2015, 77% dos brasileiros fizeram algum tipo de doação.

“O importante será nos darmos conta de que já existe uma forte cultura de solidariedade no brasileiro, mas com iniciativas que não se conectam. Uma tendência será a discussão de ‘que cultura de solidariedade necessitamos?’ e a ressignificação do termo filantropia. Com o total descrédito da classe política, deve crescer o debate público a respeito do papel da sociedade civil organizada, já que ainda não temos construído, no imaginário do brasileiro, que organizações sociais podem ter um papel fundamental no desenvolvimento da democracia”, avalia.

Em paralelo ao fortalecimento do movimento da doação individual, algumas causas – antes pouco valorizadas pelo Investimento Social Privado mais tradicional – têm ganhado força nos últimos anos e devem mobilizar novos doadores. Este é o caso das questões de identidade gênero, do combate ao racismo e à discriminação, dos movimentos por moradia e da causa indígena, por exemplo.

Rodrigo acredita que estas são causas que mobilizam muita mídia e debate nas redes sociais – apesar de ainda não atraírem muitos doadores. Para ele, as organizações que atuam com essas pautas precisarão desenvolver campanhas efetivas que traduzam de maneira mais fácil seu valor para o público leigo.

 

Fortalecimento institucional

“Cada vez mais, o que importará ao investidor social será o impacto que seu investimento gerou. Porém, impacto não cai do céu”, afirma o consultor. Ele explica que qualquer resultado de aprimoramento na forma de atuar das organizações sociais é conquistado a partir do refinamento de metodologias de intervenção –  e isso pode levar anos.

E não existe fórmula para gerar mais impacto que não passe pelo fortalecimento institucional das organizações. “Para que seja possível atingir níveis cada vez mais elevados de efetividade será fundamental investir no desenvolvimento institucional das organizações sociais, para que elas sejam capazes de se desenvolver de maneira consistente e contínua”, avalia.

 

 Dicas de leitura: 

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