Violência contra crianças desafia a sociedade: casos dobram em dez anos no Pequeno Príncipe
Por: Complexo Pequeno Príncipe| Notícias| 19/05/2025
Número de crianças com lesões provocadas por violência subiu 60% em relação ao ano anterior; mais de 70% das vítimas são meninas
A violência contra crianças e adolescentes segue como um dos maiores desafios sociais e de saúde pública no Brasil. Levantamento do Hospital Pequeno Príncipe, referência no atendimento infantojuvenil em situações de violência, revela uma realidade alarmante: nos últimos dez anos, o número de atendimentos praticamente dobrou, passando de 378 em 2014 para 720 em 2024. A variação acompanha a tendência de crescimento registrada em todo o país.
Em 2024, 72% dos casos atendidos no Hospital foram classificados como violência intrafamiliar – agressões cometidas por membros da própria família, como pais, padrastos e irmãos, ou por pessoas próximas, como cuidadores. A violência sexual foi o tipo mais frequente, respondendo por 58% dos atendimentos. A maior parte dos agressores identificados era do sexo masculino (67%), e as meninas representaram 71% das vítimas.
A análise dos dados do Hospital Pequeno Príncipe reforça a necessidade de políticas públicas mais robustas voltadas à proteção de crianças e adolescentes, além da ampliação das redes de apoio e denúncia.
Um dos dados mais alarmantes é o crescimento do número de crianças acolhidas em abrigos: foram sete em 2024, contra apenas duas em 2023. O acolhimento é uma medida extrema, adotada apenas quando a permanência da criança em casa representa risco à sua vida ou integridade física e não há familiar que possa garantir sua segurança.
Além da maior frequência, os casos também têm se mostrado mais graves. O total de crianças com lesões provocadas por violência subiu de 128 para 205, uma elevação de 60%. Muitas dessas lesões envolvem fraturas. Também aumentaram os internamentos, que passaram de 103 para 135, um salto de 31%. Esses dados indicam um cenário de violência mais intensa. Um caso emblemático e preocupante foi o de uma bebê de apenas 29 dias entre as vítimas atendidas e que precisou ser internada.
Primeira infância: o grupo mais vulnerável
Em 2024, o Hospital Pequeno Príncipe atendeu 474 crianças de até 6 anos, das quais 309 – 65% – foram acolhidas por suspeita de violência sexual. A maioria das vítimas era menina, com casos graves envolvendo bebês com apenas 4 meses.
Especialistas apontam que a Primeira Infância (0 a 6 anos) é um período de alta vulnerabilidade. Crianças pequenas são particularmente expostas à violência devido à sua imaturidade cognitiva e emocional, dependência total de adultos para cuidados e proteção, e dificuldade de verbalizar situações de abuso. A combinação desses fatores torna essa fase crítica, em que agressões podem ocorrer de forma silenciosa e devastadora.
Estudos de neurodesenvolvimento indicam que as experiências nos primeiros anos de vida moldam a arquitetura do cérebro. A exposição precoce à violência é considerada um estresse tóxico, que pode afetar o funcionamento neurológico e aumentar o risco de problemas futuros, como transtornos de saúde mental, dificuldades de aprendizagem e doenças crônicas.
Violência digitaI
A crescente presença de crianças e adolescentes no ambiente digital trouxe novos riscos à sua integridade. Pesquisa da SaferNet e da TIC Kids Online aponta que um em cada 11 jovens já foi vítima de cyberbullying, e mais de 53 mil denúncias de crimes sexuais on-line envolvendo infantojuvenis foram registradas em 2024. Além disso, 30% das crianças entrevistadas disseram ter interagido com desconhecidos pela internet, ampliando sua exposição a riscos.
Embora o Pequeno Príncipe ainda não tenha registrado atendimentos diretos por violência digital, a instituição reconhece a gravidade do cenário. Em 2025, a Campanha Pra Toda Vida incluirá, pela primeira vez, tópicos como cyberbullying, assédio on-line e exposição a conteúdos nocivos. A inclusão desses temas na campanha visa a garantir que a proteção integral de crianças e adolescentes também aborde o ambiente virtual,
Pra Toda Vida
O Hospital Pequeno Príncipe atua há mais de 50 anos no atendimento a vítimas de violência. A instituição tem uma equipe multiprofissional treinada para identificar, acolher e cuidar de crianças vítimas de violência, com o objetivo de mitigar danos imediatos e apoiar trajetórias de vida mais seguras. O protocolo de atendimento especializado inclui assistência médica, psicológica e social.
Desde 2006, desenvolve a Campanha Pra Toda Vida, cujo propósito é sensibilizar, informar e mobilizar a sociedade sobre a importância de prevenir e enfrentar a violência infantojuvenil. A campanha integra ações como a capacitação de profissionais de saúde e educação, bem como a disseminação de materiais educativos para crianças e adolescentes.
A iniciativa conta também com o apoio da sociedade, com a mobilização de influenciadores digitais, posts nas redes sociais e divulgação na imprensa. Informações e materiais de apoio podem ser acessados por meio do hotsite da campanha.
Como a sociedade pode contribuir
A proteção de crianças e adolescentes é uma responsabilidade coletiva. O Pequeno Príncipe acredita que a união de esforços entre indivíduos, organizações e poder público é fundamental para reduzir os casos de violência e transformar a vida daqueles que enfrentam situações de risco. Cada atitude conta para a construção de um ambiente mais seguro e acolhedor.
A denúncia – que pode ser feita, anonimamente, por vizinhos, familiares e conhecidos – pode ser a única chance de socorro. Os canais para denunciar são:
• Disque 100 (nacional)
• Disque 181 (Paraná)
Sinais de que uma criança está sendo vítima de violência podem ser físicos ou psicológicos, como mudanças bruscas de comportamento, irritabilidade, distúrbios alimentares e de sono, autolesões, queda no rendimento escolar e marcas físicas como hematomas, lesões e fraturas. No ambiente digital, comportamentos como isolamento após o uso de dispositivos ou exclusão repentina de contas podem indicar cyberbullying ou abuso virtual.