Os microempreendedores são coletes salva-vidas da economia brasileira, afirma especialista
Por: GIFE| Notícias| 23/08/2021Entre os anos de 2019 e 2020, o empreendedorismo sofreu uma redução de 7,1%. Esse resultado foi, principalmente, impactado pela retração na taxa de empreendedores estabelecidos, ou seja, aqueles envolvidos em negócios com mais de três anos e meio de existência. A segunda influência mais forte foi a de empreendedores novos, proprietários ou administradores de um negócio com, no mínimo, três meses de existência, que baixou em 2,4 pontos percentuais.
Essa análise integra o relatório Empreendedorismo no Brasil 2020, desenvolvido pelo Global Entrepreneurship Monitor (GEM). No Brasil, o estudo é coordenado pelo Instituto Brasileiro da Qualidade e Produtividade (IBQP) em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).
“O empreendedorismo no Brasil costuma dar uma fortalecida em tempos de crise. Só que a crise atual trouxe um outro adendo que impactou diretamente os negócios e eles tiveram que fechar as portas ou se reinventar. As desigualdades ficaram evidentes, a falta de acesso, de apoio e o fato de estarem já vulneráveis e não terem reservas econômicas para passar um tempo de crise”, analisa Lina Maria Useche Kempf, co-fundadora e CEO da Aliança Empreendedora.
Preparação
O grau de escolaridade da população brasileira que empreende é umas das características sociodemográficas analisadas pelo relatório do GEM. Nessa categoria, o estudo aponta para um elevado índice de pessoas que iniciaram um negócio e não têm nenhuma educação formal ou Ensino Fundamental incompleto. A elevação foi de 104% em 2020 na comparação com o ano anterior. Em contraponto, no ano passado, registrou-se uma diminuição de 32% em empreendedores com nível superior ou mais.
“É de extrema importância darmos o suporte de capacitação e trabalhar a resiliência desses microempreendedores brasileiros, que têm um impacto relevante na economia do país”, observa Lina, que costumava se referir aos empreendedores como os “colchões da economia”. “Depois da Covid-19, eles se tornaram o colete salva-vidas porque com todas as dificuldades, ajudaram muitas pessoas a não passarem fome”, observa.
Mulheres empreendedoras
O mesmo relatório aponta que a pandemia teve um impacto maior entre as empreendedoras, com forte fluxo de entrada e saída de mulheres. Em especial, com a entrada daquelas com menor escolaridade, nos estágios iniciais da atividade empreendedora, e a saída das com maior escolaridade nos estágios mais avançados.
Lina se entristece ao ver como a maior parte dos indicadores analisados pelo GEM mostra um impacto negativo quando o assunto é gênero. “Historicamente, as mulheres são maioria nos negócios iniciantes e minoria nos empreendimentos estabelecidos. Isso ocorre por toda a construção social que conhecemos, por elas terem que dar conta da casa, dos filhos e também do negócio, muitas vezes sozinhas.”
A CEO destaca ainda outros elementos que afetaram as empreendedoras e trouxeram mais sobrecarga às suas rotinas, como o fechamento de escolas e creches – tendo elas que trabalhar e cuidar dos filhos ao mesmo tempo -, além do aumento dos índices de violência doméstica no período pandêmico.
“Juntando esses fatores, o resultado não poderia ser diferente dessa discrepância tão grande entre o impacto que a Covid teve para os negócios dos homens e das mulheres”, analisa a especialista.
Para empreender melhor
O relatório do GEM analisa uma série de áreas sensíveis a intervenções voltadas a melhorar as condições para empreender no Brasil. Entre os 20 fatores listados por especialistas da área estão: políticas governamentais, educação e capacitação, apoio financeiro e pesquisa e desenvolvimento.
Ao discorrerem sobre esses aspectos, os analistas alertam para a necessidade de simplificação de todas as burocracias que envolvem abertura, operação e fechamento de empresas no Brasil. Em relação ao fortalecimento das condições para o pleno empreendimento feminino, o estudo aponta a necessidade de adoção de políticas públicas que apoiem as mulheres, como, por exemplo, voltadas à conciliação da maternidade com o negócio, e as relacionadas à disponibilidade de creches.
Nesse sentido, Lina observa o papel relevante que cumprem as organizações da sociedade civil e também as instituições privadas que apoiam o ecossistema microempreendedor no país. “Hoje, existem muitas políticas boas que não são entregues com qualidade ‘na ponta’ porque, às vezes, o Estado não dá conta”, observa. E para atenuar minimamente essa falta do Estado, as conexões e alianças entre o terceiro setor e a iniciativa privada para que boas políticas públicas cheguem ao seu público alvo são fundamentais.