Apesar do aumento de pessoas negras nas universidades, cenário ainda é de iniquidade
Por: GIFE| Notícias| 19/09/2022Foto: Felipe Gregate / Unplash
No Brasil, 18% dos jovens negros de 18 a 24 anos estão cursando uma universidade, segundo o estudo sobre ação afirmativa e população negra na educação superior, publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em 2020. Entre os jovens brancos o número sobe para 36%.
Além da Lei nº 12.711/2012, que reserva cotas para estudantes negros, oriundos de escola pública e renda de até 1,5 salário mínimo por pessoa, programas de acesso às universidades como ProUni e Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies), também foram responsáveis pelo crescimento no acesso ao ensino superior. No entanto, o Fies terminou o ano de 2021 com recorde de inadimplência. O saldo dos devedores chega a R$ 42,6 bilhões.
Já o levantamento realizado pelo site Quero Bolsa, com dados de 2010 a 2019, o número de estudantes negros no ensino superior cresceu quase 400%, totalizando 38,15% dos matriculados. No entanto, o percentual ainda está abaixo de sua representatividade no conjunto da população que alcança 56%.
Na Bahia, em 1992, foi criado o Instituto Steve Biko por iniciativa de professores e estudantes que construiram o primeiro curso Pré-Vestibular voltado para negros no Brasil. Juliana Marta, pedagoga e assistente social que estudou no Steve Biko e hoje é voluntária na instituição, lembra da importância do acesso à universidade para que haja mais diversidade e outras abordagens no campo da pesquisa.
“Com os 10 anos da política de cotas houve o avanço das pessoas negras nas universidades, mas é necessário ainda um processo de inclusão do perfil etnico racial autodeclarado. A população negra sempre foi alvo, mas agora é hora de sermos os pesquisadores através de perspectivas epistemológicas.”
De acordo com levantamento realizado pela Liga de Ciência Preta Brasileira, em 2020, dentre os alunos de pós-graduação, 2,7% são pretos, 12,7% são pardos, 2% são amarelos, menos de 0,5% é indígena e 82,7% são brancos. A análise foi realizada a partir de dados da Plataforma Lattes, serviço do CNPq que reúne informações curriculares, grupos de pesquisa e instituições das áreas de ciência e tecnologia.
Juliana Marta acredita que por meio de políticas públicas é possível potencializar o acesso de estudantes negros no campo da pesquisa.
A contribuição do Investimento Social Privado (ISP)
Diante dos desafios, o apoio institucional e de fomento à pesquisa, ensino e permanência dos estudantes pode ser uma alternativa para mudar o cenário de desigualdades. O gestor de Pesquisa Científica no Instituto Serrapilheira, Michel Chagas, explica que o Instituto foi criado para valorizar o conhecimento científico, sendo a primeira instituição privada, sem fins lucrativos, de fomento à ciência e à divulgação científica no Brasil.
“Queremos apoiar jovens cientistas de excelência do país, e acreditamos que ciência de excelência só se faz com pluralidade de pontos de vista. Por isso, desde a sua criação, em 2017, o instituto traz uma atenção especial à diversidade na ciência que, junto com a ciência aberta e reprodutível, compõem os nossos valores.”
Atualmente, o Instituto Serrapilheira está com inscrição aberta para apoio de 10 jovens cientistas em início de carreira, com verbas entre 200 mil reais e 700 mil reais. O edital permite que os selecionados possam contar com acréscimo de até 30% do valor do orçamento inicial para uso exclusivo na formação e integração de pessoas de grupos sub-representados em suas equipes.
Para Michel Chagas é necessário que haja um comprometimento do Estado e do setor privado para que aconteça uma mudança no cenário de desigualdade existente. Através de reserva de vagas, diversidade dos grupos de pesquisa, composição de bancas de avaliação com diversidade, orçamento e comprometimento institucional, o governo, suas agências, empresas e organizações sociais podem contribuir para o acesso e para a permanência de mais pessoas negras na pós-graduação e na pesquisa.