Plataforma mapeia conflitos fundiários e famílias em situação de despejo no Brasil

Por: GIFE| Notícias| 27/03/2023

Reintegração de posse de ocupação na zona leste da capital paulista. (Rovena Rosa/Agência Brasil)

Em fevereiro deste ano, foi lançado o Mapeamento Nacional de Conflitos pela Terra e Moradia. A plataforma, colaborativa, é uma realização da Campanha Despejo Zero e é motivada pela ausência de dados oficiais sobre o tema.

O mapeamento define conflito fundiário como a disputa pela posse de um imóvel, bem como o impacto de empreendimentos públicos e privados, envolvendo grupos sociais vulnerabilizados. Os conflitos fundiários resultam em despejos. Até o momento, foram contabilizadas mais de um milhão de pessoas impactadas . Destas, 66% são negras e 60% mulheres, mais de 180 mil crianças e mais de 180 mil pessoas idosas. São Paulo (SP) lidera o número de famílias ameaçadas e despejadas.

Érica Santiago é pesquisadora e estuda o espaço urbano em consonância com aspectos ambientais no Instituto Federal do Pará, e lembra que se trata de uma luta travada há décadas. “Tem crescido a preocupação em relação à temática. É preciso chamar atenção para a violação de direitos básicos como moradia, que é assegurado em nossa Constituição.”

A plataforma permite que qualquer pessoa denuncie um despejo ou ameaça de despejo a partir de um formulário. Em todo Brasil foram mapeados mais de 1.108 conflitos, com mais de 36 mil famílias despejadas e mais de 199 mil famílias ameaçadas de despejo. 

Yane Mendes é cineasta periférica, afrociberativista e vive na favela do Totó, em Recife (PE). A ativista trabalhou na mandata coletiva Juntas Codeputadas, em Pernambuco, foi quando acompanhou de perto ocupações e despejos.

“Nesses anos vi violência contra mulher, criança levada presa. Às vezes as ocupações são feitas em lugares inutilizados, ou que eram ponto de tráfico, e essa galera transforma em cozinha solidária, horta comunitária”, aponta. 

Erica Santiago acredita que a produção de dados se dá tanto para viabilizar a incidência política, quanto para fomentar diálogos embasados. “É importante que dados atualizados sejam visibilizados para que essas pessoas tenham seus direitos assegurados.” 

Por ser um trabalho colaborativo, os dados representam apenas uma parcela da realidade. Em alguns casos, estão disponíveis até o andamento dos processos judiciais. Em outros, apenas informações básicas como cidade e número de famílias.

“A falta de dados tem a ver com quem a gente coloca pra realizar esses dados”, defende Yane Mendes. Para ela, que já atuou como consultora em pesquisas, é preciso que haja participação do “público alvo” na construção, para garantir que as informações que o estudo precisa levantar, sejam compreendidas por aqueles que precisam responder.

“Estamos num país em que a gente luta pra se alimentar, pra ter uma casa, isso impossibilita que a gente fale de sonhos. Acreditar que conseguimos ter um Brasil que garante acesso à cidade parece utópico, mas não deveria”, finaliza a ativista.


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