Atualmente, o Brasil possui 2.712 municípios sem cobertura jornalística local, realidade que atinge mais de 26 milhões de brasileiros, fenômeno este chamado “deserto de notícias”. No entanto, apesar do quantitativo alarmante, nas regiões Norte e Nordeste o déficit de cobertura vem caindo. De acordo com dados da sexta edição do Atlas da Notícia, ambas regiões registraram aumento significativo no número de cidades que deixaram de ser desertos.

O Atlas da Notícia é um censo realizado pela Projor (Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo) para mapear o jornalismo local brasileiro. O estudo mostrou que houve uma redução de 8,6% no número de desertos de notícias no país, o que equivale a 256 municípios que passaram a ter cobertura jornalística local. De acordo com a pesquisadora regional do censo, Jéssica Botelho, a redução se deve a uma nova categoria considerada nos levantamentos do Atlas: as rádios comunitárias. Além disso, outro ponto que contribui são as iniciativas online. 

“A redução de desertos de notícias se deve muito a uma flexibilização do nosso critério em considerar rádio comunitária como veículo jornalístico. Isso acontecia porque, por lei, rádios comunitárias têm uma natureza vinculativa, ou seja, ela já nasce tendo um vínculo com alguma organização”, explica a pesquisadora sobre a mudança.

No entanto, através de estudos minuciosos foi sendo observado que esse tipo de veículo de comunicação muitas vezes desempenha papel jornalístico relevante em determinadas regiões. 

De acordo com o Atlas, o Norte apresentou uma redução de 30% no número de municípios que não tinham cobertura local, além disso, a região não registrou nenhum município que tenha se tornado vazio de notícias. O Nordeste registrou queda de 9% em comparação com o levantamento anterior. 

Para Marcos Tardin, jornalista e gerente-geral da Fundação Demócrito Rocha (FDR), o avanço é positivo. “É a primeira vez, desde o início do levantamento, em 2017, que o número de não desertos supera o de desertos de notícias. Esse é um sinalizador de que os veículos locais e profissionais de comunicação e jornalismo, tão impactados negativamente em sua sustentabilidade econômica pela internet, estão encontrando novas formas de cumprir seu valiosíssimo papel social.”

Cenário ainda é preocupante

Apesar da redução no número de desertos de notícia pelo país, especialmente no Norte e Nordeste, o cenário atual ainda causa preocupação devido ao número expressivo de municípios que ainda vivem a ausência de coberturas jornalísticas locais. No Nordeste, 56,74% dos municípios ainda são vazios noticiosos, maior proporção entre as regiões do Brasil, segundo o estudo. O censo mapeou 2.728 veículos jornalísticos atuantes no Nordeste e 11 que tiveram suas atividades encerradas. 

“Uma localidade classificada como deserto de notícias se torna mais vulnerável na sua cidadania de modo geral. Você tem ali uma população que está desatendida de informação acerca da política, cultura, educação”, alerta Jéssica Botelho.

Marcos Tardin concorda com a reflexão e enfatiza que uma cidade com deserto noticioso é um enfraquecimento da democracia. “Um deserto de notícias significa um município sem qualquer informação apurada e produzida por jornalistas sobre o próprio lugar. Significa menos transparência, menos crítica, menos informação, menos análise, menos denúncias de irregularidades e abusos.”

É preciso financiamento

O contexto abre o debate para a dificuldade dos veículos locais em obter recursos financeiros para arcar com despesas e se manter de pé em meio aos desafios que a prática jornalística exige. O investimento social privado e a filantropia podem desempenhar um papel importante para combater a problemática.

“Os mapeamentos realizados serviram para que financiadores conseguissem chegar a comunicadores e veículos jornalísticos locais, financiar projetos. A sustentabilidade financeira é um dos grandes desafios no jornalismo local”, finaliza Jéssica Botelho.