A exemplo internacional, organizações brasileiras criam Aliança pela Ação Climática

Por: GIFE| Notícias| 22/02/2021

Uma das primeiras ações de Joe Biden ao assumir a presidência dos Estados Unidos foi recolocar o país entre os signatários do Acordo de Paris, criado em 2015 com o objetivo de definir diretrizes para que as nações reduzam a emissão de gases de efeito estufa na atmosfera e, consequentemente, controlem o aumento da temperatura terrestre provocada pelo aquecimento global. 

A existência do Acordo e o compromisso de grandes potências mundiais para com o mesmo reafirma que o mundo precisa se unir e articular ações de combate às mudanças climáticas, em nível local e global. Uma iniciativa nessa direção é a recém-lançada Aliança pela Ação Climática (ACA Brasil), articulada por WWF Brasil, ICLEI América do Sul, Instituto Clima e Sociedade (iCS), CDP Latin America e Centro Brasil no Clima. 

Segundo Flávia Castelhano, coordenadora de relações institucionais e advocacy do ICLEI América do Sul, foi a própria saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris, decidida pelo ex-presidente Donald Trump, e a consequente criação do movimento We Are Still In (Nós ainda estamos dentro, em tradução livre), afirmando que empresas, estados, cidades e outros atores continuariam a seguir os compromissos do Acordo, que motivaram a criação de alianças pelo clima ao redor do mundo, inclusive no Brasil. 

Hoje, a aliança brasileira junta-se à Argentina (Alianza para la Acción Climática), Japão (Japan Climate Initiative), México (Alianza para la Acción Climática), África do Sul (Alliances for Climate Action), Estados Unidos (We Are Still In) e Vietnã (Viet Nam Coalition for Climate Action). 

O compromisso público pela redução de emissões 

A missão da ACA Brasil é mobilizar lideranças empresariais, investidores, autoridades locais e estaduais, acadêmicos, imprensa, entidades religiosas, organizações da sociedade civil e a juventude, de forma a conscientizar a todos sobre a importância da bandeira da Aliança pela Ação Climática, além de aumentar o movimento e melhorar a conexão entre iniciativas já existentes. 

Por conectar diversos atores em vários territórios, a própria ACA pode ser um espaço de identificação de oportunidades de colaboração para soluções de desafios, defende a coordenadora. “Quando colocamos representantes de governos municipais e estaduais, empresas, sociedade civil, investidores, academia, movimentos sociais sentados na mesma mesa, muitas ideias podem sair daí. Isso nos parece muito relevante nesse momento que vivemos, em que a pandemia vem apontar para a necessidade drástica que temos de identificar oportunidades para um novo paradigma econômico e social.” 

A ideia é que a articulação possa contribuir para redução concreta de emissões, limitando o aumento da temperatura da Terra a 1,5º C acima dos níveis pré-industriais. Isso significa reduzir pela metade as emissões até 2030 e atingir a neutralidade em carbono até 2050. 

“Apesar de o Brasil ser o sexto maior emissor do mundo, há um potencial enorme de promover ações que fortaleçam paradigmas de desenvolvimento de baixo carbono, resiliente e inclusivo, como energias renováveis, biotecnologia e agricultura de baixo carbono. A ACA Brasil se tornou uma possibilidade de evidenciar e aumentar a ação climática no país, contribuindo para a retomada do protagonismo brasileiro nessa agenda por meio de atores subnacionais e não-estatais”, explica Flávia.

Além dos nove membros em seu conselho consultivo, a ACA conta com o governo do estado do Espírito Santo e de Pernambuco como signatários, as prefeituras de Betim, Curitiba, Brasão de Contagem, Palmas, São José do Rio Preto e Serra Talhada, três empresas e três organizações da sociedade civil. 

Para Flávia, as cidades estão caminhando para um maior protagonismo e responsabilidade. “Recentemente, Recife assumiu o compromisso público de neutralizar as emissões. Entre os estados, São Paulo lançou o Acordo Ambiental de São Paulo, reunindo representantes do setor privado para propor compromissos credíveis rumo à redução de carbono. Os governadores dos estados amazônicos fortaleceram seu consórcio, o que pode ajudar na elaboração de políticas públicas que equilibram o desenvolvimento socioeconômico com a conservação e restauração naturais”, completa.  

Os efeitos do desmatamento  

Estudos apontam que, atualmente, um dos grandes inimigos da preservação é a atividade agropecuária que, juntamente com o desmatamento, é responsável por quase 72% das emissões de gases do efeito estufa no país. Vale ressaltar que, levando em consideração que todos os biomas do mundo estão interconectados, os efeitos do desmatamento na Amazônia são sentidos também em outras regiões, por afetar, por exemplo, o regime de chuvas. 

O Pantanal mato-grossense enfrentou grandes desafios em 2020, tanto por falta de chuvas, quanto pelas queimadas. De acordo com um levantamento do Instituto Centro de Vida (ICV), 33,1 mil focos de calor registrados no Mato Grosso em 2020 aconteceram de julho a setembro, período proibitivo de queimadas, o que equivale a 83% do total de registros do período. 

Mesmo frente à gravidade desse cenário, as características naturais do país, como o bom clima, a maior floresta tropical do planeta e outros biomas – que tornam o Brasil o país mais biodiverso do mundo – contribuem com a busca de soluções que conversam diretamente com a chamada ‘retomada verde’ a partir de agora e no período pós-pandemia. Flávia reforça, entretanto, que apenas a oferta de recursos naturais não será suficiente para mudar o cenário, sendo necessária a atuação do poder público, com decisões políticas e estratégicas, bem como do setor privado e a oferta ampla de recursos financeiros para transformar os meios e caminhos de produção no país, além de administrar e proteger os recursos naturais. 

Retomada verde e novo paradigma econômico e social 

O texto declaratório da ACA Brasil traz um trecho que reforça a visão de que, mais do que frear a mudança climática, deve-se trabalhar para a construção de um novo paradigma econômico e social, que promoverá a justiça climática, ambiental e o bem-estar da população. Flávia explica que esse movimento de mudança inclui ‘tropicalizar’ o debate sobre ação climática, isso é, entender como as ações discutidas em nível internacional podem ser adaptadas à realidade brasileira, respeitando as especificidades de cada território. 

A coordenadora também aponta que falar apenas em redução de emissões não basta, sendo necessário pensar também em como as mudanças climáticas afetam as populações, sobretudo aquelas em maior situação de vulnerabilidade. 

“Podemos pensar em como a promoção de sistemas de transporte de baixo carbono pode, além de reduzir emissões, contribuir para a mobilidade urbana das comunidades periféricas e promover a melhora da qualidade do ar, que a cada ano está relacionada à causa da morte de milhares de pessoas no Brasil. Ou como a promoção de áreas verdes urbanas pode compensar emissões de carbono e contribuir para o sistema de drenagem urbano, consequentemente reduzindo as enchentes, que prejudicam anualmente as comunidades urbanas mais vulneráveis em várias cidades do Brasil”, exemplifica. 

Conheça algumas ações 

Lançada em janeiro, a Aliança pela Ação Climática já deu início a algumas ações em direção à maior divulgação, interação e conexão dos brasileiros com a agenda do clima. Entre as iniciativas que já estão sendo realizadas ou previstas, estão: 

Mobilização de novos signatários de diversos setores;

– Contribuição para o caminho dos atores subnacionais e não-estatais brasileiros rumo à COP26;

– Continuidade da campanha de comunicação da ACA Brasil com objetivo de conectar o debate sobre mudança do clima com outros temas, como questões de raça, gênero, habitação, especificidades culturais regionais e territoriais;

– Identificar áreas temáticas de oportunidade para ação colaborativa entre os signatários da Aliança; 

– Promover espaços de troca entre os signatários da ACA Brasil com signatários de outras ACAs no mundo sobre experiências bem sucedidas; 

– Lançar um hub de informações, soluções e experiências para disponibilizar o aprendizado acumulado pelos membros;

– Ações de incidência junto aos poderes públicos, especialmente nos poderes Legislativo e Executivo, em busca do fortalecimento dos compromissos assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris.


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