Censo GIFE 2018 aponta mais diversidade, apoio a organizações do setor e avaliação
Por: GIFE| Notícias| 02/12/2019O GIFE acaba de lançar a nona edição do Censo GIFE. Considerada uma das principais pesquisas sobre o setor do investimento social privado (ISP) no Brasil, o estudo é produzido bianualmente desde 2001 e fornece informações sobre as principais características e tendências na prática dos investidores sociais privados brasileiros a partir de dados das instituições associadas ao GIFE.
A partir de um panorama sobre estrutura, formas de atuação e estratégias das empresas e dos institutos e fundações empresariais, familiares, independentes e comunitários que destinam recursos privados para projetos de finalidade pública, o Censo GIFE tem auxiliado as organizações em seus processos de tomada de decisão, fomentando o aprimoramento da atuação das instituições e apontando caminhos para o fortalecimento e a qualificação do campo no Brasil.
Entre as novidades da edição 2018 estão novas temáticas abordadas, como inovação, prevenção de risco e gestão de crise, atuação em rede, influência do ambiente de atuação nas estratégias das organizações, além do aprimoramento de perguntas sobre comunicação, avaliação e apoio a organizações da sociedade civil (OSCs) e financiamento a terceiros. Esta edição também trouxe novas formas de leitura e apresentação dos dados, em especial o acesso online aos conteúdos no Mosaico, que também foi lançado no evento.
Para José Marcelo Zacchi, secretário-geral do GIFE, o trabalho da instituição, incluindo a produção do Censo, dialoga com o esforço de fazer do GIFE um pólo de rede. “Uma rede que funciona como ambiente amplo de catalisação para o fortalecimento do campo da filantropia, do investimento social privado, do terceiro setor e da sociedade civil como um todo no país e que está a serviço desse ecossistema de forma ampla.”
O secretário lembrou que toda essa atuação depende de um ambiente sólido de liberdades e práticas democráticas. “Infelizmente, não dá para dizer que esses últimos anos, em particular este, tenham sido um período em que avançamos nessa dimensão. Dez dias após ser nomeada entre as 100 melhores ONGs do país, o Saúde e Alegria foi surpreendido por uma ação da polícia do Pará. Seria só um incidente, se pudéssemos dizer que é um caso isolado. Por isso, entendemos que seria oportuno fazer uma comunicação pública a respeito do episódio”, afirmou.
A nota à qual se refere o secretário, intitulada “2019, Cidadania e Estado de Direito”, está disponível no site do GIFE.
Achados
Durante o evento de lançamento da nova edição do Censo GIFE, Graziela Santiago, coordenadora de conhecimento do GIFE, repercutiu alguns dos achados do estudo, sobretudo aqueles que dialogam com as três dimensões de atuação do GIFE: expansão e diversificação, aprimoramento e qualificação e abrangência e efetividade do campo da filantropia e do investimento social privado.
Na primeira dimensão, destaca-se a ampliação da base da pesquisa para 133 respondentes, 17 a mais do que em 2016. Desse total, 52% são institutos e fundações empresariais, 22% familiares, 13% independentes e 13% empresas que, juntos, investiram 3,25 bilhões de reais em 2018.
Outro destaque da edição diz respeito ao aumento do investimento em projetos de terceiros, que passou de 21%, em 2016, para 35% do investimento total, em 2018, somando 1,1 bilhão de reais. Dessa forma, os investimentos em programas e ações próprias caíram de 60%, em 2016, para 50%, em 2018.
O dado ocasionou o crescimento do número de organizações com perfil essencialmente financiador, que passou de 16%, em 2016, para 23%, em 2018. 40% dos respondentes se caracterizam como essencialmente executores e 38% possuem perfil híbrido.
Na frente de aprimoramento e qualificação, o Censo aponta para o aumento da diversidade nos conselhos das instituições. O número de organizações que possuem mulheres em seus conselhos passou de 79%, em 2016, para 88%, em 2018, assim como as organizações com conselheiros não brancos nessa instância são 42%, em 2018, contra 29%, em 2016. Vale ressaltar, no entanto, que, ainda assim, mulheres e negros seguem sub-representados nesses espaços.
O número de organizações que avaliam algum de seus projetos ou programas passou de 53%, em 2016, para 83%, em 2018. 82% das organizações afirmam adotar práticas inovadoras e 40% atuam com negócios de impacto.
Na frente de abrangência e efetividade, educação segue sendo a principal área de atuação do ISP (80%), sendo crianças e adolescentes seu principal perfil de público. A pesquisa aponta baixo foco em perfis por gênero e raça e concentração dos projetos ainda na região Sudeste.
O contexto ao qual José Marcelo se referiu anteriormente mostra ainda mais a importância de termos dados, pesquisas, publicações e informação para conseguirmos nos contrapor. Nesse sentido, o Censo ganha ainda mais relevância”, observou Graziela.
Mosaico e Fundo BIS
O lançamento da nova edição da pesquisa também foi oportunidade para o lançamento do Mosaico – Portal de Dados do Investimento Social, que se pretende como um hub de informações sobre o ISP e as OSCs com o objetivo de oferecer uma experiência dinâmica de acesso a conhecimento que possibilite gerar e adensar reflexões e análises sobre estratégias, forma de atuação e estrutura do investimento social no país e que contribua com os processos de tomada de decisão dos investidores sociais e o estabelecimento de parcerias e iniciativas de coinvestimento.
Carolina Magosso, analista de conhecimento do GIFE, apresentou a plataforma que reúne informações do Censo GIFE, além de uma base de cerca de 600 projetos e programas das organizações que podem ser pesquisados por nome, localização geográfica, áreas temáticas e público beneficiário.
Um diretório de pesquisa reúne uma seleção de plataformas, pesquisas e publicações que congregam dados sobre atuação, recursos e estrutura do campo do investimento social, da filantropia e das organizações da sociedade civil.
O evento marcou ainda o lançamento da segunda edição do Edital do Fundo BIS, do edital da Programação Aberta do Congresso GIFE e de uma nova chamada de artigos GIFE, apresentados por Gustavo Bernardino, gerente de programas do GIFE.
Debate: fronteiras e desafios
Após os lançamentos, um painel reuniu representantes do setor para um debate sobre “Fronteiras e Desafios da Filantropia e do Investimento Social no Brasil”, tema que dá continuidade ao debate iniciado na 1ª Mostra GIFE de Inovação Social e culminará na 11ª edição do Congresso GIFE, em 2020.
O tema da diversidade foi um dos destacados pelos debatedores. Para Ana Valéria Araújo, superintendente do Fundo Brasil de Direitos Humanos, empoderar cada vez mais organizações que atuam na pauta da diversidade é o maior desafio do setor.
“O Fundo Brasil parte da premissa que uma sociedade civil organizada forte é fundamental para a democracia. Nós não consolidamos e garantimos direitos sem isso. O ISP tem um enorme potencial para apoiar as organizações que estão na ponta fazendo esse trabalho. E o GIFE vem discutindo isso com o debate sobre grantmaking como parte dessa responsabilidade.”
Rodrigo Pipponzi, vice-presidente do Instituto ACP e fundador da Editora Mol, enfatizou a relevância do trabalho das organizações da sociedade civil e chamou atenção para a visibilidade desse trabalho para o fortalecimento do campo.
“Acredito na transparência como ferramenta para eliminar a desconfiança. Temos que cada vez mais contar as histórias de impacto que está sendo gerado na ponta. Isso é o que vai permitir mais parcerias e mais pessoas contribuindo com a cultura de doação. É um trabalho de formiguinha, mas que pode nos fazer avançar.”
Branca Vianna Moreira Salles, fundadora do Instituto Serrapilheira – primeiro instituto privado de apoio à ciência –, compartilhou com a instituição atua no tema por meio de seu edital.
“De modo geral e no mundo todo, a ciência é basicamente branca e masculina e de classe média. Os obstáculos são enormes porque a ideia de meritocracia é muito arraigada na comunidade científica”, observou.
Frente a esses desafios, a instituição criou alguns mecanismos para oferecer aos grantees a oportunidade de diversificar seus grupos de pesquisa. Um deles foi vincular parte do recurso à diversificação e formação de cientistas negros. Para as mulheres, o Instituto criou mecanismos como acréscimo de anos à carreira de cientistas com filhos, além de bolsas para aquelas que tenham filho durante a vigência do apoio. A instituição também produziu um guia de boas práticas voltado à comunidade científica para maior diversificação de seus grupos de pesquisa.
O papel das empresas também ocupou lugar central nos debates. Para Denise Hills, diretora global de Sustentabilidade da Natura, o mundo atual exige das empresas que sejam cada vez mais uma alternativa nas diferentes dimensões dessa diversidade.
“Não será mais possível aquele modelo cujo único objetivo é o lucro. Essa foi uma distração temporária. O objetivo sempre foi o de resolver problemas da sociedade, por isso chama-se licença social para operar, e isso não mudou. Nós temos visto cada vez mais um consumo ativista. Essa experiência de olhar a responsabilidade ou a oportunidade do impacto como indicador de sucesso é relativamente nova, mas já é uma realidade, de consumidor a investidor, passando por stakeholder e colaborador.”