Grupo de discussão debate incentivo à doação
Por: GIFE| Notícias| 08/12/2017No dia 05 de dezembro, o Instituto Votorantim recebeu o quinto encontro do Grupo de Discussão do Projeto Sustentabilidade Econômica das Organizações da Sociedade Civil (OSCs). Último do ano, o debate, que tratou sobre incentivo à doação de pessoa física, foi liderado por José Marcelo Zacchi, secretário-geral do GIFE, Aline Viotto, coordenadora do projeto, e contou com a participação de representantes de diversas organizações.
“Para a União Europeia (UE), a aprovação e continuidade deste projeto é uma satisfação muito grande. Como responsável pela linha temática, fico feliz em poder acompanhar os resultados e ver o esforço de todas as organizações envolvidas para a construção de um ambiente favorável para a sustentabilidade das OSCs”, declarou Denise Verdade, assessora de Projetos da Delegação da UE no Brasil, logo no início do encontro.
O debate foi dividido em três momentos: no primeiro, Aline Viotto recuperou as temáticas e encaminhamentos dos encontros anteriores (Apresentação do projeto, Fundos Patrimoniais e ITCMD), apresentou a forma como são regulados os incentivos à doação e um panorama sobre as proposições legislativas tem tramitação no Congresso Nacional sobre o tema; em seguida, o debate foi aberto para o grupo; já no terceiro, houve a deliberação da agenda de ação para 2018.
Entraves identificados
Segundo Aline, atualmente existe uma segmentação dos incentivos fiscais por temas e projetos específicos, o que se reflete na criação do Fundo Nacional do Idoso, Fundo para a Infância e Adolescência, Lei Rouanet, Lei do Audiovisual, Lei de Incentivo ao Esporte, Programa Nacional de Apoio à Atenção Oncológica (PRONON) e Programa Nacional de Apoio à Atenção da Saúde da Pessoa com Deficiência (PRONAS/PCD).
Porém, apesar de a legislação prever a dedução de impostos, há uma disparidade entre os procedimentos e regras de doações de Pessoas Físicas (PF) e Jurídicas (PJ). Se por um lado, a Lei 13.019/14 (Marco Regulatório das OSCS – MROSC) permite que pessoas jurídicas doem diretamente às OSCs, até o limite de 2% da receita bruta da empresa, por outro, a mesma lógica não se estende às doações de pessoas físicas. Somada a isso, está a necessidade da PF preencher o Imposto de Renda (IR) de forma completa.
“Existem 36 projetos de leis referentes aos incentivos fiscais de PFs em tramitação no Congresso Nacional. Porém, o denominador comum entre eles resulta em um cenário complexo: tendência à segmentação por temas, que exclui boa parte das OSCs que atuam em áreas distintas, como meio ambiente, direitos humanos, segurança pública etc; a lógica de doação por projeto, que inviabiliza qualquer estratégia de desenvolvimento institucional das organizações no longo prazo e de forma permanente; e a burocratização dos processos de doação para PF, o que desincentiva a cultura de doação no Brasil”, explica Aline.
Zacchi complementa: “A perspectiva setorial continua muito enraizada, não sendo um tema em debate nas tramitações. A ideia de um incentivo horizontal é nula. Precisamos construir uma agenda que incida politicamente sobre isso e abarque a diversidade e riqueza temática trabalhada pelas OSCs; estender os procedimentos aplicados para as PJs para as PFs, a fim de impulsionar o crescimento do número de doadores; e entender se há margem para propor a não necessidade de preenchimento do IR completo”.
Para Raquel Altemani, coordenadora de planejamento do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS), muitas pessoas questionam e desconfiam da origem e real utilização de suas doações por parte das OSCs. “Existem casos de PFs que fazem a doação de forma correta, declaram em seus IRs, mas quando a receita federal faz o cruzamento, caem na malha fina, porque a própria organização receptora não fez a prestação de forma devida”, explica.
“É preciso criar incentivos compartilhados, contrapartidas e criar conexões com os doadores. Devemos trabalhar mais na lógica do ‘Eu te peço, mas estou junto com você’. Só assim teremos a confiança do potencial doador. Se não fizermos isso, ele só vai doar para a creche da esquina, porque ele conhece as pessoas que trabalham ali e sabe que sua doação vai realmente virar leite para as crianças, por exemplo”, analisa Selma Moreira, diretora executiva do Fundo Baobá de Direitos Humanos.
Caminhos possíveis para uma agenda de ação compartilhada
João Paulo Vergueiro, diretor executivo da Associação Brasileira de Captação de Recursos (ABCR) defende a estratégia de se criar uma proposta mais ampla para o setor, que desenvolva uma estrutura de incentivo fiscal que permita e facilite que todos doem. “Não podemos nos esquecer do tempo político de 2018. Se criarmos um projeto de lei, será um momento em que teremos a oportunidade de sermos mais ouvidos pela sociedade civil, imprensa e candidatos, numa situação em que podemos inclusive começar a encaminhar propostas do que as OSCs defendem para ITCMD e incentivos fiscais”.
Em concordância, Eduardo Pannunzio, pesquisador da FGV Direito SP, reafirma a necessidade da definição de uma política de incentivos fiscais no Brasil. “Precisamos pensar em incentivos mais horizontais e universais possíveis. E lembrar que, assim como existe a iniquidade da lei com as organizações – restringindo às doações às áreas temáticas -, esta iniquidade se replica com os doadores. Hoje, somente os indivíduos mais ricos podem se beneficiar dos incentivos fiscais. Precisamos criar um sistema que, em princípio, qualquer indivíduo que tenha imposto a recolher possa ser beneficiado. Precisamos, dessa forma, garantir a universalidade de acesso aos incentivos fiscais, não só das organizações, mas também dos doadores”.
Laís de Figueirêdo Lopes, advogada e ex-assessora especial do Ministro da Secretaria de Governo da Presidência da República, responsável pela agenda do MROSC no governo federal de 2011 a 2016, é incisiva: “Trabalhamos quase sempre no nível das emergências, mas temos poucas propostas estruturantes. Ao meu ver, mais do que um projeto de lei, precisamos construir uma visão estruturante e compartilhada, da qual irão derivar as estratégias. Defendo também a construção de um alicerce constitucional, via projeto de emenda constitucional (PEC). Precisamos garantir que o Estado fomente o setor, assim como se dá em Portugal, por exemplo”.
Próximos passos
Diante dos desafios levantados nos encontros do grupo de discussão ao longo do ano, surgiu a proposta de definir os pontos mínimos de consenso que apontem caminhos possíveis para a construção de uma agenda compartilhada de incidência política nos assuntos abordados pelo projeto Sustentabilidade Econômica das OSCs. Parte desses encaminhamentos fundamentais foram debatidos neste último encontro, como, por exemplo:
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Comunicação e conhecimento
Construir uma comunicação de fácil entendimento, com o objetivo de ampliar o entendimento sobre os temas e reforçar o compromisso com transparência e confiança; em paralelo, gerar conhecimento e apresentar os resultados das pesquisas sobre doações, ITCMD e MROSC, realizadas em parceria com o CJPJA da FGV Direito SP.
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Articulação
Articular o grupo de discussão, visando a participação de outras OSCs.
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Encontros
Fortalecer os espaços de debate e construção de pautas e ações de incidência nos temas, como foco no cenário político das eleições 2018. Criar grupos de trabalho responsáveis pela retomada dos debates e proposição de estratégias de cada um dos temas (fundos patrimoniais, ITCMD e incentivos à doação), que poderão ser apresentados no Congresso GIFE, em abril, e no Seminário Internacional do projeto, previsto para novembro de 2018.
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Agenda compartilhada
Conectar o debate da sustentabilidade econômica com agenda mais ampla de fortalecimento das OSCs.
Durante a reunião do grupo de discussão, foi apresentada ainda a ideia de realização de um evento específico sobre fundos patrimoniais, previsto para 27 de fevereiro, em São Paulo (mais informações serão publicadas nas próximas edições deste boletim).
O projeto Sustentabilidade Econômica das Organizações da Sociedade Civil é realizado pelo GIFE e pela Coordenadoria de Pesquisa Jurídica Aplicada (CPJA) da FGV Direito São Paulo, em parceria com o Instituto de Pesquisas Aplicadas (IPEA) e com apoio da União Europeia, Instituto C&A, Instituto Arapyaú e Fundação Lemann.