Livro Fortalecimento dos Povos e Organizações Indígenas é lançado em Brasília

Por: GIFE| Notícias| 30/04/2019

O ambiente jurídico e as especificidades dos povos e organizações indígenas, especialmente em temas como liberdade associativa, tributação e parcerias com o poder público, são abordados pelo livro Fortalecimento dos Povos e das Organizações Indígenas, lançado no dia 23/04 em Brasília. A publicação foi lançada no momento em que várias organizações estavam presentes na capital do país no Acampamento Terra Livre.

O lançamento integrou seminário Povos Indígenas e Conjunturas Atuais, promovido pela Coordenadoria de Pesquisa Jurídica Aplicada (CPJA) da FGV Direito SP e o escritório Dora, Azambuja e Oliveira, e proporcionou o debate do tema com lideranças indígenas.

Organizado pelo advogado Paulo Celso de Oliveira Pankararu, o livro reúne artigos elaborados por lideranças indígenas e pesquisadores, e é resultado de dois encontros sobre o tema promovidos pela CPJA, pelo escritório Dora, Azambuja e Oliveira e pelo Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE) no âmbito do projeto Sustentabilidade Econômica das Organizações da Sociedade Civil (Sustenta OSC), com apoio da União Europeia, do escritório brasileiro da Fundação Ford e outras instituições.

O evento se iniciou com um debate sobre conjunturas atuais, com a presença das lideranças indígenas Telma Taurepang (União as Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira – UMIAB), Angela Amanakwa Kaxuyana (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Paulo Tupiniquim (Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME), Marciano Rodrigues (Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul), Eliésio Marubo (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari – UNIVAJA) Eder Alcântara Oliveira (Coordenação do Conselho Terena).

O organizador da publicação, Paulo Celso de Oliveira Pankararu, abriu os trabalhos afirmando a importância da iniciativa para subsidiar as grandes lutas dos povos indígenas: “O contexto não é nada fácil para os nossos povos. Mas são lutas que vêm de muito tempo, direitos que foram conquistados por outras gerações, e com certeza vamos seguir lutando para que não tenhamos retrocessos”.

Angela Amanakwa Kaxuyna, Coordenadora Tesoureira da COIAB, apontou a importância do registro da visão dos povos indígenas sobre seus direitos: “Com esse olhar jurídico, com a participação de advogados indígenas, que têm toda a propriedade para retratar aquilo pelo que de fato lutamos, para que nossos direitos sejam defendidos. Faz toda uma diferença quando se tem um advogado indígena participando do processo, principalmente de registro e de retratar o que a gente vem sofrendo nas nossas comunidades, nos nossos territórios”.

A integrante da COIAB, que participou dos encontros realizados em 2017 que deram origem ao livro, lembra que naquele ano as lideranças indígenas já se preocupavam com a ameaça de ataques aos direitos, e que no momento atual essas ameaças estão se concretizando. “A gente vem sofrendo há 519 anos com tudo isso. Não estamos com medo. Mas a diferença é que hoje esse ataque está institucionalizado. Os nossos direitos não foram dados, mas conquistados, inclusive com o sangue de muitos dos nossos líderes”.

Para Eliésio Marubo, Diretor da Diretoria Jurídica da UNIVAJA, o livro, além de trazer uma reflexão do que já se passou, promove um pensar sobre os desafios que se tem pela frente a partir de uma análise da atual conjuntura. “Nessa sociedade, a gente participa com as regras que já foram colocadas pelo constituinte originário. Ainda não consegui compreender, nesse momento atual, qual a visão que o governo tem da gente enquanto coletivo. Porque, ao que me consta, nós somos cidadãos brasileiros, gozamos de todos os direitos e prerrogativas de qualquer cidadão brasileiro. E aqui, junto com uma fundação de destaque no mundo jurídico, que é a Fundação Getúlio Vargas, nada mais oportuno do que a gente refletir sobre os nossos direitos, e sobre como a gente vai se posicionar”.  

Denise Dora, do Escritório Dora, Azambuja e Oliveira – Advocacia de Direitos Humanos, destacou o contexto brasileiro em que, apesar de ser garantida a liberdade de associação, essa garantia implica em dominar um conjunto de códigos que não são apenas as leis, mas também os costumes cartoriais do país, as pequenas regras que envolvem essa dinâmica, e que complexificam muito esse processo para as organizações da sociedade civil, e ainda mais para as organizações indígenas.

“A reflexão que nos trouxe até esse livro é exatamente pensar que a Constituição Federal, nos seus artigos 231 e 232, estabelece outro paradigma ao afirmar que há garantia de reconhecimento dos direitos dos povos indígenas desde sua organização social. As organizações indígenas precisam seguir as regras do Código Civil? Os conselhos de povos indígenas precisam ter CNPJ? Como isso envolve a relação com o Estado, em convênios e parcerias? Estas são questões que só são possíveis de estarem colocadas porque há uma nova geração de advogados indígenas lendo as leis com outras lentes. E o livro tenta representar um pouco esse debate, ” avalia Denise.

Em texto integrante do livro, Paulo Celso de Oliveira Pankararu afirma que “Assim como é de competência dos estados e municípios atuarem sobre assuntos locais em cooperação com a União, é plausível que as políticas públicas sejam orientadas por uma relação de cooperação entre o poder público e os povos indígenas, respeitando sua autonomia para decidirem sobre seus assuntos internos e locais. O fortalecimento das organizações indígenas também é necessário para garantir que elas possam atuar em defesa dos direitos e interesses dos povos indígenas, pautando os temas indígenas na agenda das políticas públicas e o protagonismo indígena nas relações com o poder público e a sociedade civil”.

Livro já está disponível para download

Fortalecimento dos Povos e das Organizações Indígenas é o resultado de dois encontros sobre o tema que dá título à obra, promovidos pela Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV Direito SP) e pelo escritório Dora, Azambuja e Oliveira – Advocacia de Direito Humanos. Voltados ao aprofundamento das reflexões sobre questões indígenas diante da atual conjuntura e ambiente jurídico, os artigos da publicação abordam, entre outros assuntos relevantes, liberdade associativa, tributação e parcerias com o poder público.

Os encontros aconteceram no âmbito no âmbito do Projeto Sustentabilidade Econômica das Organizações da Sociedade Civil, realizado pelo GIFE e pela Coordenadoria de Pesquisa Jurídica Aplicada (CPJA) da FGV Direito São Paulo, em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e com apoio da União Europeia, Instituto C&A, ICE, Instituto Arapyaú e Fundação Lemann. Os evento contaram também com apoio da Ford Foundation (escritório brasileiro).

Oscar Vilhena, Diretor da Escola de Direito da FGV, aponta que o caminho a ser trilhado para ampliar a resiliência da sociedade civil passa por um debate com os povos indígenas: “Se não conseguirmos avançar na reafirmação dos direitos desses povos, não conseguiremos chegar à solução de outras questões estruturantes em nosso país.Temos que incorporar a tecnologia social indígena, que tão habilmente articula múltiplos ordenamentos jurídicos dentro de uma mesma base, em nossa sociedade.Tecnologia esta que não se pode, em nome de uma ideia equivocada de soberania estatal, lateralizar”, avalia, no prefácio do livro.

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