Comunicação como estratégia para mobilização e impacto e lançamento da rede Narrativas marcam Congresso GIFE

Por: GIFE| Notícias| 09/04/2018

 

Sociedade hiperconectada, pluralidade de vozes, diversidade de diálogos, proliferação de canais. O mundo moderno mostra que a tarefa da comunicação se vê em um campo extraordinário a ser explorado e, ao mesmo tempo, frente a desafios complexos, em constante mutação, cotidianamente. No campo social, é por meio da comunicação que as agendas se concretizam, que as causas se manifestam e que as pessoas se sensibilizam e se engajam em movimentos para gerar conhecimento e mudanças sociais concretas.

Olhando para esse oceano de desafios e possibilidades, durante o X Congresso GIFE, foi realizado o lançamento de uma iniciativa que busca conectar comunicadores e profissionais interessados na área em uma rede comprometida em trocar experiências e gerar reflexões sobre o campo.

Batizada de Rede Narrativas, o grupo se propõe a ampliar mudanças a partir da comunicação. Mariana Moraes, gerente de Comunicação do GIFE, aposta na ideia. “A comunicação é área-chave para a transformação social. No entanto, muitas das organizações da sociedade civil ainda não pensam nesse trabalho de forma estratégica. Os próprios dados do Censo GIFE mostram que quase a totalidade dos associados vêem valor na comunicação, mas, quando vamos para pontos específicos, percebemos que o entendimento ainda é superficial. Acreditamos que existe um enorme potencial para fortalecermos a área no campo. Esperamos que a rede contribua com isso.”

Carolina Pasquali, diretora de Comunicação do Alana e uma das participantes da rede, complementou destacando a importância das organizações amplificarem suas vozes no Brasil atual. “Precisávamos criar um espaço no país onde pudéssemos encontrar os casos de sucesso e de insucesso, as informações, os dados estatísticos. É nesse lugar que nasce a Narrativas. Além dos objetivos de gerar conhecimento e trocar experiências, pensamos em como podemos atuar juntos. Quem sabe, no futuro, possamos promover ações conjuntas. Olhando para o Brasil atual, precisamos falar, precisamos nos posicionar como setor”.

O Narrativas já reúne nove instituições – Instituto Ayrton Senna, Instituto C&A, Mc&Pop Comunicação, Alana, GIFE, Instituto Unibanco, Fundo Brasil de Direitos Humanos, Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal e agência Cause – e pretende, a partir do Congresso, abrir espaço e incentivar a participação de qualquer profissional de comunicação interessado em fazer parte de uma rede de comunicadores que atua pelo interesse público.

Após o lançamento da Rede, o painel seguiu com um bate-papo, reunindo duas grandes forças do audiovisual: a Maria Farinha Filmes, produtora brasileira e referência no campo social nacional, e a Participant Media, produtora de grandes filmes baseada em Los Angeles (EUA), com produções que buscam contar histórias inspiradoras de pessoas e organizações comprometidas com transformações sociais – entre os diversos filmes já produzidos estão ‘Uma verdade inconveniente’ (2006), ‘Spotlight’ (2015) e ‘Histórias Cruzadas’ (2011). Os filmes da empresa já receberam 52 indicações ao Oscar e tiveram 12 vitórias.

Luana Lobo, sócia-diretora da Flow e da Maria Farinha Filmes, celebrou o lançamento da Rede Narrativas e apontou o quanto a iniciativa pode contribuir para que novas histórias sejam contadas. “Que passo bonito de ver acontecendo no Brasil. Olhando para as pessoas que estão aqui na sala hoje, vemos quem são os verdadeiros changemakers. Nós, na Flow e Maria Farinha Filmes, só contamos essas histórias. Fico imaginando a quantidade de informações, de dados, de conhecimento, que é possível colher nessa Rede.”

Gabriel Brakin, conselheiro geral e vice-presidente de negócios da Participant Media, contou que, por mais que a empresa tenha um compromisso social, quem merece ser celebrado, são as milhares de pessoas que estão em campo, tentando atuar contra injustiças e construir um mundo mais sustentável.

“Nascemos com o sonho de transformar o mundo em um lugar melhor. Esse é propósito de nosso fundador, Jeffrey Skoll. Sabemos a força que audiovisual tem como importante ferramenta de transformação social. Somos contadores de histórias, não estamos no front da atuação social, é preciso deixar isso claro. Somos parceiros de quem está no campo atuando em questões sociais urgentes. Sabemos que não somos as pessoas que promovem a transformação social, mas podemos ajudar a canalizar a mensagem de quem está fazendo isso.”

Gabriel contou que, ao assumir um projeto, um ponto decisório é como essa empreitada pode canalizar esforços multissetoriais para alavancar mudanças sociais. Ciente da potência das produções audiovisuais, ele se refere à contribuição social que a indústria do entretenimento pode oferecer ao mundo. Um dos casos exemplares neste sentido foi o filme chileno “Uma mulher fantástica”, vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2018. A produção gerou um debate global sobre a valorização de atores e atrizes trans – a protagonista do filme, Daniela Veja, é transexual.

Em meio à articulação durante o trabalho de produção, a Participant Media atuou diretamente com o governo chileno cobrando uma agenda concreta para a questão da inclusão e garantia de direitos de pessoas trans no país. “Essa é nossa contribuição: usar nossa força para endereçar mudanças benéficas para a sociedade”, concluiu.

Para marcar o início das atividades da Rede, o Narrativas preparou uma programação especial no Congresso, com três outros debates. Confira:

Comunicação e ação

A mesa ‘Desafios da mobilização: como transformar comunicação em ações concretas’ reuniu três cases que tiveram sucesso na busca por destaque em meio ao acelerado fluxo de informações na conjuntura atual. O objetivo da atividade foi colocar em discussão como transformar o maior interesse por causas em ações concretas, canalizando esse movimento em mudanças efetivas por meio de uma comunicação mobilizadora. A partir de campanhas e usando a comunicação de causas como ferramenta, como levar indivíduos e sociedade a diferentes estágios de engajamento, tornando-os agentes de mudança?

Para Anna Livia Arida, fundadora e ex-diretora da rede Minha Sampa, “mobilizar é conseguir unir cabeça, coração e mãos”. Ela elencou três componentes principais para o sucesso de uma comunicação mobilizadora. “1) Responsabilidade: se a gente não se sente responsável, é difícil se mobilizar; 2) Direito: se eu não sinto que a cidade é meu direito, não me mobilizo; e 3) Chance de vitória: é muito difícil romper nossa inércia se sentimos que a causa é perdida”. Ela revelou ainda os quatro pontos essenciais para estruturar uma estratégia de comunicação mobilizadora: Objetivo, Alvo, Público e Táticas.

A ativista ilustrou sua contribuição ao debate com um case de comunicação mobilizadora realizado pelo Minha Sampa em 2016: a campanha por ‘Delegacias de Defesa da Mulher 24 horas’. “Nós ouvimos dados chocantes sobre assédio e machismo. Ao buscar mais informações, descobrimos que havia uma norma que determinava que as delegacias deveriam funcionar 24 horas, mas, na prática, elas estavam abertas apenas em horário comercial. Então, decidimos que este seria o nosso objetivo. O alvo, neste caso, eram o governador e o secretário de Segurança Pública do estado de São Paulo. Nosso público, pessoas, redes e organizações interessadas na causa que pudessem se tornar nossos parceiros na campanha”, explicou.

Anna Livia elencou as táticas utilizadas na estratégia neste caso. Primeiro fizeram uma petição pública. Em seguida, organizou-se um “recadaço” no Facebook do governador. Sem resposta, partiu-se para a estratégia dos telefonemas para o gabinete do secretário, um “telefonaço”. E por fim, um pequeno ato na Av. Paulista com oito mulheres voluntárias vestidas de preto usando maquiagem que representavam marcas de agressão levando placas com dizeres como “Se o Estado não nos atende, o Estado nos agride”.

A manifestação ganhou muita repercussão na mídia e o governador anunciou naquele mesmo dia a criação da primeira delegacia 24 horas. “A Minha Sampa catalisa desejos que estão na sociedade. O desafio de encontrar uma causa engajadora é entender as particularidades das pessoas, é saber e respeitar que nem todos vão se engajar em todas as causas. Acreditamos na atuação em rede com todos aqueles que podem amplificar nossa mensagem. Se pedimos coisas simples às pessoas, conseguimos mobilizar para transformar desejo em realidade”, defendeu.

Ana Maria Melo, fundadora do movimento Põe no Rótulo, contou como um grupo de mães de filhos alérgicos conseguiu fazer a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aprovar uma norma que obriga as indústrias a deixarem claro nos rótulos dos produtos alimentícios os ingredientes contidos em cada um deles. “Minha história é uma história sobre minha vida e a de mais seis famílias, uma história sobre como comer com segurança e como criar um filho com segurança. Quando aquele que deveria ser o melhor alimento do mundo faz mal ao seu filho, isso dói muito”, lamentou.

A ativista contou como sete mães de áreas profissionais e cidades distintas se encontraram em um grupo no Facebook de mães de filhos alérgicos e envolveram pais, amigos e familiares em uma causa. Empatia é a palavra que define o que essas mães estavam vivendo naquele momento. “A base da mobilização é empatia e diálogo, algo muito desafiador porque requer escuta e sensibilidade. E é muito difícil se colocar tendo stakeholders que querem exatamente o oposto de você”, lembrou.

Ana afirmou que o grupo trabalhou com comunicação desde o primeiro momento. Em três dias de campanha na internet, elas conseguiram 5 mil likes. “Ficou claro para nós o poder do que tínhamos nas mãos e que a ANVISA era o órgão que poderia mudar isso”, contou. O movimento começou a participar da discussão de rotulagem de alimentos e definiu uma estratégia de atuação que pudesse influenciar o contexto do tomador de decisão. “Eu queria que todos os diretores da ANVISA vissem os alérgicos em todos os espaços possíveis, influenciando seu contexto.”

Os caminhos percorridos pelo grupo foram trabalho de incidência na mídia, produção de cartilhas informativas sobre convivência com alergias, relacionamento com celebridades para ampliação da campanha e acompanhamento dos processos judiciário e junto à ANVISA, que contemplou consulta e audiências públicas. Após a aprovação da lei em Brasília, elas passaram a trabalhar para evitar a prorrogação da implementação da nova lei por parte do órgão, além de uma etapa de fiscalização e denúncia das incorreções dos rótulos. “A causa é maior e de longo prazo, mas a comunicação tem que ter um objetivo direto e requer resultado em curto prazo. Seguir com foco e disciplina é falar de resiliência, é algo que nunca acaba e você precisa estar sempre vigilante”, acredita.

Outro case apresentado foi a campanha “Carne ao Molho Madeira”, do Greenpeace, que busca acabar com o desmatamento da Amazônia causado pela pecuária por meio do compromisso das redes varejistas com uma cadeia sustentável. “Continuamos sem o direito de saber de onde vem e o que tem nos nossos alimentos. A maior parte da carne que compramos, nem rótulo tem, que dirá informações como origem, desmatamento, trabalho escravo, impacto aos povos indígenas, entre outras violações de direitos. Essa conta não fecha tanto do ponto de vista ambiental como de saúde”, afirmou Adriana Charoux, campaigner da organização.

Adriana contou que a estratégia da campanha, que acontece desde 2009, era incomodar quem de fato poderia tomar decisão em relação à compra da carne, ou seja, quem sustenta a cadeia de produção como ela é. “Essa campanha já se estende há dez anos e já perdemos uma área correspondente a dois estados de São Paulo nesse tempo. A pecuária tem responsabilidade por um desmatamento brutal, entre 60 e 80%. Se pensarmos que só a JBS abate 40 mil bois por dia, sem falar em outras proteínas”, denunciou.

As três maiores redes varejistas do país responderam um questionário e o lanterna do ranking construído pelo Greenpeace foi o Pão de Açúcar com pouca ou nenhuma política de responsabilidade sobre a cadeia. Sem resposta, a instituição implementou uma ação direta nas lojas da rede com ativistas trajando fantasias de vaca dialogando com os cidadãos que circulavam pelo entorno das unidades e com a colagem de etiquetas nas embalagens de carne dos supermercados que denunciavam a relação do produto com o desmatamento.

Sem resultado concreto, aconteceu ainda uma nova mobilização em escala chamada “encheção de SAC”, que culminou no lançamento de uma política clara e pública por parte do Pão de Açúcar, o que levou as duas outras redes, Carrefour e Walmart, a seguirem o exemplo. “Não é todo dia que a gente consegue com que três das maiores redes varejistas do país se posicionem em resposta a uma campanha de mobilização. O Greenpeace tem um trabalho de monitoramento contínuo destas e outras empresas e pega no pé. Isso dá um muito trabalho e é pouco sexy contar, mas é fundamental. Nenhum twitt ou estratégia online vai potencializar tanto uma comunicação quanto uma ação presencial, isso está claro para o Greenpeace há muito tempo”, concluiu.

Audiovisual e transformação

Para compor a mesa ‘Por que apostar no audiovisual para provocar transformação?’, estavam presentes Carolina Pasquali, diretora de comunicação do Alana; Ana Carolina Vidal, analista de comunicação da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal (FMCSV); Tiago Borba, gerente de planejamento e articulação institucional do Instituto Unibanco; e Mariana Moraes, gerente de comunicação do GIFE.

Como mediadora do debate, Mariana deu início à discussão expressando uma vontade comum a muitas pessoas de estimular a produção audiovisual e provar que não é preciso um grande orçamento, por exemplo, para gerar transformações.

Para exemplificar a discussão, foram apresentados dois cases. Um deles é o documentário “Nunca me sonharam”. A parceria entre o Instituto Unibanco e a produtora Maria Farinha Filmes resultou em um longa metragem que, como Tiago citou, é uma ode à escola pública, com todas as suas discrepâncias. Especialistas, pesquisadores, gestores públicos, professores e estudantes contam como é a realidade do Ensino Médio em escolas públicas de dez estados do Brasil.

A produção já alcançou números surpreendentes: enquanto que um documentário é visto em média por três mil pessoas no Brasil, o “Nunca me sonharam” contabiliza mais de 290 mil espectadores em oito países em pouco mais de um ano de exibição. “A ideia era colocar a educação na mesa de jantar da população brasileira, para que o tema pudesse ser discutido de forma mais ampla”, explicou Tiago.

Ana Carolina Vidal, por sua vez, explicou um pouco mais sobre o filme “O Começo da Vida”, produzido pela FMCSV, em parceria com a Maria Farinha Filmes e com o Alana. Filmado em nove países a partir de entrevistas com 170 especialistas e famílias e mais de 400 horas de filmagem, o documentário nasceu com a missão de comunicar sobre a causa da primeira infância e, para isso, a estratégia escolhida foi sensibilizar em primeiro lugar para depois mobilizar, de forma que as pessoas entendessem a importância dessa fase da vida e, a partir disso, tivessem alguma ação.

Depois de mais de seis milhões de espectadores, número que continua crescendo, a analista de comunicação compartilhou com o público o aprendizado intitulado “movimento”, que é a junção de: um conteúdo que sensibiliza pessoas; parcerias, como a do UNICEF, que usou o filme como ferramenta de advocacy e levou a produção para diversos países; e ferramentas de disseminação.

Como o objetivo do documentário era atingir o maior número de pessoas, o filme foi disponibilizado na Netflix, veiculado no GNT, em redes de maternidades e consultórios, em pílulas em redes sociais e também no Videocamp, plataforma que disponibiliza, de forma gratuita, filmes com proposta de transformação social.

O Videocamp foi o gancho para a fala de Carolina Pasquali, que explicou como a plataforma tornou-se uma poderosa ferramenta de disseminação de conteúdos audiovisuais. O portal, que é gratuito tanto para produtores que disponibilizam seus filmes quanto para quem solicita uma exibição coletiva das obras, é uma alternativa às estratégias mais tradicionais de divulgação, como o cinema, já que as salas de projeção não alcançam todo o território nacional. Hoje, o Videocamp já chegou em 95 países.

Além disso, Carolina ressaltou o potencial dos filmes de serem usados como ferramenta de advocacy, mesmo movimento feito pelo UNICEF com o documentário do Instituto Unibanco, como por exemplo, uma exibição do filme para 120 prefeitos do Ceará se sensibilizarem com questões relacionadas à infância.

No momento aberto à discussão, Mariana levantou a questão de como é possível unir o rigor científico dos temas juntamente com produções que consigam mobilizar o imaginário e despertar o interesse pelo assunto. Ao final do debate, os participantes refletiram sobre o fato do audiovisual ser uma ferramenta muito efetiva para passar diferentes mensagens a uma multiplicidade de pessoas, com histórias de vida diversas.

“Eu acho que quando paramos para pensar nas coisas que de fato transformamos nas nossas vidas e quando conseguimos entender realidades diferentes das nossas, sempre tem um audiovisual envolvido”, ressaltou Carolina.

Fake news

A mesa “Mídia, fake news e os riscos à democracia”, reuniu a pesquisadora Ana Freitas, da Diretoria de Análise de Políticas Públicas (DAPP) da Fundação Getúlio Vargas (FGV) do Rio de Janeiro, e o jornalista e doutor em Ciência Política Leonardo Sakamoto, diretor da ONG Repórter Brasil, para debater os desafios postos à democracia brasileira frente às estratégias de desinformação que contemplam as chamadas fake news e o uso de robôs em redes sociais. Estes fenômenos marcam a dinâmica da comunicação brasileira em um momento de crise política distorcendo a verdade, manipulando a opinião pública e empobrecendo o debate, o que coloca em risco a construção de políticas públicas e a defesa de direitos.

Pedro Telles, da Omidyar Network, mediador do debate, abriu a mesa pontuando algumas preocupações em relação ao tema: a desinformação que pode manipular a democracia e como isso pode ruir com a confiança da população. “Em um mundo onde dominam as fake news, as pessoas deixam de acreditar na realidade”, salientou. Pedro pontuou ainda o desequilíbrio entre o poder dos atores envolvidos na questão. “Há atores com interesses privados bem poderosos discutindo isso e é muito mais fraco o lado da sociedade civil, dos movimentos, organizações não-governamentais  etc.”. Ele lembrou ainda que o campo da ciência sobre estes fenômenos é ainda bastante novo e incipiente.

Leonardo Sakamoto abriu sua fala com uma experiência pessoal com as fake news. Ele contou que já foi xingado, cuspido e até perseguido no supermercado devido a mentiras a seu respeito disseminadas na Internet. Após um ano de investigação judicial, descobriu que o frigorífico Friboi estava por trás do investimento na disseminação das informações falsas, o que ele entende que se deve ao fato de ser coordenador de uma organização especializada em direitos trabalhistas e socioambientais, rastrear cadeias produtivas de trabalho escravo, analisar impactos ambientais da pecuária bovina etc.

Para ele, o problema das fake news, no entanto, é pequeno em comparação a um sistema maior ligado à desinformação, manipulação e hiperpartidarização. “Informação não é vista como subsídio para construção de significados coletivos, mas para instrumento e armamento de batalha. Não adianta a gente controlar as fake news se a população está se matando do ponto de vista simbólico em que o ódio diz mais alto que qualquer coisa. A gente tem que atacar não só a consequência, mas a causa. Reduzir a ultrapolarização da sociedade, melhorar e ampliar os espaços de desenvolvimento de empatia, aumentar a pluralidade nas timelines, alfabetizar para a mídia e ampliar os núcleos e os projetos que amplificam o diálogo entre os mais jovens. Essa é a única saída possível respeitando a democracia”, opinou.

Ana Freitas relatou sobre os estudos promovidos pelo DAPP – como o “Robôs, redes sociais e política no Brasil” – a partir da preocupação com o fenômeno da desinformação. Ela revelou que foi possível observar uma interferência ilegítima de perfis e contas automatizadas que estavam manipulando e inflando o debate ou criando tópicos que não eram espontâneos da sociedade.

A observação se deu a partir de estudos de caso das Eleições de 2014, das Eleições municipais de São Paulo de 2016, da votação da Reforma Trabalhista, da Greve Geral e da votação do impeachment. Em todos os casos, foram encontrados em torno de 10 a 20% de interferência de robôs. “Para nós, é importante ter uma noção mais acadêmica do que foi gerado e do foi comprado para ser gerado nas redes porque a gente sabe que se o robô maximiza a informação, gera trade topics ou cria tópicos que não estariam sendo debatidos e se isso se associa a fake news tem um potencial danoso gigantesco contra a lisura dos processos”, observou.

Ana mencionou o caso recente da execução da vereadora carioca Marielle Franco que teve vasta influência de fake news. Ela revelou que nos quatro primeiro dias após a execução, foi possível monitorar mais de dois milhões de menções ao caso só no Twitter. Para efeito comparativo, no dia da votação do impeachment, foram 1,5 milhão. Foram mais de um milhão de menções nas primeiras 40 horas após a execução e 5% delas impulsionadas por robôs. Pela primeira vez, no entanto, observou-se que o número de menções desmentindo as fake news foi maior do que a propagação das mesmas.

Para a pesquisadora, o caso Marielle pode ensinar muitas coisas para as instituições que defendem direitos. “Especialmente que quando você lida com valores transversais, você mobiliza. E também que é importante atuar nas redes sociais e que essa ação deve ser de formação de rede e de conquista de confiança, pois isso garante que quando a organização é atacada, essa rede reaja junto com ela”, disse.

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