Organizações de mulheres que atuam na ponta enfrentam dificuldades para se manter

Por: GIFE| Notícias| 06/03/2023

A próxima quarta-feira (8) marca o Dia Internacional das Mulheres. No Brasil, existem diversas organizações que se articulam para incidir politicamente sobre os direitos das mulheres. No entanto, de acordo com o Censo GIFE 2020, apenas 9% dos respondentes afirmaram desenvolver ações diretamente relacionadas à temática.

O número é baixo, e essas organizações são as grandes impactadas. Entre as principais dificuldades relatadas estão a concentração regional de recursos e a ausência de financiamento para fortalecimento institucional

É o caso do Instituto da Mulher Negra do Piauí – Ayabás. Para se manter, a organização concorre a pequenos editais. “Quando não conseguimos, a gente se cotiza entre si para realizar atividades nas periferias”, conta Halda Regina, integrante do Instituto que luta para ter uma sede própria e conseguiu criar este ano um grupo para captação de recursos. 

“É preciso aprimorar uma visão descolonizada no ISP”

Para Daniela Grelin, diretora executiva do Instituto Avon, “muitas vezes o investidor esquece que é necessária uma organização social para colocar um projeto em prática e que essa instituição também precisa de recursos”. 

Um caminho, aponta, são projetos plurianuais, que permitam à proponente ter tempo para realizar ações, colher resultados, além de prever parte do valor investido para custear o sustento da organização. O Instituto tem 20 anos de atuação e já investiu R$ 180 milhões de reais em mais de 400 projetos.

Rosana Fernandes é gerente executiva do Fundo Agbara, primeiro fundo de mulheres negras do Brasil, e observa que muitos investidores têm um olhar discriminatório para instituições comunitárias. 

Para ela, “é preciso aprimorar uma visão descolonizada no campo do ISP. Investir em um projeto, e não na instituição, combate um contexto social momentâneo, mas sem pensar a longo prazo”.

“A população feminina não é priorizada no ISP”

Diante dos números do Censo GIFE, é preciso traçar estratégias para ampliar o grau de atuação. “Esses percentuais deixam claro que a população feminina não é priorizada no ISP”, constata Daniela Grelin. “Quando se prioriza áreas que beneficiam as mulheres apenas indiretamente, não se contempla as causas que permitem a esse público viver livre de violência e com saúde.”

Para Rosana Fernandes, o quadro atual é reflexo de uma sociedade capitalista, “que age em reação a pautas que estão promovendo debate e podem gerar retorno”. Por isso, afirma, as pautas relacionadas às mulheres normalmente têm atenção restrita a períodos como o Dia Internacional das Mulheres e da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha.

“As iniquidades em relação às mulheres, feminicídios, diferença salarial, falta de oportunidades acontecem diariamente”, ressalta. 

46% das OSCs brasileiras têm baixa participação de mulheres na liderança

De acordo com pesquisa realizada pela Gema – Consultoria em Equidade e Instituto Matizes, “Governança inclusive no terceiro setor: gênero e raça nas OSCs”, 40% das OSCs brasileiras são compostas por mulheres. No entanto, 46% têm uma participação de mulheres na liderança abaixo da média.

Para Daniela Grelin, quando uma mulher ocupa um espaço de poder, ela tem muito mais condições de tomar decisões que afetam outras mulheres positivamente. “No setor privado é possível trabalhar esses temas primeiramente de dentro para fora, inicialmente em menor escala, para, depois, expandir os projetos externamente.” 

Halda Regina concorda. A ativista já foi coordenadora estadual de política para as mulheres no Piauí. No cargo, tentou dialogar com representantes políticos para que fosse disponibilizada verba para as entidades de mulheres negras da região, sem sucesso. 

“Nós que estamos na comunidade podemos fazer isso e trazer a demanda para o Estado. Se tiInvestimento e mobilização popular fazem a diferença para a garantia dos direitos das mulheres no Brasilvermos orçamento. As mulheres negras têm capacidade intelectual para gerenciar muito bem seus orçamentos e fazer um trabalho exitoso”, completa.


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