Organizações lançam plataforma para incentivar contratação de refugiados no Brasil

Por: GIFE| Notícias| 10/06/2019

O mundo está testemunhando os maiores níveis de deslocamento já registrados. Dados divulgados recentemente pela Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) revelam que o número de refugiados cresceu mais de 50% nos últimos 10 anos: já são 25,4 milhões em todo o mundo.

Esse cenário tem mobilizado os setores público e privado, organizações da sociedade civil, organismos multilaterais e entidades da cooperação internacional a buscarem soluções para o acolhimento desses cidadãos no país.

O projeto “O que o Investimento Social Privado pode fazer por?”, do GIFE, que visa promover o engajamento dos atores do campo em temas centrais para a agenda pública brasileira e a agenda de desenvolvimento sustentável contemporânea, é uma dessas iniciativas. No último trimestre do ano será lançado o guia “Migrações e refugiados” que apresentará um panorama sobre o assunto.

Outra inciativa é a Empresas com Refugiados, plataforma cujo objetivo é incentivar a integração de refugiados ao mercado de trabalho brasileiro por meio de boas práticas.

A plataforma é fruto da terceira edição do projeto Empoderando Refugiadas – iniciativa anual da ACNUR, Rede Brasil do Pacto Global e ONU Mulheres –, que promove a capacitação e o acesso de mulheres ao trabalho no Brasil, além da sensibilização das empresas e organizações para contratação. A quarta edição do projeto será lançada em breve. O intuito da plataforma Empresas com Refugiados é levar as lições aprendidas e metodologias utilizadas no projeto a outras empresas.

Vanessa Tarantini, assistente de soluções duradouras da ACNUR, explica que a mobilização das empresas em torno do projeto mostrou um interesse pelo tema e apoio não só via contratação, mas também em áreas como educação e empreendedorismo. “Começamos a coletar boas práticas e entendemos que a plataforma seria uma ferramenta para divulgar essas ações e, assim, motivar novas empresas a atuarem na causa. É uma forma de reconhecer as empresas que já promovem iniciativas nesse sentido e incentivar outras a se engajarem.”

Carlo Pereira, secretário-executivo da Rede Brasil do Pacto Global, conta que a ideia é aproximar quem precisa encontrar uma vaga de trabalho das pessoas que recrutam. “Entendemos que a criação de uma plataforma online poderia ajudar nesse processo, ampliando o alcance, já que o Empoderando Refugiadas acontece em São Paulo e a plataforma pode ser utilizada por empresas de todo o país.”

O secretário explica que as histórias reunidas na plataforma mostram os benefícios em ter uma pessoa em situação de refúgio atuando nas empresas e também reforçam que não é uma prática limitada às grandes organizações. “Pode contar com a participação de pequenas e médias empresas também. Além disso, a plataforma indica as organizações que fazem encaminhamentos para vagas de trabalho no Brasil todo, além de conteúdos que informam sobre o processo de contratação. Queremos que os bons exemplos de quem está contratando estimulem outras empresas”, ressalta.

Assessoria jurídica

O escritório de advocacia Mattos Filho, representado no lançamento da plataforma, em abril, por Bianca dos Santos Waks, advogada coordenadora de pro bono, oferece atendimento jurídico gratuito a pessoas em situação de refúgio, assim como a outros grupos em situação de vulnerabilidade.

Ao longo dos últimos três anos, o Mattos Filho dedicou mais de 1.700 horas a casos envolvendo refugiados e solicitantes de refúgio. Em parceria com organizações como Cáritas e Missão Paz – instituições reconhecidas pelo trabalho que realizam no acolhimento e proteção de refugiados –, o escritório tem trabalhado para expandir sua atuação pro bono a pessoas físicas.

“Há uma assimetria no acesso à Justiça no Brasil, tanto para brasileiros quanto para migrantes e refugiados, e a forma que encontramos de endereçar isso foi apoiar organizações da sociedade civil que atuam no tema e atender pessoas físicas em situação de vulnerabilidade que, ao chegar ao país, necessitam de apoio jurídico e não têm condições financeiras para contratar advogado”, afirma.

Expectativas

Vanessa explica que a expectativa em torno da ferramenta é aumentar o número de boas práticas e nacionalizar a plataforma, que hoje está bastante concentrada em iniciativas na cidade de São Paulo.

Carlos, por sua vez, afirma que não há uma meta específica, mas a expectativa da Rede Brasil para o Pacto Global é envolver toda sua rede, composta por mais de 800 empresas e organizações. “Desde o lançamento da plataforma, há dois meses, já recebemos diversos contatos de empresas que querem atuar mais no tema. Temos um trabalho de engajamento voltado ao Grupo Temático de Direitos Humanos, composto por mais de 100 empresas e organizações. Além disso, planejamos realizar lançamentos regionais da plataforma, fomentando a temática em outros estados do país. O primeiro será em Curitiba, no início de julho”, informa o secretário.

Para Bianca, o setor privado tem grande contribuição a oferecer, tanto nas ações emergenciais que viabilizam o acolhimento de refugiados, quanto por meio de ações e projetos mais estruturantes, que possibilitem que os refugiados possam viver uma vida digna no país.

“As empresas que fazem parte da plataforma estão dando uma contribuição relevante ao mostrar às demais que é possível contribuir de variadas formas com o tema. No caso do Mattos Filho, nossa principal contribuição se dá por meio de assessoria jurídica, que é o nosso core business. Acredito que, além de emprego, as empresas poderiam oferecer algo que está intimamente ligado à sua área de atuação, além de possibilitar que a pessoa refugiada tenha contato e possa se integrar à cultura brasileira, com mais oportunidades para aprender o português e desenvolver uma rede de relacionamentos profissionais e afetivos, que são essenciais para a integração à vida em outro país.”

O papel do poder público

Para a advogada, terceiro setor e poder público têm papéis e funções complementares em relação a esse e outros campos da agenda social. “Especificamente em relação a refugiados e imigrantes, organizações como Cáritas e Missão Paz são referência com um trabalho interdisciplinar que combina atendimento socioassistencial, psicológico e jurídico. O poder público, por sua vez, deve desenvolver políticas públicas que também reflitam essas necessidades e deem concretude aos compromissos assumidos pelo Brasil no plano internacional”, afirma.

A advogada menciona a nova lei da migração (Lei nº 13.445, de 24 de maio de 2017), que estabelece princípios e diretrizes para as políticas públicas para o emigrante. “Trata-se de uma conquista recente que normatiza as obrigações do poder público nesse campo”, observa.

Para Carlos, o setor público também pode contribuir desenvolvendo ações voltadas à ampliação dos programas direcionados à empregabilidade de pessoas em situação de refúgio.

Migrações, Refúgio e Apatridia – Guia para Comunicadores

Entender as migrações é uma das formas de compreender o mundo a partir de elementos humanos e das interações que essa mobilidade possibilita. Os meios de comunicação são espaços de grande importância para dar visibilidade às virtudes e desafios gerados por esse agente de tanta importância no contexto social.

Pensando nisso, no início de maio, Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH), MigraMundo e FICAS, com apoio de Fundação Avina e ACNUR, lançaram Migrações, Refúgio e Apatridia – Guia para Comunicadores, cujo objetivo é apoiar profissionais de comunicação com definições, referências do setor e indicações de boas práticas para um melhor entendimento do tema.

O material reúne recomendações para abordagens empáticas e comprometidas com fatos, um glossário com termos relacionados ao assunto, uma seção de organismos internacionais e instituições de referência, além de iniciativas inovadoras que ajudam a quebrar estereótipos sobre migrantes e refugiados no Brasil como sugestão de pauta e fontes para as reportagens, que vão desde documentos e leis até publicações e canais de comunicação.

“Acredito que promover maior conhecimento sobre a realidade do refúgio e seus impactos no Brasil e no mundo é importante para o incentivo às empresas no que se refere à contratação de pessoas refugiadas”, afirma Bianca.


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