Plataforma por um Novo Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil debate desafios e futuro

Por: GIFE| Notícias| 09/11/2017

Com o objetivo de ressignificar os objetivos da Plataforma e redesenhar a estratégia de atuação política e institucional na busca da sustentabilidade das Organizações da Sociedade Civil (OSCs), foi realizado em São Paulo, no fim de outubro, o V Encontro Nacional da Plataforma por um Novo Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil.

O evento, que contou com a presença de 53 organizações e universidades de todas as regiões do Brasil, foi organizado pela Secretaria Executiva e pelo Comitê Facilitador da Plataforma MROSC e teve o apoio da União Europeia (UE) e do Fundo Nacional de Solidariedade/CNBB.

Durante o Encontro, o GIFE foi convidado a integrar a Secretaria Executiva da Plataforma, juntamente com Abong e Caritas.

Além da mudança na composição da Secretaria Executiva, um ponto importante na atuação da Plataforma diz respeito à sua governança. O Comitê Facilitador passará a ser mais amplo, composto por representantes regionais, com objetivo de ter uma governança mais local.

A Plataforma MROSC surgiu em 2010 com uma agenda composta por 3 eixos: a contratualização (formalização de parcerias com o Poder Público), a certificação e a sustentabilidade econômica. Entre 2011 e 2015, a Plataforma teve fundamental importância na construção de um processo de interlocução positiva e sistemática junto ao governo federal.

Durante este período, foram conquistados avanços importantes em relação ao eixo da contratualização, como a aprovação da Lei federal nº 13.019/2014, que regula parcerias e repasse de recursos entre a União Federal, Estados, Municípios e as OSCs. No âmbito federal, a lei foi regulamentada pelo decreto federal (8.726/2016). Atualmente, Estados e Municípios estão também elaborando regulamentações próprias (saiba mais aqui).

No IV Encontro Nacional da Plataforma, (veja matéria completa a respeito), realizado em agosto de 2016, as propostas estabelecidas na ocasião diziam respeito a uma forte atuação em relação à sustentabilidade econômica das OSCs. Porém, grande parte das ações planejadas não conseguiram avançar diante da conjuntura política, social e econômica do país. À medida que o setor público não tem recursos disponíveis, as organizações que contratualizam com os governos são também impactadas.

Para Eleutéria Amora da Silva, diretora-executiva da Abong, “Enquanto OSCs, devemos trabalhar naquilo que nos une, de forma a fiscalizar o trabalho dos poderes públicos. Não podemos nos deixar paralisar por conta da conjuntura atual. Precisamos tomar decisões. Há um desafio imenso atual da sustentabilidade das OSCs. Assim, precisamos olhar os projetos de lei vigentes, verificar o que o Congresso está votando e nos posicionar”.

Denise Verdade, representante da União Europeia (UE), participou do evento e destacou a importância do V Encontro Nacional da Plataforma MROSC na atual conjuntura social e política, reforçando também o convite a todas as organizações representadas no evento para o desenvolvimento de projetos no âmbito dos editais da UE. 

O futuro da Plataforma: caminhos possíveis e dilemas de governança

“Com muito esforço, mobilização e debate, conseguimos aglutinar um amplo espectro de organizações diferentes entre si, em torno de um objetivo comum. A trajetória da Plataforma desembocou na aprovação da Lei 13.019 (MROSC).  Porém, o ambiente que permitiu essa construção não existe mais. Pelo contrário: temos uma situação hostil, que se reflete na desconstrução prática do que existia antes. Temos uma composição nacional que dificulta a atuação da frente parlamentar em defesa das OSCs. Vivemos um momento de não abertura para o diálogo”, analisou Silvio Rocha Sant’Ana, presidente da Fundação Esquel.

José Marcelo Zacchi, secretário-geral do GIFE, ponderou ser impossível debater qualquer caminho futuro sem revisitar a história dos últimos 30 anos. “Estamos em um momento de placas tectônicas se refazendo. Em um momento em que a sociedade se aparta da cidadania e o poder se encastela, se bestializa. Mais do que dizer o que vai acontecer nos próximos anos, precisamos pensar como este grande ciclo está terminando e como estamos nos posicionando diante disso”.

Segundo Zacchi, a sociedade precisa retomar o ambiente democrático, colocando o bem comum e o pluralismo em perspectiva. “Ao meu ver, temos duas posições de contenção e de criar caminhos: defender uma agenda pluralista e revigorar o ambiente de ação cidadã e vida democrática do país, a partir de mecanismos que garantam a autonomia. Como qualificar e revigorar esse ambiente da sociedade civil e da atuação? Como avançar e revigorar a pauta de fortalecimento da sociedade civil no país? Que atores precisam ser envolvidos? Qual é a agenda? Precisamos ampliar a cultura de doação e de recursos privados para as OSCs também”.

Os participantes do encontro se dividiram em grupos de trabalho para identificar forças, oportunidades, fraquezas e ameaças à atuação da Plataforma nos próximos anos.

Dentre as forças, destacaram-se legitimidade e articulação com diversidade; capacidade de resistência e proposição com criatividades; compromisso político com a agenda. Entre as fraquezas, foram apontadas fragilidade institucional da maioria das OSCs; dificuldade para operacionalizar, de maneira conjunta, a pauta principal; demandas maiores do que a capacidade operacional.

Os desafios diagnosticados foram criminalização burocrática das OSCs; desmonte da Constituição com redução de direitos e cortes orçamentários que afetam o financiamento das OSCs; dificuldade de entendimento da gestão pública sobre o campo das OSCs e a implementação da lei. Quanto às oportunidades, foram apontadas a existência da Lei 13.019 e de seus instrumentos que fortalecem as OSCs; a existência de experiências exitosas de processos de implementação da lei; a possibilidade de obter recursos com a própria sociedade civil; e a pauta legislativa de reformas em curso e as eleições 2018.

Laís de Figueiredo Lopes, advogada e ex-assessora especial do Ministro da Secretaria de Governo da Presidência da República (2011 a 2016), apontou que o MROSC é uma agenda política, que não se restringe à lei 13.019. Destacou ainda a importância da criação dos Conselhos Estaduais de Fomento e Colaboração (CONFOCO) para a construção das políticas públicas de fomento e colaboração, citando o caso de Minas Gerais, onde houve a criação de uma gerência de parceria para apoio das OSCs. O caso da Bahia, primeiro estado a constituir o CONFOCO, mereceu também destaque durante o evento.

“O MROSC de fato não se resume a Lei 13.019, ele vai além. Devemos nos perguntar (1) como podemos intensificar o processo de mobilização dentro dessa conjuntura; (2) como recuperar os demais pontos propostos pela plataforma para transcender a contratualização; (3) como estruturar a ação de tal maneira para viabilizar o trabalho da plataforma em rede; (4) como aumentar a capilaridade da discussão e incorporar outras organizações, a fim de garantir o crescimento político da plataforma e das OSCS, e lastrear um novo fôlego; (5) por fim, como criar musculatura política, criando núcleos multiplicadores e garantindo a instituição do CONFOCO”, diz Silvio Rocha Sant’Ana.

Fernando Zamban, coordenador da Caritas Brasileira, levantou um ponto importante de atenção: “Aliado aos diversos desafios já apontados, temos as regulamentações de estados e municípios. Apesar de reconhecermos o papel de capacitação do Estado, precisamos, enquanto plataforma e organizações da sociedade civil, estar presentes para minimizar os impactos e danos causados pela má interpretação da legislação”.

Do ponto de vista da agenda da plataforma, Eleutéria, da Abong, concluiu: “Vários canais de articulação que as OSCs tinham se perderam e, com isso, o trabalho acaba sendo muito individualizado. Precisamos mudar isso. Precisamos reavaliar e reafirmar o papel da Plataforma para que ela seja essa voz ativa na sociedade, de puxar as discussões e intervenções, de propor audiências públicas, de falar com a imprensa. Temos que trabalhar em rede e a Plataforma é um destes canais”.

“Acredito que o maior desafio seja a própria agenda das OSCs. Com esse cenário de crise, prescindimos de uma maior coesão. Dessa forma, a articulação nacional e regional da plataforma se torna prioritária para a sobrevivência financeira e política das organizações”, complementou Zamban.

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