Investidores sociais do Interior Paulista debatem monitoramento e avaliação

Por: GIFE| Notícias| 05/02/2018

 

Na última quinta-feira, dia 1º de fevereiro, o Instituto 3M ficou responsável por receber a terceira reunião da Rede de Investidores Sociais (RIS) do Interior Paulista. Criado em agosto de 2017, o grupo tem como objetivo sistematizar e criar um espaço de discussão sobre temas em comum para as empresas, institutos e fundações que atuam na região.

A reunião foi dividida em dois momentos. Na primeira parte, foi realizada a apresentação institucional de três organizações integrantes da Rede: o Instituto 3M, a Fundação Romi e a Fundação FEAC. Além desses, também estavam presentes representantes da Fundação Roberto Marinho, Fundação Educar DPaschoal, Instituto C&A, Phomenta, MATERA Systems, Instituto Estre e HZK Marketing.

Monitoramento e avaliação

A segunda parte do encontro foi destinada à apresentações e debates sobre o tema “Monitoramento e Avaliação”, definido na reunião anterior do grupo. João Martinho, especialista em avaliação no Instituto C&A, e Monica Pinto, gerente de desenvolvimento institucional da Fundação Roberto Marinho e membro do Conselho de Governança do GIFE, ficaram responsáveis por expor suas experiências sobre o assunto.

João Martinho começou sua exposição apresentando a diferença entre monitoramento e avaliação. Segundo o especialista, apesar de ser comum ouvir falar dos dois juntos, o monitoramento serve para responder a perguntas como “o que está acontecendo”. Já a avaliação tem outro tipo de olhar, direcionado a responder “o que, como e por que funciona ou não”. “A avaliação tem um caráter de aprender. Não serve somente para avaliar o que é bom e o que é ruim, mas também o que podemos fazer com isso”.  

Em seguida, para explicar porque o monitoramento nem sempre é suficiente, João Martinho usou o exemplo de Kiribati, uma ilha do Oceano Pacífico, cuja população trabalhava em quase sua totalidade com pesca e agricultura de cocos. Com a queda drástica do número de peixes, a solução encontrada foi oferecer incentivos para a cultura de cocos. “Do ponto de vista de monitoramento, foi ótimo, pois tudo o que se propuseram a fazer foi bem feito. Mas a população de peixes continuou caindo. Isso aconteceu por três motivos, entre eles está a pesca como atividade de lazer dos habitantes”.

Para finalizar, Martinho usou outro exemplo prático para argumentar porque a avaliação de impacto nem sempre é a solução. Depois de um surto de malária na ilha de Bornéu, na Indonésia, a Organização Mundial da Saúde utilizou um spray, como um dedetizador, para matar os mosquitos. Esse objetivo foi atingido, e nenhum novo caso foi registrado. Entretanto, essa ação também impactou outros animais do ambiente, como vespas, lagartas, lagartixas e gatos, o que desequilibrou a cadeia alimentar e trouxe outras consequências. “Se fizéssemos uma avaliação de impacto, veríamos que tinha um problema, esperávamos um resultado e atingimos essa meta. Mas, a avaliação de impacto nem sempre é suficiente, pois ela não conseguiu entender quais outros problemas não esperados poderiam acontecer”.

Na sequência, foi a vez de Monica compartilhar suas experiências na Fundação Roberto Marinho. A especialista começou sua apresentação falando sobre a importância de pensar em alguns pontos antes de propriamente começar o processo avaliativo de um projeto de ISP.

Segundo a gerente da Fundação, é preciso, primeiro, ter muito claro o motivo da avaliação, o que deseja-se aprender com esse instrumento, além dos relatórios, contas e dados a serem realizados. Em segundo lugar, também é necessária uma cultura de avaliação, com toda a empresa ou instituição empenhada em realizar o processo. Por fim, é preciso entender que cada pessoa envolvida em um projeto social tem diferentes níveis de aprendizagem e, portanto, diferentes níveis de participação no processo avaliativo. A especialista também usou sua vivência em seminários internacionais para comentar que diversos países além do Brasil têm dificuldades no processo de planejamento e avaliação.

Pensar na teoria da mudança é o primeiro passo do planejamento da avaliação. Esse ponto corresponde ao lugar onde pretende-se chegar, quais são os objetivos e metas desse processo. “A teoria da mudança irá inspirar os resultados que queremos atingir ao longo do tempo. Por exemplo, no caso de Bornéu, apresentado pelo João Martinho, a teoria de mudança era ter uma população saudável, e não acabar com os mosquitos”, comparou a especialista.

Outros dois elementos fundamentais para realizar a avaliação são: uma matriz avaliativa e as perguntas avaliativas. Enquanto que a matriz representa um “mapa” com o engajamento do projeto, as atividades, pessoas envolvidas e objetivos propostos, as perguntas avaliativas são mais sofisticadas e precisam dar respostas para que seja possível decidir o que será feito na sequência do projeto.

A especialista também elencou algumas condições básicas para a realização de uma avaliação. Entre elas está a necessidade de recursos disponíveis (sejam humanos, financeiros ou técnicos); a empatia; a consideração com o locus social (cada região tem seus códigos de comportamento, de fala e relacionamento que devem ser respeitados pelo avaliador e pelo investidor social); e o tempo de execução e o engajamento dos stakeholders.

“Não existe processo avaliativo se as pessoas não têm tempo para fazer as perguntas avaliativas ou tempo para olhar os primeiros resultados. Não adianta produzir um relatório de gaveta. Os stakeholders têm que ter um tempo, pois a avaliação é parte do processo, não é algo apartado do projeto de investimento social privado”.

Monica fechou sua apresentação ressaltando a necessidade de um “apetite pedagógico pela aprendizagem”, ou seja, a vontade de aprender com a avaliação, para que essa ajude a tomar decisões em diferentes níveis. A especialista também elencou alguns pontos que devem ser evitados, como querer avaliar tudo, considerar que a avaliação vai resolver todos os problemas e desafios de projetos sociais e a crença em uma receita de bolo para avaliação de projetos sociais.  

Leandro Pinheiro, superintendente socioeducativo da Fundação FEAC e um dos coordenadores da RIS, destacou a importância de comunicar a avaliação internamente para que todas as pessoas entendam com qual objetivo está sendo feita. Além disso, argumentou que deve-se entender a avaliação mais como um exercício de reflexão sobre a prática do que como uma determinação de geração de impacto ou transformação social.

“A Monica falou muito sobre essa questão da cultura avaliativa permear todos os níveis de governança e eu acho que isso é verdade. O entendimento que as pessoas têm em relação à avaliação é, em muitos casos, equivocado, e aí cria-se uma resistência contra o processo avaliativo. Existe uma expectativa de que ele consiga dar todas as respostas, quando, na verdade, é um instrumento de apoio à reflexão sobre os projetos que estão sendo feitos e à tomada de decisão em relação a que caminhos tomar”, defende o especialista.

A Rede em 2018

Para este ano, a ideia da RIS é realizar mais três encontros: um ainda no primeiro semestre e outros dois no segundo. Segundo Leandro, a proposta é que as reuniões possam ajudar a consolidar o grupo e trazer outros potenciais investidores do interior paulista para os debates, de forma a ampliar as trocas entre os participantes.

Além disso, o especialista também destaca como objetivo da Rede buscar mais uniformidade conceitual sobre ISP. “As pessoas ainda têm visões muito distintas do que é investimento social privado. Algumas fundações e institutos já têm uma trajetória no interior paulista e elas foram concebidas dentro de um modelo que é muito diferente do que se preconiza hoje. Então, eu acho que [a Rede] ajuda a oxigenar e a trazer novos referenciais para que todo mundo faça uma reflexão em relação às suas práticas e suas estratégias de ISP”.


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