Reflexões sobre o sentido público do investimento social privado marcam 2016

Por: GIFE| Notícias| 19/12/2016

O ano de 2016 foi marcado por um ambiente com intensa instabilidade política e econômica no Brasil, refletindo também no campo do investimento social privado. O fato tornou o período desafiador para o setor. Neste momento, inclusive, questões como a relação público-privada ganharam a pauta e atenção, aproximando ainda mais o ISP dos dilemas que o país enfrenta.

Diante desse cenário, discutir, refletir e pensar o sentido público do investimento social privado foi fundamental em 2016. Andre Degenszajn, secretário-geral do GIFE, ressalta que o tema reverberou e ganhou concretude em vários produtos e iniciativas fomentadas pelo GIFE ao longo do ano.

O Congresso GIFE 2016 trouxe a reflexão para o debate no fim de março. Nele, foi destacada a importância de se pensar um investimento social privado mais conectado com a dimensão pública. Os participantes foram provocados a refletir sobre as contribuições do campo para a sociedade, discutindo o ISP a partir das urgências e demandas do país.

No próprio Congresso foi lançada a publicação Alinhamento entre o investimento social privado e o negócio”, que aprofunda a reflexão das relações do setor. Com o lançamento da publicação, foi possível observar um interesse crescente do setor pelo tema, revelado tanto pela velocidade com a qual a publicação se esgotou, quanto pela expressiva adesão do público em todos os espaços em que ela foi discutida. A publicação, inclusive, está sendo traduzida para o inglês e será lançada em 2017.

Andre lembra que reforçar a dimensão pública do investimento social privado perpassa também processos e práticas cada vez mais transparentes e uma governança eficaz, fortalecendo e trazendo mais legitimidade ao ISP na sociedade. Tendo isso em vista, o GIFE lançou em 2016 novos produtos e instrumentos, como o Painel GIFE de Transparência e os Indicadores GIFE de Governança.

O painel, por exemplo, é uma ferramenta online que reúne, organiza e disponibiliza informações institucionais relevantes sobre os associados do GIFE a partir de um grupo de indicadores. Este instrumento permite a qualquer um observar se a organização publica em seu site a informação sobre cada indicador definido e acessá-la por meio de link que direciona o usuário para o dado no site do associado.

O Painel foi criado e inspirado em outras seis iniciativas semelhantes internacionais. Entre elas o GlassPockets – projeto de 2010 do Foundation Center (EUA).  Ele se propõe a funcionar como mecanismo de autorregulação e uma ferramenta prática para vivenciar e praticar a abertura e transparência.

“Num contexto atual de país de forte corrupção, estreitamento do espaço da sociedade civil e maior controle estatal, a nossa resposta tem sido a de trazer a transparência para o centro do debate como resposta positiva para o setor que precisa se ver como objeto de accountability social para se tornar mais legítimo”, comenta Iara Rolnik, gerente de Conhecimento do GIFE.

Segundo Iara, o Painel ajudou os 51 associados que já entraram voluntariamente na ferramenta a evidenciarem os seus avanços e desafios nas práticas de transparência, trazendo mais concretude ao tema. A adesão ao painel trouxe um impacto direto na transparência destas organizações. Foi observado um crescimento médio de 16.25 pontos percentuais no total dos indicadores de transparência, em relação ao marco zero.

Já os Indicadores GIFE de Governança trouxeram para a pauta uma questão pouco explorada e ainda negligenciada pelas organizações. Eles são um instrumento de autoavaliação online (clique aqui para preencher) sobre o estado da arte da governança nas organizações, que tem como objetivo criar as bases para um futuro mecanismo de autorregulação do setor.

Segundo Iara, uma das principais motivações para o preenchimento dos indicadores – feito de forma livre por qualquer organização da sociedade civil interessada – é que se trata de um processo que leva as entidades à reflexão sobre seus próprios mecanismos de governança. “Com isso, pretendemos melhorar as práticas de governança do setor como um todo e, assim, fortalecer a legitimidade das organizações”, enfatiza.

Até o momento, 75 organizações diversas (em estrutura, trabalho, presença regional, porte etc) responderam aos indicadores e, no início de janeiro de 2017, será lançado um relatório com as primeiras análises realizadas. Iara destaca que os associados estão mais atentos ao tema, a partir das provocações lançadas pela ferramenta. No próximo ano, ela se tornará ainda mais prática, trazendo dicas de governança para as organizações que preencherem os indicadores.

Articulação

O ano de 2016 foi marcado também pelo fortalecimento da articulação entre os associados GIFE, com a realização de 16 encontros nas redes temáticas, mobilizando cerca de 360 pessoas.

Ana Carolina Velasco, ex-gerente de Articulação e Relacionamento do GIFE, aponta que as redes temáticas se consolidaram como um espaço de grande importância para troca e conexão entre associados e outras instituições em torno de temas convergentes, o que gerou grande confiança entre eles, abrindo oportunidades para a realização de diversas iniciativas conjuntas em prol da sociedade.

Um exemplo foi a conquista de um financiamento para a Rede Temática de Leitura e Escrita de Qualidade para Todos, que planeja um projeto único sobre a importância da leitura no país; assim como a RT de Negócios de Impacto Social, no qual várias instituições associadas ao GIFE se uniram em torno do “Protótipo de Fundações e Institutos em Investimento de Impacto”, um tipo de plano de ação que nasce da co-criação, organizando recursos, agentes e ações em atividades definidas e alinhadas aos princípios do movimento.

Fábio Deboni, gerente executivo do Instituto Sabin e coordenador da RT de Negócios de Impacto Social, conta que tem sido transformador ter acesso a tantos aprendizados a partir das experiências de organizações de portes, atuações temáticas e entendimentos diferentes sobre o assunto.

“Atuar em coletivo é sempre mais desafiador e traz consigo um potencial de impacto muito maior. Tem sido uma experiência bastante interessante e inovadora, pois reforça o caráter experimental e inovador de Institutos e Fundações, atuando como co-investidores de negócios de impacto. O tema em si [de negócios de impacto] é novo e ainda desperta muitas dúvidas em institutos e fundações. Por isso, a relevância de atuarmos numa espécie de ‘consórcio’, diluindo eventuais riscos e ampliando o alcance de todos os envolvidos”, ressalta.

Uma nova rede também foi criada em 2016 – a de Gestão Institucional. A Rede formalizou os encontros que já aconteciam esporadicamente entre um pequeno grupo de associados. Segundo Marisa Ohashi, gerente de Planejamento e Operações do GIFE, o grupo sentiu a necessidade de avançar no diálogo e engajar mais atores do campo neste debate, trazendo um novo rumo para os encontros.

A Rede promoveu dois encontros no ano com a proposta de abrir espaço para trocas de experiências e conhecimentos sobre o cotidiano, os aprendizados e os desafios diários enfrentados pelos gestores administrativos-financeiros, de pessoas, de operações, entre outros responsáveis por atividades transversais que envolvem a gestão institucional das organizações.

Outras redes regionais ganharam também força em 2016, com a criação da Rede de Investidores Sociais do Rio Grande do Sul, e a consolidação da RIS do Paraná e a de Brasília.

Janaina Audino, executiva do Instituto JAMA, fala sobre a importância da cooperação. “Hoje percebemos que a troca de experiências com outras organizações qualifica o processo estratégico do instituto. Sentimos, porém, que por uma questão geográfica ficamos distantes de algumas discussões [do eixo Rio-São Paulo]. Assim, além de fortalecer e dar relevância ao terceiro setor no Estado, a RIS/RS foi articulada a partir da caminhada de outras redes estaduais com o propósito de iniciarmos um diálogo para ampliar a discussão do ISP na região”.

Um novo espaço começou a ser articulado no Mato Grosso a partir do primeiro “Encontro de Investimento Social Privado – Mato Grosso 2016”. O evento, articulado pelo Governo do Estado em parceria com o GIFE, Instituto Tellus e investidores com atuação destacada no Mato Grosso, aconteceu no último dia 30 de novembro no Palácio Paiaguás, sede do governo.

Comunicação

Com a proposta de tornar a comunicação cada vez mais estratégica para o campo do investimento social privado, a área de Comunicação do GIFE elaborou produtos e ferramentas sobre o tema e promoveu uma série de ações em 2016.

Uma das novidades foi o lançamento da websérie COMUM, durante o Congresso GIFE. Ela traz as oito agendas estratégias do GIFE: alinhamento do investimento social às políticas públicas; ampliação da doação no ISP; avaliação; comunicação; transparência e governança; alinhamento entre investimento social e o negócio; negócios de impacto social; e fortalecimento das organizações da sociedade civil.

A ideia foi selecionar nomes relevantes relacionados a cada um dos temas, como Pedro Abramovay,  Bruno Torturra, Priscila Cruz e outros, para trazerem brevemente um panorama sobre eles. Os vídeos tem em torno de três minutos e buscam trazer algumas das discussões por trás de cada uma das agendas escolhidas.

Todo o conhecimento gerado pelo Congresso GIFE também foi disponibilizado na íntegra via site e canal do Youtube do GIFE, dando mais amplitude às discussões do evento.

Mariana Moraes, gerente de Comunicação do GIFE, ressalta que, neste ano, foram essenciais as conversas sobre os desafios da comunicação. Entre elas a relação do investimento social com a mídia, iniciada durante painel “O papel do jornalismo em sociedades democráticas” no Congresso, e com continuidade no encontro “Investimento Social e Mídia”, onde foram convidados a Revista Época e o portal Nexo para um debate com os associados.

Em 2016, pelo segundo ano consecutivo, o GIFE mobilizou também uma delegação com 12 organizações para estar presente no ComNet -The Communications Network Annual Conference, a principal conferência internacional de comunicação na área social, promovida de 28 a 30 setembro, em Detroit (EUA).

Segundo a gerente de Comunicação do GIFE, foi possível perceber na conferência que as ações implementadas pelas instituições brasileiras estão alinhadas com o que é considerado estratégico nos EUA e que, no Brasil, há muitas práticas inovadoras sendo realizadas.

Diante deste cenário, inclusive, Mariana destaca que o grupo está disposto a levar, para a próxima edição do ComNet, os aprendizados do Brasil também para o resto do mundo, no que diz respeito, por exemplo, à relação de advocacy e comunicação, assim como transparência, avaliação e comunicação.

Advocacy

As ações de advocacy sempre foram uma preocupação do GIFE, tendo, inclusive, participado ativamente desde 2010 da Plataforma por um Novo Marco Regulatório para as Organizações da Sociedade Civil.

Em 2016, a área ganhou ainda mais força e se reestruturou a fim de ajudar a criar um ambiente regulatório que estimule e fomente a transferência de recursos para causas de interesse público. “Avançamos na consolidação e produção de conhecimento sobre a interface privada da agenda regulatória, na articulação com o poder público e sociedade civil, o que se cristalizou em parcerias relevantes, capazes de garantir uma atuação de longo prazo”, comenta Mariana Levy, gerente de Advocacy do GIFE.

Assim, ao longo do ano, o trabalho esteve focado em quatro temas que impactam diretamente na sustentabilidade das organizações: os desafios da implementação do Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil; a melhoria do sistema de tributação de doação, com destaque para o aperfeiçoamento do atual regime do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD);  o fomento para criação de fundos patrimoniais (endowments) no Brasil; e o papel dos incentivos fiscais para pessoa física no fomento à cultura de doação.

Para aprofundar e compartilhar os desafios da agenda de advocacy, o GIFE realizou cinco rodas de conversa esse ano, a fim de desenvolver e sistematizar as reflexões já levantadas pelo Congresso de 2016 sobre o sentido público do investimento social privado (assista aos vídeos sobre aspectos regulatórios e financiamento das organizações da sociedade civil).

Em outubro, por exemplo, em parceria com o IDIS (Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social), a APF (Associação Paulista de Fundações) e a Cebraf (Confederação Brasileira de Fundações), foi realizado um encontro sobre as regras e caminhos para fomentar a criação de fundos patrimoniais no Brasil.

Já em parceria com o Senac Francisco Matarazzo, foi realizado um debate a respeito do “Marco Regulatório das OSCs – diálogos sobre os desafios e as potencialidades” e, mais recentemente, em conjunto com o Movimento por um Cultura de Doação, uma nova roda de conversa tendo como tema central “o papel do incentivo fiscal para pessoas físicas na ampliação da cultura de doação no país”.

“Os associados participaram de maneira bastante ativa dos debates e eventos realizados. Espaços como estes de troca de experiência e reflexões são fundamentais para a construção conjunta das estratégias na área de advocacy”, comenta Mariana Levy.

Em 2016, o GIFE marcou presença também em espaços públicos relevantes de interação que permitem a aproximação entre investidores sociais privados, o poder público e as organizações da sociedade civil em torno das agendas estratégicas de advocacy.

Assim, a organização participou dos encontros do “Diálogo Paulista entre Órgãos de Controle e Organizações da Sociedade Civil”. Trata-se de fórum permanente que reúne representantes da administração pública, Tribunais de Contas, líderes da sociedade civil, especialistas e pesquisadores com a finalidade de discutir e aprimorar o controle sobre as parcerias entre OSC e governos. A iniciativa do CPJA/FGV – realizada em parceria com a Associação Paulista de Fundações (APF) e o Conselho Nacional de Controle Interno (Conaci) – proporciona um espaço de debates, mediado pela academia e, portanto, apropriado para a apresentação de críticas e proposições sobre o ambiente legal das OSCs.

Além disso, fez parte do IV Encontro Nacional da “Plataforma por um Novo Marco Regulatório da Sociedade Civil”, articulação que congrega diversas redes, coletivos, movimentos sociais e organizações e que teve um papel fundamental na construção do Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (clique aqui e conheça a carta aberta da Plataforma).

Segundo a gerente de Advocacy do GIFE, o ano de 2016 foi marcado ainda por avanços no campo regulatório da sociedade civil. Foi promulgado o Decreto Federal nº 9726/16, que regulamentou o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, detalhando os procedimentos sobre as parcerias envolvendo a sociedade civil e o poder público. Além disso, foi aperfeiçoado o procedimento de reconhecimento da imunidade do ITCMD de São Paulo para as organizações da sociedade civil.

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